Para resolver o desafio de armazenamento de energia no espaço, a startup japonesa ispace está desenvolvendo um novo tipo de bateria. A companhia planeja ser a primeira a testar uma bateria de estado sólido na superfície da Lua — e o dispositivo pode chegar ao satélite natural já em 2021, a bordo de um módulo lunar comercial. 

Assim como a ispace, outras companhias aeroespaciais reúnem esforços para enviar tripulações e robôs à Lua. Será necessário energia para alimentá-los, bem como a outros equipamentos eletrônicos. A luz solar é uma opção, mas algumas áreas da superfície lunar não recebem a luz do sol durante semanas. Nesse período, as temperaturas caem e os painéis não são alimentados. 

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Então, encontrar uma bateria que, além de armazenar energia com eficiência, suporte oscilações extremas de temperatura pode ser um grande benefício. Trata-se de uma versão muito badalada das tradicionais baterias de íons de lítio — encontradas em dispositivos recarregáveis. As convencionais têm um líquido inflamável chamado eletrólito, que ajuda a mover as partículas carregadas, os íons, de um lado para o outro no interior da peça. 

Infelizmente, porém, ele pode causar problemas. Em altas temperaturas, os íons ficam muito agitados — e isso pode fazer os smartphones explodirem. Quando elas estão baixas, por outro lado, o líquido pode congelar e tornar-se sólido, o que faz a bateria desligar completamente.

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Nas baterias de estado sólido, o eletrólito é sólido — ou seja, projetado para permitir que os íons se movimentem sob diferentes temperaturas, de acordo com Francesco Pagani, especialista dos Laboratórios Federais Suíços para Ciência e Tecnologia de Materiais. Em vez de haver líquido em volta de tudo, as partes são empilhadas em camadas sólidas, o que também torna a bateria mais compacta.

Reprodução

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As baterias de estado sólido supostamente armazenam mais energia e carregam mais rápido do que as de íons de lítio. Em teoria, elas também podem sobreviver melhor a oscilações dramáticas de temperatura (como as que ocorrem na Lua: de 260°F (127°C) na luz solar a -173°C (-280°F) na sombra. Assim, ela não explode pelo calor e o eletrólito é projetado para ser sólido. Embora o frio deixe o carregamento das baterias de estado sólido mais lento, ao menos existe a chance de elas sobreviverem no espaço. Aquelas com líquido no interior jamais poderiam.

Ainda não há especificações definidas

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A “moon battery” será fabricada pela empresa japonesa NGK Spark Plug. As especificações exatas da peça ainda não foram definidas, mas especula-se que ela terá um eletrólito de cerâmica. O material é uma das opções mais populares, dada sua estabilidade. O plano é fazer alguns testes básicos para verificar se o componente sobrevive e mantém a carga no vácuo. Espera-se que o experimento amplie as possibilidades das baterias no espaço, de acordo com um porta-voz da companhia.

O projeto não é exatamente uma novidade, segundo Rao Surampudi, gerente do Gabinete do Programa de Sistemas de Potência do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa e autor de relatórios sobre o armazenamento de energia no espaço. “Começamos a trabalhar em baterias de estado sólido em 1991”, diz.

O principal desafio é o ciclo de vida do componente — ou seja, quantas vezes é possível recarregá-lo. No caso das baterias de estado sólido, ele é bastante limitado. Isso não é útil no espaço, onde as coisas precisam durar por um tempo considerável. “Você pode substituir a bateria do carro ou do celular, mas não pode fazer isso em uma nave espacial”, lembra Surampudi.

E é justamente o curto ciclo de vida que explica o fracasso das peças aqui na Terra. Mesmo com as tentativas de comercialização, não é possível comprar uma dessas peças — seja para um celular ou um carro elétrico. Atualmente, só é possível fabricar exemplares pequenos, que, em geral, duram apenas 18 meses. 

Além disso, sua produção é incrivelmente cara, o que inviabiliza fazê-la em massa. “Foi prometido, nos últimos quatro ou cinco anos, que baterias de estado sólido chegariam ao mercado nos próximos dois ou três e os investidores estão cada vez mais impacientes com a falta de progresso”, disse Ian McClenny, analista da Navigant Research, especializada em pesquisa de bateria, ao The Verge. Ele acredita que esses itens serão uma opção comercial apenas no início ou em meados dos anos 2020.

Surampudi é igualmente cético. Para ele, a tecnologia para baterias de estado sólido ainda é bastante imatura e deve levar de cinco a dez anos para refiná-la. “Isso se investirmos outros US$ 100 milhões em mais pesquisas”, acrescenta.

Enquanto isso, é possível projetar baterias tradicionais para funcionarem bem no espaço. Criadas de forma que explosões inesperadas não prejudiquem os astronautas ou comprometam a segurança, são usadas na Estação Espacial Internacional (ISS). Não se pode desconsiderar que o íon de lítio impulsionou o Opportunity Mars Rover. Surampudi ajudou a desenvolver essa tecnologia: sua equipe criou sistemas especiais de gerenciamento térmico que ajudavam as baterias a lidarem com calor e frio. Durante três anos, as peças foram testadas sob temperaturas extremas.

Isso não significa que o íon de lítio seja o fim de tudo. “É hora de substituí-lo”, diz Surampudi. “Precisamos encontrar a próxima melhor bateria, mas o desenvolvimento desse componente não é fácil, porque os resultados mais simples de alcançar já foram atingidos há muito tempo.”

Será necessário aguardar a bateria de estado sólido da NGK Spark Plug ir ao espaço. A ispace planeja lançar sua primeira missão — um orbital lunar — a bordo de um foguete SpaceX Falcon 9, em 2020. Se a missão for bem-sucedida, a empresa planeja enviar um combo lander e rover (que carregará a bateria) em outro Falcon 9 no ano seguinte.

A visão de longo prazo da ispace é criar uma comunidade próspera e sustentável na Lua. Essa população viveria e interagiria com espaçonaves robóticas. Para alcançar esse feito, será necessário criar algumas soluções inteligentes de armazenamento de energia. As baterias de estado sólido podem fazer parte desse futuro, que provavelmente levará tempo para se concretizar.