A Samsung anunciou uma surpresa nesta segunda-feira: depois de quatro relatos de problemas com a tela por parte dos primeiros jornalistas e influenciadores que conseguiram colocar as mãos no Galaxy Fold para testes, a empresa optou por adiar por tempo indeterminado o lançamento do aparelho, inicialmente previsto para o dia 26.

É indiscutível que a Samsung tomou a decisão certa em relação ao decidir pelo adiamento da distribuição do aparelho. A empresa precisa ser muito clara e transparente sobre o que pode acontecer com a tela de um aparelho de US$ 2.000, mesmo que os defeitos não estejam totalmente claros até o momento. Para isso, é necessário entender o que deu errado e tomar as providências adequadas.

“As descobertas iniciais da inspeção dos problemas relatados no display mostraram que eles podem estar associados a impactos nas áreas expostas da dobradiça na parte superior e inferior do aparelho. Houve também um caso de que substâncias encontradas dentro do aparelho afetaram o desempenho da tela”, explicou a Samsung em um comunicado no qual justifica o adiamento do lançamento.

Pelas análises que foram publicadas até o momento, ficou bastante evidente que a taxa de falhas do aparelho é mais alta do que o aceitável. Foram duas unidades que apresentaram defeitos claros que, ao que tudo indica, não foram resultantes de mau uso e mais duas que tiveram problemas pela remoção indevida de uma película protetora que visa evitar que a tela seja danificada. Os jornalistas dizem que não havia um aviso claro para que o item não fosse removido, o que é especialmente confuso quando o Galaxy S10, por exemplo, tem uma película que DEVE ser removida para o uso.

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Diante dos primeiros relatos, a Samsung tentou amenizar a situação avisando que as unidades finais do Galaxy Fold teriam um aviso para que os clientes não removam a película, mas isso é só uma parte do problema. Primeiro: a película protetora, se é tão indispensável, não PODE ser removível. Segundo: ainda há outros aparelhos que deram defeito mesmo com o plástico protetor. Isso sem contar no fato de que, na melhor das hipóteses, algumas centenas de aparelhos foram testados por pessoas de fora da Samsung, o que é uma taxa de erro altíssima. Se a cada 200 aparelhos (chutando bem alto), 4 apresentarem defeito, é uma taxa de falha de 2%, digna de recall. É provável, no entanto, que a empresa tenha fornecido muito menos unidades de testes do que os 200 utilizados para o cálculo.

A Samsung havia dito no ano passado que pretendia produzir 1 milhão de unidades de seu celular dobrável, numa época em que ainda não sabíamos sequer que o aparelho se chamaria Galaxy Fold. Se a proporção de falha se mantivesse, teríamos em mãos 20 mil celulares com problemas. Seria um desastre para a imagem da companhia que poderia atrasar em anos a evolução da tecnologia de telas dobráveis devido à má reputação que a tecnologia ganharia.

Também é impossível não lembrarmos do caso Galaxy Note 7, que tem algumas similaridades evidentes com o caso do Fold. Na ocasião, a Samsung correu para inovar, lançando uma bateria maior do que o corpo do aparelho poderia suportar, o que acabou comprimindo componentes fazendo com que o dispositivo entrasse em curto, causando a combustão de alguns celulares. A empresa chegou a fazer um recall, mas as novas unidades também começaram a pegar fogo (segundo a Samsung por outro motivo) e a empresa foi forçada a cancelar definitivamente a distribuição do smartphone.

Foram poucas as pessoas de fato impactadas pelo fiasco do Note 7. Quando declarou o fim da distribuição do aparelho, a Samsung havia registrado 92 casos de superaquecimento de baterias nos EUA, causando 26 queimaduras e 55 casos de danos a propriedades pessoais dos usuários e ao menos três casos de usuários que reportaram o defeito após terem recebido uma nova unidade teoricamente segura após o recall.

Claro que um defeito na tela é um problema muito menos perigoso do que uma bateria que pode a qualquer momento entrar em combustão dentro do bolso de um usuário, mas a taxa de falha vista nestes primeiros dias é absurdamente maior do que a taxa de falha do Note 7. A Samsung havia relatado 2,5 milhões de unidades do Note 7 vendidas pelo mundo, e apenas algumas centenas de aparelhos apresentaram defeito. A amostragem estatística que temos do Fold é menor, mas mais perigosa.

Assim, a Samsung tomou a decisão acertada. A empresa precisa acertar a mão no Fold, não só pelo futuro do aparelho, mas pelo futuro da tecnologia, então é inteligente tomar mais um tempo para lançar o produto direito. E a Huawei, que também já anunciou um celular com tela dobrável, precisa estar bastante atenta aos passos da Samsung para não repetir seus erros.