Desde o ensino fundamental aprendemos que o mundo é dividido em fusos horários. No Brasil mesmo, há quatro deles: Fernando de Noronha, Brasília, Amazônia e Acre. Por aqui, essas zonas horárias são regulamentadas pela Lei 12.876.

A ideia de desfazer todos esses conceitos parece pouco sensata, mas alguns segmentos já a adotam. Por isso, dois professores da Universidade Johns Hopkins, nos EUA, o economista Steve H. Hanke e o astrônomo Richard Conn Henry, acreditam que todos os relógios deveriam adotar o Tempo Universal Coordenado (Coordinated Universal Time – UTC).

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“Esse sistema é sucessor do Tempo Médio de Greenwich (Greenwich Mean Time – GMT), usado atualmente”, explica o físico Leonardo Zani Castelo, professor do Anglo. “Entretanto, enquanto o GMT usa as coordenadas geográficas e o movimento celeste, o UTC tem como base relógios atômicos altamente precisos.”

Ou seja, com o UTC, as horas não são baseadas na posição do sol no céu. O meio-dia, então, variaria conforme a localidade e poderia até cair no meio da noite em alguns lugares. Aqui no Brasil, o horário comercial tradicional (o conhecido 8 às 17h) seria das 11 às 20h.

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Isso não significa, porém, que seria preciso trocar o dia pela noite. O período útil diário continuaria o mesmo: aquele que já é usado atualmente, em que acordamos quando o sol nasce e dormimos quando ele já se pôs. Hanke e Henry explicam que o que muda é apenas a hora marcada nos relógios — que seria alinhada com o UTC.

Um dos setores que usa o UTC é a aviação: desde 1972, pilotos de avião aplicam o conceito. A Estação Espacial Internacional (International Space Station – ISS) também considera o UTC. E isso sem falar das transações de ações e commodities, cujas operações são marcadas de acordo com esse padrão.

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“Dependendo de onde se esta, há variações na contagem de tempo e, no mundo globalizado, isso pode ser um problema”, diz Castelo. Por isso, tanto a aviação quanto as ferramentas web optaram por aplicar o UTC.

Essa escolha, então, é feita por motivos de segurança ou eficiência. No caso das companhias aéreas, por exemplo, ela tem relação com a logística necessária para coordenar horários de partida e chegada em diferentes zonas horárias — além de tornar mais fácil calcular as necessidades de combustível com base na duração de voos.

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Quando o assunto é o mercado de ações, o horário pode fazer total diferença no preço. Então, quando se compra algo do outro lado do mundo, é importante que o horário seja único — só assim é possível saber o preço correto de um ativo ou de um item.

Esse é o horário do futuro?

Para Castelo, não. “O uso do UTC tende a ser vinculado a elementos problemáticos que exijam controle minucioso do tempo. É provável que fique restrito às necessidades da web e da aviação e a usos militares”, avalia.

Segundo Castelo, uma das desvantagens do UTC pode ser a necessidade de precisão. “Seria necessário usar equipamentos com 17 a 19 casas decimais, o que é pouco viável”, explica. Além disso, os relógios atômicos precisam de ajustes periódicos para corrigir a unidade de tempo. “Isso acontece porque há divergência nos dispositivos que estão em diferentes partes do planeta.”

Além disso, apesar de ser bastante útil em alguns mercados, o UTC pode confundir. Como saber, por exemplo, quando um horário é adequado para falar com outro país? Hanke e Henry dizem que um simples protetor de tela pode mostrar isso.

Eles contam, ainda, que uma mudança semelhante já aconteceu nos EUA. Inicialmente, as referências eram estabelecidas com base no sol, mas, como havia mais de 300 zonas solares no país, as ferrovias tinham dificuldade de operar de forma confiável, tanto em termos de horário quanto para evitar acidentes.

Por isso, elas reduziram a quantidade de zonas para tornar esse aspecto mais fácil de administrar. Em 1883, então, adotaram o Horário Padrão das Ferrovias — e ele foi voluntariamente acolhido por vilarejos e cidades. Foi assim que o país chegou aos quatro fusos horários atuais.

O mesmo havia ocorrido na Grã-Bretanha em 1847: a Railway Clearing House, responsável pelas tarifas de trem, fez que quase todas as companhias que operavam no sistema adotassem o horário ferroviário. Depois, o padrão passou a ser seguido para outros propósitos e foi oficializado legalmente em 1880.

E se não houver interesse na sua adoção?

Atualmente, depois que alguns mercados essenciais decidiram seguir o UTC, Hanke e Henry acreditam que é apenas questão de tempo para que o público em geral se renda à ideia. E, se isso não acontecer, a dupla tem um plano B.

Se um presidente americano adepto do marketing converter os EUA para o UTC a partir de um decreto, há grandes chances de que o resto do mundo faça o mesmo. “É uma pauta sob medida para Trump”, diz Hanke. “As Trump Towers são bobagem perto da possibilidade de haver um ‘Trump Time’.”