Cientistas russos usaram um computador quântico para reverter o fluxo de tempo e desfazer o envelhecimento de uma única partícula elementar simulada em um milionésimo de segundo. Porém, o experimento – publicado na revista Nature Scientific Reports – diferente de abrir portas para o desenvolvimento de uma máquina do tempo, só reforçou o quanto estamos presos no fluxo temporal.

“Demonstramos que reverter o tempo, mesmo uma partícula quântica, é uma tarefa insuperável na natureza”, explica o físico Valerii M. Vinokur, do Laboratório Nacional de Argonne (EUA), um dos cinco pesquisadores da equipe liderada por Gordey B. Lesovik, do Instituto de Física e Tecnologia de Moscou.

O estudo se relaciona com a Segunda Lei da Termodinâmica, que afirma que existe uma tendência natural de qualquer sistema isolado de degenerar em um estado mais desordenado. “Essa lei está intimamente relacionada à noção da ‘flecha do tempo’ que apresenta a direção unidirecional do tempo, do passado para o futuro”, afirma Lesovik.

Em tese, as leis básicas da física são reversíveis: elas trabalham matematicamente se o tempo está avançando ou retrocedendo. Mas se o tempo é apenas outra dimensão do espaço-tempo, como Albert Einstein disse, é uma dimensão unidirecional estranha. No mundo real, podemos sair do metrô e virar à esquerda ou à direita, mas não temos a opção de avançar ou voltar no tempo. Estamos sempre indo em direção ao futuro.

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No experimento, os cientistas conseguiram uma maneira de dobrar esta lei, criando artificialmente um estado que evolui em uma direção oposta à da flecha termodinâmica do tempo. Lesovik explica que a evolução do estado de um elétron é governada pela equação de Schrödinger (o mesmo da história do gato).

Embora não faça distinção entre o futuro e o passado, a região do espaço que contém o elétron tende a se espalhar muito rapidamente. Ou seja, o sistema tende a se tornar mais caótico: a incerteza da posição do elétron está aumentando, de forma análoga à crescente desordem em um sistema de grande escala, como uma mesa de bilhar após a primeira tacada. É a Segunda Lei da Termodinâmica em ação.

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“No entanto, a equação de Schrödinger é reversível”, acrescenta Vinokur. “Matematicamente, isso significa que, sob uma conjugação complexa, a equação descreverá a ‘mancha’ que representa a localização dos elétrons recuando para uma pequena região do espaço”. Embora esse fenômeno não seja observado na natureza, poderia teoricamente ocorrer devido a uma flutuação aleatória no fundo cósmico de micro-ondas que permeia o universo.

A equipe decidiu calcular a probabilidade de observar a localização de um elétron reverter por uma fração de segundo para uma posição do seu passado recente. As chances de isso acontecer de forma natural são bem baixas: se alguém passasse a vida inteira do universo – 13,7 bilhões de anos – observando 10 bilhões de elétrons a cada segundo, a ‘evolução reversa’ do estado da partícula ocorreria apenas uma vez, e por um décimo de bilionésimo de segundo.

Lesovik e sua equipe não tinham tanto tempo assim, então tentaram outro método. Em vez de tentar observar um elétron, eles observaram o estado de um computador quântico composto por dois e posteriormente três qubits, ou bits quânticos.

Reprodução

Processador do computador quântico da IBM. Imagem: IBM/Divulgação

A pesquisa foi feita em quatro etapas: primeiro, cada qubit foi inicializado no estado fundamental, denotado como zero – uma configuração altamente ordenada, que corresponde a um elétron localizado em uma pequena região. Na segunda etapa, o elétron é espalhado por uma região cada vez maior do espaço, no qual o estado dos qubits se torna um padrão de mudança cada vez mais complexo de zeros e uns. Isso foi alcançado lançando-se um programa de evolução no computador quântico. Uma degradação semelhante ocorreria naturalmente devido às interações dos elétrons com o meio ambiente, mas o programa controlado de evolução autônoma permitirá as próximas etapas do experimento.

A terceira fase é a reversão do tempo. Um outro programa modifica o estado do computador quântico de forma que ele evolua “para trás”, do caos para a ordem. Essa operação é semelhante à flutuação aleatória do fundo de micro-ondas, mas desta vez é deliberadamente induzida. Voltando à analogia da mesa de bilhar, seria com uma tacada perfeitamente calculada que devolveria todas as bolas ao formato de triângulo inicial.

Na última etapa, de regeneração, o programa de evolução é lançado novamente. Se a “tacada” tenha sido realizada com sucesso, o programa não resulta em mais caos, mas retrocede o estado dos qubits inicial. Os pesquisadores descobriram que em 85% dos casos o computador quântico de dois qubit conseguiu esse retorno, enquanto o de três qubits obteve uma taxa de sucesso de aproximadamente 50%.

Mais do que um experimento teórico, o estudo e próprio desenvolvimento do algoritmo de reversão de tempo podem ser úteis para tornar os computadores quânticos mais precisos. “Nosso algoritmo pode ser atualizado e usado para testar programas escritos para computadores quânticos e eliminar e erros”, explica Lesovik.

Via: EurekAlert/New York Times/Science Alert