Nesta terça-feira (4) um protótipo da Starship, espaçonave que a SpaceX pretende usar para um dia colonizar Marte, decolou pela primeira vez. Batizado de SN5, o veículo decolou às 20h35 (horário de Brasília) da base da empresa em Boca Chica, no Texas, e chegou a 150 metros de altura. Depois, estendeu seus pés e pousou verticalmente a poucos metros do local da decolagem.

“Marte parece mais real”, disse o CEO da SpaceX, Elon Musk, após o teste.

O protótipo é equipado com um propulsor Raptor, também ainda em desenvolvimento, que é mais poderoso que o atual Merlin 1D usado na Falcon 9 e Falcon Heavy. A versão final da Starship terá seis Raptor, suficientes para decolar da Lua ou de Marte, e para decolagens da Terra será impulsionada por um foguete chamado Falcon Super Heavy, equipado com nada menos que 31 propulsores Raptor, e que será o mais poderoso foguete já construído.

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Um vídeo da SpaceX, feito por um drone, mostra a decolagem e o momento em que a nave paira no ar, intercalado com cenas mostrando detalhes da movimentação dos propulsores e preparação para o pouso. Veja abaixo:

Obstáculos no caminho

O voo da SN5 foi o primeiro sucesso em um programa de desenvolvimento marcado por acidentes espetaculares. O primeiro protótipo em grande escala, chamado Mk1, explodiu durante um teste de pressurização do tanque frontal de oxigênio líquido. O segundo, SN1, novamente foi destruído em um teste de pressurização em fevereiro deste ano.

O SN2 passou nos testes, mas não foi usado para um voo. O SN3 implodiu durante um teste de resistência, quando o tanque de oxigênio líquido foi subpressurizado. Por fim o SN4 passou nos testes de pressurização, mas explodiu durante um teste devido a um vazamento em uma linha de combustível.

Os testes em rápida sequência, e sucessivas falhas, da SpaceX são fruto de uma metodologia de desenvolvimento conhecida como Minimum Viable Product (MVP, Produto Viável Mínimo), muito comum em startups de software. A ideia é coletar o máximo possível de informações validadas com o mínimo de esforço.

Por exemplo, diante da necessidade de comprovar a ignição confiável do propulsor a SpaceX constrói apenas o mínimo necessário para o teste, muitas vezes não mais do que um tanque de combustível, o propulsor e um controle de ignição, algo que pode ser feito rapidamente e com baixo custo.

Em caso de falha um “artigo de teste” substituto, incorporando uma correção, pode ser montado e testado rapidamente. Se for bem-sucedido, o aprendizado é levado para um novo estágio do produto (no caso a espaçonave), e assim por diante.

Segundo Musk a SpaceX agora fará uma série de outros “saltos”, como são chamados os vôos curtos, para refinar o processo, antes de tentar um voo de “grande altitude”, que pode ser de até 20 km.

Uma cidade em Marte

Musk tem como objetivo construir uma cidade em Marte com 1 milhão de habitantes até 2050. Para isso, a SpaceX teria de construir 100 Starships por ano, num total de mil naves ao longo de 10 anos, e fazer três lançamentos diários, cada um transportando mais de 100 toneladas, num total de 100 mil toneladas/ano. Isso seria feito a cada vez que a Terra e Marte ficarem mais próximos, o que acontece uma vez a cada 26 meses.

Para colocar isso em perspectiva, o executivo salienta que, se considerarmos todas as naves espaciais atualmente em operação, a capacidade total de carga útil é de apenas 500 toneladas por ano – com os foguetes da série Falcon representando cerca de metade disso.

O custo de cada lançamento da Starship pode ser de “apenas US$ 2 milhões” (R$ 10,6 milhões), considerando que tanto a espaçonave quanto o foguete usado para lançá-la serão totalmente reutilizáveis.

Musk não comenta o custo de cada “passagem” (só de ida) para futuros colonos do planeta vermelho, mas afirma que eles poderão pagar os custos da viagem “com trabalho” uma vez que chegarem lá. Segundo ele “não haverá falta de empregos” em todos os setores, de pizzarias à construção e manutenção de sistemas de suporte de vida.

A ideia não caiu bem entre os usuários do Twitter. Isso porque soa muito similar ao sistema de “Servidão por Contrato”, onde trabalhadores assinam um contrato se comprometendo a trabalhar para um empregador específico por tempo determinado em troca, por exemplo, da cobertura dos custos da viagem.

Embora popular no passado, como durante a colonização dos EUA por imigrantes europeus no século XVII, o sistema é banido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos como uma forma de escravidão.