Uma pesquisa publicada no The Astronomical Journal revelou que astrônomos detectaram ciclopropenilideno (C3H2) na atmosfera de Titã, satélite de Saturno. A molécula é extremamente rara e baseada em carbono, além de ser tão reativa que só pode existir na Terra se for produzida em laboratório.

Na verdade, a partícula nunca foi detectada em uma atmosfera, no Sistema Solar ou em outro lugar. Até então, os cientistas achavam que o único outro lugar que permaneceria estável é o vazio frio do espaço interestelar. Mas a atmosfera da lua de Saturno pode ser um ambiente ideal para moléculas orgânicas mais complexas.

“Pensamos em Titã como um laboratório da vida real onde podemos ver química semelhante à da Terra antiga quando a vida estava tomando conta daqui”, disse a astrobióloga Melissa Trainer, do Goddard Space Flight Center da Nasa, uma dos cientistas-chefes que investigarão a Lua na próxima missão Dragonfly, que será lançada em 2027.

Segundo Trainer, moléculas maiores do que a C3H2 ainda serão encontradas, mas ainda é necessário saber o que está acontecendo na atmosfera para entender as reações químicas que levam moléculas orgânicas complexas a se formarem e chegarem até a superfície.

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Molécula pequena e estranha

O ciclopropenilideno – que até os pesquisadores da Nasa descrevem como uma pequena molécula muito estranha – não tende a durar muito tempo em condições atmosféricas, pois reage rapidamente e facilmente com outras moléculas, formando outros compostos. O espaço interestelar é muito frio e difuso, o que significa que os compostos não estão interagindo muito e a C3H2 pode ficar inteira.

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Provavelmente, a pouca atmosfera de Titã contribuiu para a molécula sobreviver. Imagem: Nasa/Reprodução

Titã é muito diferente do espaço interestelar, já que tem lagos e nuvens de hidrocarbonetos, além de uma atmosfera predominantemente de nitrogênio com um pouco de metano. A atmosfera é quatro vezes mais espessa que a terrestre (que também é dominada pelo nitrogênio). Sob a superfície, os cientistas acham que há um enorme oceano de água salgada.

Titã é um tesouro de novas moléculas

Em 2016, uma equipe liderada pelo cientista planetário Conor Nixon, do Goddard Space Flight Centre da Nasa, usou o rádio observatório ALMA (Atacama Large Millimeter/Submillimeter Array), no Chile para sondar a atmosfera lunar de Titã, procurando moléculas orgânicas.

A partícula foi encontrada na tênue atmosfera superior, acima da superfície, onde detectaram sua assinatura química desconhecida. Ao compará-la com um banco de dados de perfis químicos, a equipe identificou a molécula como a C3H2. É provável que a pouca atmosfera nessa altitude contribua para a sobrevivência da molécula, mas o motivo dela aparecer em Titã e nenhum outro mundo é um mistério.

“Quando percebi que olhava para o ciclopropenilideno, achei realmente inesperado. Titã é um satélite único em nosso Sistema Solar e provou ser um tesouro de novas moléculas”, disse Nixon.

O ciclopropenilideno é de particular interesse, por ser conhecido como uma molécula de anel (seus três átomos de carbono estão ligados em um anel). Embora a molécula em si não seja conhecida por desempenhar um papel biológico, as bases nitrogenadas de DNA e RNA são baseadas em tais anéis moleculares.

Cientistas querem descobrir se há vida em Titã

Quanto menor a molécula, mais potencial ela tem, pois reações envolvendo partículas menores com menos ligações devem acontecer mais rápido do que reações com moléculas maiores e mais complicadas. Isso significa que, quando isso acontece com partículas menores, surge uma gama mais diversificada de resultados.

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Pesquisadores esperam encontrar condições para a vida nos oceanos de Titã. Imagem: Nasa/Reprodução

Anteriormente, pensava-se que o benzeno (C6H6) era a menor molécula de anel de hidrocarbonetos encontrada em qualquer atmosfera (incluindo a de Titã).

Titã já é uma colmeia de atividade química orgânica, pois o nitrogênio e o metano se rompem à luz solar, desencadeando uma cascata de reações químicas. Se essas reações podem resultar em algum tipo de vida é uma suposição que os cientistas estão morrendo de vontade de responder.

“Estamos tentando descobrir se Titã é habitável, saber quais compostos da atmosfera chegam à superfície e, em seguida, descobrir se esse material pode passar pela crosta de gelo até o oceano, porque achamos que é onde estão as condições habitáveis”, comentou a geóloga Rosaly Lopes, do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa.

Descobrir quais compostos estão presentes na atmosfera é um passo muito importante nesse processo de pesquisa. O ciclopropenilideno pode ser pequena e estranha, mas esta molécula extremamente rara pode ser uma peça-chave do quebra-cabeça químico de Titã. Agora os cientistas só precisam descobrir como ele se encaixa.

 

Fonte: Science Alert