Em entrevista exclusiva ao Olhar Digital, o diretor de ‘Returnal’, Harry Krueger, afirmou que o jogo não teria sido feito de forma apropriada sem o DualSense, o áudio 3D e várias outras funcionalidades do PlayStation 5 (PS5). Considerado o primeiro grande título exclusivo do novo console da Sony, o game tem sido considerado “muito difícil” por alguns jogadores, mas o finlandês garante que o título da Housemarque tem como objetivo reviver o estilo arcade e ser bastante desafiador.

“Eu acho que a exata experiência de ‘Returnal’ que jogamos agora é possível somente graças aos recursos e poder do PS5”, diz Krueger, que trabalha há 12 anos em jogos da Housemarque e ganhou notoriedade após dirigir outro título da empresa: ‘Nex Machina’ (2017). “O processamento do PS5 ajudou muito, e permitiu que fizéssemos muitas coisas que, talvez, não teriam sido feitas de outra maneira (…) As partículas, as luzes, as nuances, os tentáculos dos monstros, as lutas com os chefões [e etc.] nos ajudou a levar o talento da Housemarque e nos empurrar ao próximo nível”.

Também na entrevista estava Pedro Souza, produtor da Sony Interactive Entertainment que trabalhou em ‘Returnal’ ao longo de quatro anos. “Foi a primeira tentava de um jogo dessa magnitude e o resultado foi incrível. Então, estamos vendo o quão legal está sendo ver a resposta da comunidade e o quão estão amando”, afirma.

Disponível desde o dia 30 de abril, o jogo está inteiro em português do Brasil, incluindo a dublagem. Em nosso review do jogo, afirmamos que “‘Returnal’ é, de fato, o primeiro grande jogo exclusivo para PS5“.

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A sinopse oficial do jogo diz: “Após o pouso forçado neste mundo que muda de forma, Selene deve pesquisar a paisagem árida de uma antiga civilização para escapar. Isolada e solitária, ela se vê lutando com unhas e dentes pela sua sobrevivência. Repetidas vezes ela é derrotada – forçada a reiniciar sua jornada sempre que morre” (veja o trailer do jogo acima).

Abaixo, leia a entrevista com Harry Krueger, diretor de ‘Returnal’, e o produtor Pedro Souza:

Antes de começar, quero dizer que joguei muito ‘Returnal’. Ainda não consegui terminar, porque meu PS5 ainda está a caminho e tenho que usar o do Olhar Digital para testar os novos jogos. Então, na minha análise, eu disse que (aspas) ‘Returnal’ é, de fato, o primeiro grande jogo exclusivo do PS5 (aspas). E muito disso porque o jogador pode usar e abusar muito de todos os recursos do console de nova geração. Minha primeira pergunta é, quando o jogo estava em desenvolvimento, vocês estavam cientes de todos os recursos que o PS5 teria ou tudo foi adicionado depois no jogo?

Harry Krueger: ‘Returnal’ esteve em desenvolvimento, vamos dizer, por quatro anos. Quando começamos, havia muitos detalhes que estávamos incertos sobre, mas, respondendo a sua pergunta, nós não tínhamos as especificações sobre os “recursos da nova geração” que iríamos utilizar. Então, fizemos um protótipo e focamos primeiramente no jogo – tanto no enredo quanto no gameplay. É claro, quando botamos as mãos no PS5, no controle e soubemos mais do que ele era capaz, nós imergimos para aplicar as novas funcionalidades de forma adequada.

– E muito da imersão que ocorre em ‘Returnal’ é devido ao DualSense. Houve momentos no jogo em que fiquei realmente impressionado – e também um pouco assustado – porque podia sentir as gotas de chuva no joystick, além da sensação de enviar “raios de eletricidade” para destruir inimigos e etc. Então, Krueger, você considera o DualSense uma parte essencial do jogo, assim como a Selene?

Krueger: Absolutamente. [O DualSense] se tornou uma parte inseparável da experiência que ‘Returnal’ proporciona. Tradicional, com todos os jogos aqui da Housemarque, nós tentamos muito focar em todo o talento audiovisual, fazendo com que tudo estivesse “a postos”, com um rico, tangível e dinâmico feedback. E com o DualSense, por exemplo, com as respostas táteis e os gatilhos adaptáveis, nós fomos capazes de enriquecer o feedback com agilidade e imersão que simplesmente não era possível antes. As gotas de chuva, como você mencionou antes, é um dos muitos exemplos… enfim, são esses detalhes que, combinados com o áudio 3D e o visual – misturado com os efeitos [visuais] e tudo mais -, colocam o jogador dentro de Atropos.

Pedro Souza: É uma observação interessante, porque foi um dos desafios que nós [da Sony] fizemos com a equipe da Housemarque quando estávamos desenvolvendo o jogo. Quando mostramos as funcionalidades do DualSense, pensamos: “como podemos usar o controle para que ele seja parte do gameplay?”. E daí, isso se tornou uma nova camada de comunicação com o jogador, então, por exemplo: os gatilhos adaptáveis permitem alternar entre dois modos de tiro, o controle, de certa forma, te notifica quando está perto de um parasita e etc. É uma camada totalmente diferente que pode entrar em contato com o jogador. Os caras [do estúdio] fizeram um ótimo trabalho com isso.

– Vamos falar sobre o sistema de som 3D. Em ‘Returnal’, a exploração de Atropos é muito mais interessante por causa do áudio. De grunhidos de monstros selvagens ao despertar de seres automatizados, eu senti que tudo é capturado. Particularmente, gostei de jogar algumas partes do game em um ambiente mais silencioso para curtir o áudio – algo que eu realmente valorizo em tudo que jogo, mas que a maioria dos jogadores no mundo não valoriza tanto, às vezes apenas se preocupando com a melhoria nos gráficos. Então, quero saber a opinião de vocês sobre a importância do design de som e da trilha sonora para ‘Returnal’ e para os futuros jogos de PS5.

Krueger: Da minha perspectiva, eu acredito que o áudio é uma parte crítica da criação de uma experiência imersiva. Quando penso nos meus momentos favoritos de alguns jogos, e até de filmes, há sempre a companhia de um design de som e trilhas sonoras poderosas. É como um canal separado que vai direto para a alma e que cria essas emoções tangíveis e cruas – algo incapaz de criar apenas com o visual. Então, a trilha sonora – que foi trabalhada com Bobby Krlic, o “The Haxan Cloak” – adicionou várias camadas de mistério, intriga, tensão e drama para a experiência. Mas, claro, o áudio 3D foi fundamental, visto o quão enriqueceu como um todo, então, o foco não foi apenas a fidelidade e a clareza do som, mas também a posicionalidade. E isso não ajudou apenas a criar momentos imersivos no decorrer da história – por exemplo, dentro da casa de Selene: é possível ouvir passos acima de você e tem esses “momentos assustadores” -, mas também durante os combates, sabe, como te ajudando a lidar com a percepção espacial. Você pode ouvir certos inimigos se aproximando por trás e pode sentir as criaturas se arrastando perto das paredes. [O áudio 3D] te coloca dentro do momento e ajuda a te informar muito melhor sobre quais decisões de gameplay precisam ser tomadas.

Souza: Eu lembro quando ouvimos falar, pela primeira vez, do áudio 3D para PS5. Nós todos do departamento chegamos a um acordo que ‘Returnal’ era o jogo perfeito para [ser o primeiro a utilizar o] o áudio 3D, pois estamos em planeta alien, então, poderíamos fazer o que quisermos com áudio 3D e “fazer loucuras” com o recurso. E o tipo de gameplay que tínhamos como objetivo era perfeito para o áudio 3D, como o Harry costumava dizer: “precisamos ter ameaças ao nosso redor totalmente, até em cima da gente”. Então, pensamos: “podemos usar o áudio 3D como forma de comunicação com os jogadores e eles terão noção dos inimigos chegando mesmo que não os vejam”. Foi uma combinação perfeita.

Produtor da Sony sobre ‘Returnal’: “o tipo de gameplay que tínhamos como objetivo era perfeito para o áudio 3D”. Imagem: Housemarque/Reprodução

– Agora, sobre os gatilhos adaptáveis e feedback tátil do DualSense. As armas têm tiros específicos e algumas são mais eficientes para certos tipos de criaturas. E, claro, a maneira como você pressiona o botão L2 foi uma boa ideia. Porém, a verdade é que a jogabilidade é única: ao mesmo tempo que, ao longo do jogo, o jogador se acostuma, o gameplay também pode ser desafiador pelos novos recursos do PS5 e o DualSense, ainda mais para quem está migrando de plataforma. E, claro, o conceito de ‘morte permanente’ pode surpreender a todos. A ideia sempre foi do jogo ser tão desafiador? Alguns chefes são difíceis pra caramba.

Krueger: Olhando para o catálogo dos nossos jogos [da Housemarque], que também foram baseados em experiências arcade bullet hell, vemos que a dificuldade é uma parte essencial de ‘Returnal’, porque é difícil ter uma sensação de realização sem ter uma sensação de desafio. Eu acredito que, para ‘Returnal’, como um grande roguelike, não é direto no quesito comum de “configurações de dificuldades” como os nossos títulos anteriores. O quesito roguelike tem como proposta fazer com que toda vez que você jogue seja algo único e diferente. Então, se você achar que algumas vezes você está preso em algum “chefão”, a próxima vez que você retornar no momento da queda da nave [de Selene] você consiga, talvez, uma arma que te ajude a lidar melhor com o inimigo, ou abra um baú que expanda sua vida e etc. Há tantas coisas que podem acontecer de formas diferentes em cada vez que você joga, e vimos aqui uma oportunidade de pressionar o jogador a voltar para tentar de novo e de novo. A verdade é que nós estamos curtindo os comentários dos jogadores sobre as primeiras experiências com ‘Returnal’ após o lançamento, que aconteceu há algumas semanas. A primeira impressão é sempre: “p*ta merda, esse jogo é muito difícil”. Porém, é fantástico ver as mesmas pessoas voltarem alguns dias depois e dizerem: “sim, eu consegui vencer aquele ‘chefão’ que estava com dificuldade”. Então, [a dificuldade] é algo valioso e que não queremos tirar das pessoas, além da sensação de realização. Muito bom ver a recepção do público, tomando em conta este aspecto.

Souza: [A dificuldade] é interessante, pois quando estávamos testando o jogo com novos jogadores, ouvíamos o quão ‘Returnal’ é difícil ou muito difícil, mas o mais importante era ouvir o quão e “envolvente e divertido” é. Então, as pessoas dizem que é difícil, porém divertido, e era isso o que queríamos e tínhamos como objetivo desde o começo.

– Em termos de gameplay, ‘Returnal’ é um shooter em terceira pessoa que reúne o melhor visto em ‘Matterfall’, ‘Alienation’ e, claro, ‘Nex Machina’, que são alguns dos títulos recentes da empresa. Houve alguma inspiração direta em algum desses trabalhos ou ‘Returnal’ realmente começou do zero?

Krueger: Essa é uma pergunta muito interessante. De muitas formas, ‘Returnal’ é o resultado de muitas influências, de certa forma. Então, é claro que tivemos inspirações de vários roguelikes, além de elementos de horror cósmico e dark sci-fi aplicados na história e na temática. Porém, de fato, eu acho que nós [da Housemarque] ficamos voltando aos nosso próprios jogos como maior fonte de referências. Captamos um pouco da energia de ‘Nex Machina’, além de ‘Matterfall’, ‘Alienation’ e ‘Resogun’, além da não-complexidade de morte vinda dos arcades… sem querer, temos um compromisso prévio com esse tipo de sentimento em relação aos videogames, sabe? Isso foi parte do esforço consciente durante o desenvolvimento [do jogo], pois queríamos contar uma história envolvente, com um mundo que pudesse ser tátil e rico. [A verdade é que] o gameplay sempre vem em primeiro lugar. Não há como substituir um bom gameplay, ainda mais em um “encontro interativo”. Então, isso [foi aplicado] em qualquer decisão que tivemos que tomar, desde a animação – tipo: “vamos mantê-la responsiva. Vamos fazer o que quiser com a animação, mas que seja uma parte, uma expansão dos controles do jogo – até às cutscenes (cinemáticas), pois queríamos contar uma história, mas não queríamos interromper o fluxo. Sempre seguimos esse guia de vida que o gameplay vem em primeiro lugar. E, claro, combinado a vários outros elementos de nossos jogos anteriores, como bullet hell e elementos cósmicos acima do normal em relação a partículas e armas, e à perspectiva de um jogo em terceira pessoa… tudo foi novo para nós [da Housemarque] e os resultados foram muito revigorantes.

Diretor de ‘Returnal’ sobre chefões: “A primeira impressão é sempre: ‘p*ta merda, esse jogo é muito difícil'”. Imagem: Housemarque/Reprodução

– Krueger, você acha que podemos dizer que a história de Selene e toda a experiência de jogar ‘Returnal’ só é possível graças ao PS5?

Krueger: Eu acho que a exata experiência de ‘Returnal’ que jogamos agora é, sim, possível somente graças aos recursos e poder do PS5, absolutamente. Como os jogos anteriores do estúdio, há sim um aproveitamento total. Igual ao que você disse, nós temos o DualSense, o áudio 3D, outros detalhes como SSD (Solid State Drives) e carregamentos ultrarrápidos… Para um jogo em que envolve “morrer e retornar” – e fazer isso sem telas de carregamento, algo que costuma atrapalhar a experiência – é de uma incrível qualidade e é algo que costuma passas desapercebido pelos jogadores, o que faz sentido, pois são aspectos que não devem ser visíveis. O processamento do PS5 também ajudou muito, e permitiu que fizéssemos muitas coisas que, talvez, não teriam sido feitas de outra maneira, mas que conectou e deu certo no final. As partículas, as luzes, as nuances, os tentáculos dos monstros, as lutas com os chefões [e etc.] nos ajudou a levar o talento da Housemarque e nos empurrar ao próximo nível.

– Vocês veem ‘Returnal’ como uma porta de entrada para os novos jogos da Housemarque ou do PS5 em geral?

Souza: [‘Returnal’ é] o resultado de uma longa colaboração feita entre nós [da Sony] e a Housemarque, então, o jogo já tinha como proposta abrir essa caminho. Se pegarmos o plano de fundo trabalhado entre nós e a Housemarque, é possível ver o crescimento devagar e constante, o que gerou a combinação de todos esses ideais de trabalho. [‘Returnal’] com certeza vai abrir portas e horizontes para os caras serem mais ambiciosos no futuro.

Review de 'Returnal'. Imagem: Housemarque/Reprodução
Souza: “‘Returnal’ é o resultado de uma longa colaboração feita entre nós [da Sony] e a Housemarque”. Imagem: Housemarque/Reprodução

– Com o jogo sendo tão falado, existe a possibilidade de termos um ‘Returnal 2’ no futuro? Claro, o jogo acabou de ser lançado, mas é sempre bom saber se você e a Housemarque já estão trabalhando em algo novo.

Krueger: Estamos animados com o lançamento do jogo, que ocorreu recentemente. Então, só estamos recebendo todos os feedbacks e observando os jogadores aproveitando o jogo. É definitivamente um universo que amamos, mas sobre planos futuros ou algo parecido, bem, nada a anunciar, por ora.

– Eu vou sair do meu “eu jornalista” e espero que vocês saiam do papel de criadores aqui. Sendo sinceros, qual é a lição que a história de Selene pode ensinar aos jogadores durante o jogo?

Krueger: Essa é uma excelente pergunta. Estou pensando em uma resposta sem dar spoilers do jogo (risos). Eu acho que, de muitas formas, a história de Selene e de Atropos em ‘Returnal’ é bastante complexa em camadas emocionais, uma história humana. E tem aquele aspecto humano que estamos todos acostumados: nós somos sobreviventes, de muitos jeitos, e nós pertencemos ao ambiente em torno de nós, somos partes disso, assim como a Selene é. De várias formas, queremos deixar a moral do jogo aberta aos jogadores para interpretação. Mesmo durante a produção, houve muitas questões, como: “o que isso significa simbolicamente?” ou “o que significa aquilo?”. Minha resposta para essas perguntas, da minha perspectiva, sempre foi a mesma: deixar que os jogadores faças as mesmas perguntas quando jogarem. [A ideia] sempre foi deixar o jogo aberto o suficiente para que as mentes dos jogadores ficarem em dúvida, mas também se conectarem com Selene em um nível emocional e refletir na jornada, junto com a Selene.

Review de 'Returnal'. Imagem: Housemarque/Reprodução
Krueger: “vários elementos-chave que hoje vemos em ‘Returnal’ foram solidificados desde o início”. Imagem: Housemarque/Reprodução

– Falando em jornada, vocês tinham desde o início a ideia fixa de roteiro ou chegaram a mudar “alguma várias vezes”?

Krueger: Interessante você perguntar isso, pois falamos disso um pouco mais cedo (risos). Olhando para o conceito original do jogo no passado, que tinha como codinome ‘Dark Planet‘ (em português, “planeta escuro”), vários elementos-chave que hoje vemos em ‘Returnal’ foram solidificados desde o início, como “estar preso em um loop temporal”, um planeta que fica diferente toda vez que você joga, a temática cósmica e o horror psicológico. Todos esses elementos permaneceram intactos do conceito até a versão final do produto. No decorrer do caminho, claro, teve uns pequenos ajustes em relação à refinação [das funcionalidades] do PS5 e o amadurecimento do roteiro, mas a essência, o espírito e ânimo do jogo foram definidos muito antes e não mudaram quase nada.

– Antes de terminarmos, aliás, isso é algo que costumo fazer com todas as pessoas que entrevisto: há mais alguma coisa que vocês queiram que eu pergunte ou que gostaria de destacar sobre ‘Returnal’?

Krueger: Boa pergunta. Eu realmente gostei da nossa conversa e nada vem à mente agora. Mas, quero dizer que essa é a primeira tentativa da Housemarque de fazer um jogo assim e esperamos que tenhamos conseguido criar algo familiar aos nossos fãs, mas que também é novo e convidativo. De muitas formas, estamos felizes por fazer nossa parte em manter o “espírito arcade” vivo e estamos ansiosos em ver o que está por vir a seguir. Obrigado, mesmo!

Souza: Do lado da Sony, estamos muito orgulhosos do que eles [da Housemarque] conquistaram. Como o Harry disse, foi a primeira tentava de um jogo dessa magnitude e o resultado foi incrível. Então, estamos vendo o quão legal está sendo ver a resposta da comunidade e o quão estão amando o jogo.

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