Em um novo paper voltado à pesquisa de como animais experimentam emoções humanizadas, cientistas da Universidade de Londres revelaram que as mães primatas expressam luto por filhotes perdidos, carregando os corpos dos filhos mortos por meses como forma de aliviar o sofrimento.

Segundo a divulgação técnica do estudo, publicado na Proceedings of the Royal Society B, os pesquisadores compilaram anotações de 126 outros estudos, relatando 409 casos do que chamaram de “transporte de cadáver infantil” em 50 diferentes espécies de primatas – desde chimpanzés até gorilas.

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Uma mãe primata com seu filhote chimpanzé. Estudo aponta que mães primatas são capazes de "fechar luto" e entenderem a morte
Os macacos têm muito mais em comum com humanos do que imaginávamos: estudo britânico indica que mães primatas entendem o conceito de “morte”, podendo até mesmo expressar luto. Imagem: Sergey Uryadnikov/Shutterstock

Basicamente, o estudo flerta com a possibilidade de que os primatas compreendem o conceito de “morte”, ou ao menos aprendem sobre ele com o tempo.

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“O paper indica que os primatas descobrem sobre a morte de forma similar aos humanos: pela experiência própria de que ela significa ‘o fim das funções’, o que é um conceito traduzido pelo homem”, disse a Dra. Alecia Carter, co-autora do estudo e antropóloga da universidade. “O que nós não sabemos, e talvez nunca o saibamos, é se os primatas entendem ou não que a morte é universal, que todos os animais – incluindo eles próprios – vão morrer um dia”.

A pesquisa também trata de como os animais processam a ideia de “morte”, comparando-os conosco: “sabemos que mães humanas que dão a luz a um bebê natimorto ou prematuro têm menor incidência de depressão se puderem segurar os filhos perdidos e expressar seus laços”, disse Carter. “Algumas mães primatas também precisam do mesmo tempo para lidar com suas perdas, mostrando o quão forte e importante o laço maternal é para elas – e para outros mamíferos também”.

No geral, 80% dos indivíduos observados expressaram luto ao carregar os corpos de filhotes mortos por aí. Esse processo foi visto em todo tipo de primata, mas foi mais evidente – e mais duradouro – em grandes macacos. Em outras variações de primatas, como micos e lêmures, o ato de carregar o cadáver teve baixa incidência, mas o luto acabou expressado de outras formas, como a mãe retornando para o local onde ficou o corpo do filho ou emitindo chamados específicos para eles.

Outros dois detalhes percebidos pelos cientistas têm relação com a idade das mães e se as mortes dos filhotes foi ou não traumática: “nós descobrimos que mães mais jovens apresentam uma predisposição maior de carregar os corpos, ao passo em que mortes traumáticas – como infanticídio [filhotes mortos pelos pais] ou acidentes, traziam menor tendência dessa ação se comparadas a episódios mais ‘naturais’, como doenças”, comentou a especialista.

O mesmo vale para a idade do filhote: quando um bebê morria jovem, o tempo da mãe carregando seu corpo era maior do que em idades mais avançadas.

Com base no estudo, foi possível especular que os primeiros humanos, cujo comportamento se assemelhava em muito ao de grandes primatas, também apresentavam práticas similares antes de desenvolver a racionalidade por trás da morte – e as práticas mortuárias que vieram disso.

“Devido à nossa evolução compartilhada, os laços sociais humanos se mostram bastante similares aos de outros primatas”, explica a co-autora do estudo, Elisa Fernández Fueyo. “Por isso, é provável que nossas práticas e expressão de luto tenham se formado por meio desses laços. O comportamento ‘tanatológico’ [o estudo científico da morte] que vemos em primatas não humanos hoje poderia estar presente em espécies humanas primordiais também — e elas podem tê-lo transformado em rituais diferenciados durante o processo evolutivo”.

As especialistas, porém, reconhecem que a falta de um sistema próprio de observação ordenada do comportamento em primatas pode apontar faltas ao seu paper. A fim de contornar isso, elas lançaram o site “ThanatoBase”, para que outros pesquisadores possam, de forma independente, adicionar suas próprias anotações desse comportamento.

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