Uma pesquisa apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) desenvolveu uma técnica que permite analisar a biodiversidade de peixes na Amazônia sem precisar da captura dos animais, abrindo caminho para estudos científicos mais amigáveis à fauna.

Segundo comunicado da Fundação, em uma expedição ao rio Javari, na fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru, cientistas usaram sequenciamento de DNA ambiental, a partir de amostras de água coletadas. Basicamente, os especialistas extraíram delas as moléculas, usando marcadores genéticos para determinar a quais espécies de peixes elas pertencem.

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Imagem de um tucunaré na Amazônia, onde pesquisadores da FAPESP criaram método de análise de biodiversidade sem a captura de animais
Cientistas criaram método de análise de biodiversidade de peixes na Amazônia, de forma a não mais precisar capturar espécies como o tucunaré (foto) e preservar o equilíbrio ambiental (Imagem: Arunee Rodloy/Shutterstock)

“Precisamos continuar capturando e identificando os animais pelos métodos tradicionais para criar bibliotecas de material genético”, disse Carlos David Santana, do Museu Smithsonian de História Natural e autor principal do estudo. “Elas servirão de referência para comparar com o que for encontrado nas amostras de água. Com os avanços da técnica, é possível que em alguns anos possamos saber todos os peixes presentes num lugar sem capturá-los”.

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Em um período de 18 dias a equipe percorreu o rio Javari, durante uma expedição de captura de peixes em 46 pontos. Destes pontos, três também viram a coleta de amostras de água. Ao todo, foram 443 espécies coletadas, sendo que mais de 60 delas eram inéditas. Nos três pontos essenciais ao novo estudo, 201 espécies foram capturadas pelos métodos tradicionais. A análise do DNA ambiental, porém, só deu conta de identificar com precisão 58 (26%) delas.

Segundo Gislene Torrente-Vilara, co-autora do estudo e professora da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), essa discrepância se deu pela falta de material genético disponível em base de dados para comparação. “Nessa localidade em particular, porém, havia ainda o fato de muitas espécies serem completamente novas, desconhecidas mesmo pelos métodos tradicionais de identificação”, ela comentou.

Cerca de 100 ml de água foram coletados em cada um dos três pontos, e o material passou por um filtro e foi misturado a uma solução que impede a degradação do DNA. A partir daí, os pesquisadores usaram kits de extração de DNA em exames de sangue para identificar, na solução coletada, um fragmento de DNA mitocondrial chamado “12S” – um dos principais marcadores de identificação usados em estudos do tipo. Por esse método, produtos como fezes e urina dos animais presentes nas amostras poderiam ser identificados de forma precisa.

Os pesquisadores ressaltam, porém, que o 12S refere-se a uma evolução mais lenta, e por essa razão, ele não pode identificar todas as espécies de peixe, haja vista que existe uma considerável disparidade entre elas, datada de mais ou menos alguns milhões de anos. Em outras palavras, as espécies apresentaram caminhos de evolução diferentes nesse período – considerado relativamente jovem pela ciência.

Hoje, a Amazônia contabiliza 18 ordens, subdivididas em 60 famílias. São mais de 500 gêneros e um número superior a 2.700 espécies.

“Mesmo com uma biblioteca adequada será muito difícil conseguir identificar tudo ao nível de espécie com apenas esse marcador. Dois poraquês que divergiram recentemente, por exemplo, Electrophorus voltai e E. electricus, poderão aparecer como uma única espécie”, conta Santana.

A expectativa, porém, é a de que essa técnica seja mais refinada nos próximos anos, ao ponto de se tornar capaz de sequenciar mais de um trecho de DNA simultaneamente, o que deve ampliar a exatidão do método.

O estudo completo já está disponível na revista Scientific Reports.

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