Que a Rússia de Vladimir Putin não é lá um exemplo de liberdade de imprensa, todos sabem: no país, quem destoa do discurso oficial ou critica o governo está sujeito a sanções financeiras, campanhas de difamação e prisões arbitrárias, ou pode simplesmente “desaparecer”. Mas apesar de algumas restrições (como a proibição da cobertura de atividades classificadas como segredo de estado, como lançamentos militares), a cobertura dos acontecimentos no programa espacial do país era relativamente livre de interferência. Até agora.

Entretanto, uma nova ordem do serviço federal de segurança (FSB, sucessor da temida KGB), que já está em vigor, endurece esse controle: agora, qualquer pessoa que reporte algo mesmo que tangencialmente relacionado às atividades militares do país pode ser classificado como um “agente estrangeiro”. E como o programa espacial russo está intrinsecamente ligado ao setor militar, desde sua criação, isso se estende também às atividades relacionadas ao espaço.

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A ordem inclui uma lista de 60 temas, militares ou não, que não poderão ser abordados. Entre eles, informações sobre organização e financiamento da agência espacial russa (Roscosmos), sua capacidade de produção e planejamento, reestruturações internas ou a descoberta e uso de novas tecnologias e materiais.

A mudança já está tendo efeito: a blogueira russa Katya Pavlushchenko anunciou no Twitter que está cessando imediatamente a cobertura do programa espacial russo. 

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“O texto da ordem é tão vago que, se desejado, praticamente qualquer pessoa pode ser acusada de violá-la”, disse em declaração ao site Ars Technica.

“Ouvi de vários autores de blogs populares de ciência e educação que eles irão prestar mais atenção às atividades espaciais estrangeiras”, disse. “Isso irá afetar a cobertura da Roscosmos? Com certeza. Estes autores não eram negativos sobre a agência, eles faziam muito trabalho de divulgação de suas atividades para o público”.

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O fato é que o programa espacial russo, apesar de um passado de glórias, enfrenta tempos difíceis. Por falta de financiamento e, segundo denúncias, corrupção, seus funcionários são mal pagos, suas estruturas são mal mantidas e a qualidade dos projetos que são completados, como o módulo Nauka que chegou recentemente à Estação Espacial Internacional (ISS), é baixa.

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O lado russo da ISS, por exemplo, é constantemente assolado por falhas de equipamento, além de vazamentos de ar e, mais recentemente, rachaduras. Algo que embora não coloque a vida dos cosmonautas (e astronautas) a bordo da estação em risco, certamente é preocupante. E qualquer menção a estes aspectos negativos poderia colocar um jornalista em maus lençóis com a FSB.

O próprio diretor da Roscosmos, Dmitry Rogozin, já declarou algumas vezes que o país pretende abandonar a ISS já em 2025 e partir para uma nova empreitada, seja por conta própria ou em parceira com os chineses.

Só não se sabe com que dinheiro: para arrecadar mais fundos, a Roscosmos está retomando operações de turismo espacial, e recentemente enviou uma atriz e diretor de cinema para a estação, para gravar o primeiro filme em órbita da Terra.

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