Nesta semana a agência espacial norte-americana (Nasa) vai lançar uma de suas mais importantes, e ambiciosas, missões até o momento. Batizada de Dart (Double Asteroid Redirect Test, Teste de Redirecionamento de Asteroide Duplo), ela vai enviar uma pequena espaçonave para colidir contra Dimorphos, “lua” do asteroide Didymos, numa tentativa de alterar sua rota.

O teste vai avaliar a viabilidade de uma solução para uma pergunta que muitos – astrônomos ou não – já fizeram em algum momento: se um asteroide vier em nossa direção, podemos explodi-lo? Se não, podemos desviá-lo?

Se na sua cabeça estão passando flashbacks do filme Armageddon, com Bruce Willis, em primeiro lugar, nos desculpe por colocar “aquelacanção do grupo Aerosmith em sua mente. Em segundo lugar, vamos com calma: a premissa do filme é a de explodir um asteroide que ameaça a vida na Terra. Na vida real as agências espaciais do mundo até consideraram esta possibilidade, mas atualmente todas concordam que desviá-lo para uma órbita mais segura seria o melhor curso de ação.

Imagem do Vesta, para ilustrar matéria sobre como a Nasa pretende lançar uma nave para se chocar contra um asteroide
Dando um significado científico à expressão “um soco no queixo resolve”, a Nasa quer mandar uma espaçonave para bater com toda a força em um asteroide no espaço (Imagem: Nasa/Divulgação)

Isso porque, se explodirmos um asteroide, não temos certeza do que pode acontecer. Em vez de uma grande rocha, podemos acabar com centenas de rochas menores, mas ainda assim grandes o suficiente para destruir cidades. E em vez de um único impacto, digamos, no meio do Oceano Pacífico, que ameaçaria no máximo regiões costeiras, podemos acabar enfrentando a possibilidade de múltiplos impactos em várias cidades de um hemisfério, por exemplo.

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Conhecendo o alvo

O alvo da DART é um sistema binário composto por dois asteroides: o maior, Didymos, tem cerca de 780 metros de extensão, enquanto sua “Lua”, Dimorphos, tem 160 metros. A missão DART vai mirar nessa rocha menor, esperando que o impacto direto contra ela seja suficiente para os satélites de observação da Terra analisarem possíveis mudanças em sua trajetória.

“Isso vai mostrar para nós qual é a viabilidade de uma técnica chamada ‘impactador cinético’ para desviar a órbita de um asteroide e determinar se isso pode ser uma opção utilizável, pelo menos em asteroides menores, que estão entre os mais prováveis em risco de impacto [com a Terra]”, disse Lindley Johnson, Oficial de Defesa Planetária da Nasa, no começo deste ano ao Space.com.

O que Johnson diz é verdade: quando pensamos em “impacto de asteroide”, a cultura pop nos condicionou a pensar no evento cataclísmico de uma rocha espacial com vários quilômetros de extensão, da qual um único choque varreria a humanidade da existência. 

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Não que isso seja impossível: o bólido que criou a Cratera de Chicxulub e causou a extinção dos dinossauros ao cair no que hoje é a Península de Yucatán, no México, não passava de 10 quilômetros, e veja o que ele fez. Mas hoje, objetos bem menores que isso já estão no nosso radar e estratégias de antecipação podem ser executadas rapidamente.

Os asteroides menores, porém, podem ser um problema: nem toda a nossa tecnologia consegue identificá-los de longe, e ver um problema só quando ele chega perto… bem, não nos dá uma janela favorável de tempo para reação.

Não há nenhum risco de choque de Didymos e de seu companheiro contra a Terra mas, se houvesse, ele não destruiria a humanidade. Ainda assim, seria capaz de um grande estrago: estimativas afirmam que um asteroide de 150 metros de extensão, mais ou menos o tamanho de Dimorphos, poderia destruir um estado dos EUA em caso de impacto direto não mitigado.

Em outras palavras: se errarmos, nada muda com o asteroide, que não nos atingirá. Se acertarmos, então ele ficará ainda mais distante de nós, com a contrapartida de que teremos um meio de defesa comprovado contra impactos futuros.

Testando tecnologias

A DART também serve de plataforma de testes para novas tecnologias, duas das quais podem ter impacto significativo em missões de exploração futuras. São elas um propulsor iônico à base de Xenônio e um novo tipo de painel solar mais flexível (ROSA, Roll-Out Solar Array).

Um propulsor iônico ioniza um gás neutro extraindo alguns elétrons de seus átomos, criando uma “nuvem” de íons positivos, que são acelerados por um campo elétrico e ejetados no espaço. Pela lei da ação e reação, isso gera um impulso de mesma intensidade e em sentido contrário na espaçonave.

Este impulso é inicialmente imperceptível, mas como não há atrito no espaço a aceleração se acumula à medida que milhões de íons são ejetados, o que torna possível acelerar uma espaçonave a velocidades significativas usando uma fração do combustível que seria necessário em um propulsor químico tradicional. É o ditado “de grão em grão, a galinha enche o papo” aplicado ao espaço.

Já os painéis solares são similares aos iROSA recentemente instalados na Estação Espacial Internacional ao longo de várias caminhadas espaciais. Mas intercaladas com as células tradicionais estão novas células solares, desenvolvidas pelo Laboratório de Física Aplicada (APL, Applied Physics Laboratory) da Universidade John Hopkins, que produzem três vezes mais energia do que os painéis tradicionais.

DART viajará por um ano antes do impacto

A missão DART será lançada às 3h21 desta quarta-feira (24), horário de Brasília, partindo da Base Vandenberg da Força Espacial norte-americana, na Califórnia, a bordo de um foguete Falcon 9 da SpaceX. Após chegar ao espaço, começa a longa viagem até o alvo: a estimativa é que o impacto ocorra entre 26 de setembro e 1º de outubro de 2022, quando os asteroides estarão a uma distância de 11 milhões de km da Terra.

Se tudo correr de acordo com o planejado, a DART deve colidir contra Dimorphos a uma velocidade de 24 mil km/h. A espaçonave será destruída no impacto, mas devido ao seu pequeno tamanho (um “cubo” de aproximadamente 130 cm de lado, sem contar antenas e painéis solares) e peso (550 kg no momento do impacto) para o asteroide a colisão será mais como um “peteleco” do que como um chute de Roberto Carlos. Ainda assim, mesmo o menor empurrão é suficiente para, ao longo do tempo, influenciar significativamente a trajetória do asteroide.

A DART não viajará sozinha: uma segunda nave, operada pela agência espacial italiana (ISA), chamada “Light Italian CubeSAT for Imaging Asteroids”, ou “LICIACube”, para os íntimos, estará nas imediações, no intuito de registrar imagens do resultado do impacto.

Não estamos em perigo, por enquanto

Agências espaciais monitoram ativamente os chamados PHAs (Potentially Hazardous Asteroid, ou Asteroides Potencialmente Perigosos). Pela definição da União Astronômica Internacional (IAU, International Astronomical Union), recebem essa classificação todos os objetos a uma distância de até 1,3 unidades astronômicas (uma unidade astronômica, ou UA equivale a mais ou menos 150 milhões de quilômetros) cuja órbita cruze a da Terra a uma distância de menos de 7,5 milhões de Km (0,05 UA) e que tenham potencial para causar danos regionais significativos em caso de impacto, o que ocorre com asteroides com mais de 140 metros.

Mas podemos ficar tranquilos. Ao menos entre os asteroides conhecidos, nenhum apresenta risco de colisão com nosso planeta nos próximos 100 anos.

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