Um novo levantamento reavaliou as conclusões de 88.125 pesquisas ambientais, chegando à conclusão que surpreendeu “um total de zero pessoas”: quase 100% dos estudos considerados afirmam que a humanidade é a responsável pelo avanço do aquecimento global.

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Entende-se por “aquecimento global” toda uma série de fenômenos que levam ao aumento da temperatura média da Terra, bem como as consequências disso, como o derretimento descontrolado das camadas mais grossas de gelo polar, o aumento do nível do mar e o maior volume de catástrofes naturais, como incêndios florestais e furacões.

E a culpa disso é nossa, segundo esses quase 90 mil estudos, que foram todos revisados por congêneres e tiveram seus métodos amplamente reproduzidos em ambientes independentes, o que atesta a veracidade de suas conclusões.

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Imagem via satélite do Furacão Florence, que chegou aos EUA em setembro de 2018
O avanço do aquecimento global contribui para o aumento não natural de ocorrências críticas, como furacões em maior volume e intensidade, mesmo em temporadas normais (Imagem: elRoce/Shutterstock)

O novo levantamento atualiza uma pesquisa similar feita em 2013. Na ocasião, o paper afirmava que 97% dos estudos publicados entre 1991 e 2012 apoiavam a ideia de influência humana na mudança climática da Terra. Já o estudo atual considera toda a literatura publicada entre janeiro de 2012 e novembro de 2020 – contemplando novos estudos no campo e aumentando a responsabilidade da humanidade no aquecimento global.

“Nós estamos virtualmente certos de que o consenso [científico] já é bem maior que 99% e configura, basicamente, um ponto indiscutível em qualquer conversa pública sobre a realidade das alterações climáticas causadas pelo homem”, disse Mark Lynas, pesquisador convidado da Aliança pela Ciência da Universidade de Cornell e autor primário do paper.

“É essencial reconhecermos o papel das emissões do efeito estufa, a fim de que possamos, rapidamente, mobilizar novas soluções, uma vez que já estamos testemunhando em tempo real os impactos devastadores do clima em relação aos negócios, às pessoas e à economia”, comentou Benjamin Houlton, reitor da Faculdade de Agricultura e Ciências Naturais da Universidade de Cornell e co-autor do estudo, publicado na última terça-feira (19), no jornal Environmental Research Letters.

Humanidade descarta aquecimento global como “conspiração”

Diversos estudos abordam a temática do negacionismo das mudanças climáticas, onde críticos alegam que o meio ambiente sempre apresentou, ao longo da história da Terra, ciclos repetitivos de alteração climática. Estudos científicos não negam essa afirmação, mas apontam para um direcionamento errôneo feito por quem nega a mudança climática – ou a responsabilidade humana nela.

Um estudo publicado em 2008 pelo Canadian Journal of Environmental Education indica que negacionistas têm seus métodos preferidos para contra-argumentar esse fato, apostando majoritariamente no discurso “ad hominem” (quando se coloca a credibilidade do autor – e não do estudo – em xeque), mas também indo para relativizações de intensidade (quando o aquecimento global é reconhecido, porém seu impacto é minimizado) e negações originadas de teorias sem comprovação (“o aquecimento global é uma mentira propagada pela elite” e similares).

“Compreender a existência de um consenso requer a capacidade de quantificar esse mesmo consenso”, disse Lynas. “Isso significa pesquisar a literatura disponível de forma coerente e não arbitrária a fim de evitar a escolha proposital de papers, que normalmente é a forma como esses argumentos contrários se propagam pela esfera pública”.

Imagem de uma geleira no Ártico se desprendendo de sua encosta
O derretimento acelerado das geleiras polares é uma consequência do aquecimento global, podendo levar ao aumento do nível do mar e ao desaparecimento de regiões costeiras em algumas décadas (Imagem: Bernhard Staehli/Shutterstock)

Em outras palavras: negacionistas do papel da humanidade no aquecimento global normalmente usam estudos especificamente escolhidos para corroborar suas próprias visões. O problema com essa prática é que ela viola o método científico, que busca estabelecer uma conclusão através do estudo, e não criar um estudo a partir de uma ideia premeditada. Na comunidade acadêmica, isso se chama “pesquisa por viés de confirmação” (“confirmation bias”, no inglês) – algo sem valor científico segundo estudiosos.

A fim de se evitar esse viés de confirmação em seu próprio estudo, Lynas e sua equipe contaram com a ajuda de Simon Perry, engenheiro de software britânico e voluntário da Aliança pela Ciência. Ele criou um algoritmo de pesquisa baseada em palavras-chaves como “solar”, “raios cósmicos” e “ciclos naturais”, aplicando a tecnologia nos 88.125 estudos avaliados, relacionando aquelas que apareciam em maior volume.

O resultado: de mais de 88 mil levantamentos, apenas 28 deles apresentavam conclusões céticas (ou seja, não atribuíram responsabilidade da humanidade no aquecimento global, mas também não a negavam) – todos esses, publicados em jornais e publicações de menor prestígio, com alguns nem mesmo passando pela “revisão por pares” tão essencial à comprovação científica.

Para Lynas, isso elimina qualquer possibilidade de discussão sobre o aquecimento global ser culpa nossa (ou mesmo se ele existe ou não): “isso é basicamente a palavra final”, disse.

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