Nomeado diretor-geral da Agência Espacial Europeia (ESA) em março deste ano, Josef Aschbacher acredita que a Europa deve parar de “facilitar a ambição de Elon Musk de dominar a nova economia espacial”. Em entrevista ao jornal Financial Times, Aschbacher alertou que a falta de uma ação coordenada entre os líderes do continente leva o bilionário americano a “ditar as regras”, o que torna o mercado injusto, na opinião do austríaco.

Elon Musk
A velocidade de produção e de lançamento dos satélites Starlink pela SpaceX têm gerado duras críticas ao CEO Elon Musk, tanto por empresas rivais quanto por astrônomos. Imagem: vasilis asvestas/Shutterstock

Segundo ele, a disponibilidade da Europa em ajudar na rápida expansão do serviço de Internet por satélite da Starlink pode impedir empresas da região de perceberem o potencial do espaço comercial. “O espaço será muito mais restritivo [em termos de] frequências e posições orbitais”, disse Aschbacher. “Os governos da Europa coletivamente deveriam ter interesse em dar aos fornecedores europeus oportunidades iguais de jogar em um mercado justo”.

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Para Aschbacher, a Starlink já é tão grande que fica difícil para empresas rivais alcançá-la. “Você tem uma pessoa que possui metade dos satélites ativos do mundo. Isso é incrível. De fato, ele está ditando as regras. O resto do mundo, incluindo a Europa, simplesmente não está respondendo rápido o suficiente”.

Recentemente, a Alemanha se candidatou à União Internacional de Telecomunicações (ITU), que coordena o uso de frequências sem fio para transporte de dados, e será responsável por conceder espectro à Starlink para cerca de 40 mil satélites. Musk já obteve a aprovação dos reguladores dos EUA para mais de 30 mil deles.

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Maior nome entre as empresas europeias do setor, a OneWeb, apoiada pelo governo do Reino Unido, é a que disputa mais diretamente com a Starlink a liderança na corrida para criar megaconstelações de centenas e até milhares de satélites em LEO (sigla em inglês para órbita baixa da Terra – uma região de até 2 mil km acima do Terra para onde a maioria dos novos serviços comerciais são direcionados), para fornecer banda larga a lugares de difícil acesso por cabo.

Fachada da unidade OneWeb em Cabo Canaveral, nos EUA. Empresa britânica é a concorrente mais forte da Starlink na Europa. Imagem: Thomas Kelley – Shutterstock

Por fora, também correm o governo chinês e o Projeto Kuiper, da Amazon, que planejam lançar suas próprias constelações em LEO.

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Além disso, uma nova geração de empresas espaciais, impulsionada por custos de lançamento decrescentes e equipamentos mais baratos, também pretende fornecer serviços comerciais em LEO, como satélites de observação da Terra.

De acordo com o site Ars Technica, a pressa em explorar o potencial do espaço comercial – possibilitado pela queda nos custos de lançamento e por satélites menores e mais baratos – alimentou a preocupação com a ausência de um sistema de gerenciamento de tráfego espacial global para a órbita baixa da Terra.

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No ano passado, a Associação de Indústrias de Satélites dos EUA estimou que poderia haver mais de 100 mil espaçonaves comerciais em órbita até 2029.

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Franz Fayot, ministro da Economia de Luxemburgo (Alemanha), ecoa as preocupações do líder da ESA. Ele também defende que novas regras são necessárias para garantir o uso seguro do espaço. “Você tem pessoas como Elon Musk, apenas lançando constelações de satélites e colocando em órbita. Precisamos definir regras comuns. A colonização, ou simplesmente fazer as coisas em um espaço completamente desregulamentado, é uma preocupação”, disse Fayot durante a conferência New Space, em Luxemburgo.

O setor de satélites da Europa é dominado por operadoras tradicionais que dependem de um número muito pequeno de caros satélites de alta órbita para fornecer serviços como a transmissão de televisão.

Embora a ITU coordene as frequências de rádio, não existe uma autoridade ou regulador internacional abrangente que controle o lançamento de satélites. Em razão disso, existe a preocupação com o crescente risco de colisões, à medida que as órbitas vão ficando superlotadas, que podem gerar quantidades catastróficas de lixo espacial – que já é um perigo significativo.

Steve Collar, presidente-executivo da operadora de satélites SES, disse que a indústria está caminhando para uma situação em que haverá muitos satélites em operação. “Muitos desses planos são uma resposta direta ao fato de que ninguém está regulamentando adequadamente”.

Astrônomos acusam Elon Musk e empresas de satélites de obstruir visão dos telescópios

Elon Musk tem sido criticado não apenas pelos rivais, mas também por astrônomos, devido ao ritmo de sua expansão. No início deste ano, a SpaceX estava lançando mais de 100 satélites por mês, estando com cerca de 2 mil atualmente na órbita baixa da Terra.

Conforme o Olhar Digital noticiou na semana passada, os astrônomos temem que um grande número de satélites interfira nas observações dos telescópios terrestres. De acordo com um relatório da  Sociedade Astronômica Americana existe o temor de que eles possam “impactar a aparência do céu noturno para os astrônomos do mundo todo”.

Ralph Dinsley, fundador da NORSS, que rastreia objetos no espaço, acredita que o fato de Musk fabricar seus próprios satélites e também poder lançá-los por meio dos veículos da SpaceX faz com que ele realmente tenha uma grande vantagem frente aos concorrentes. “Na velocidade que ele está colocando em órbita, ele está quase dominando aqueles planos orbitais, porque ninguém consegue entrar lá. Ele está criando uma soberania Musk no espaço”.

Aschbacher disse que é óbvio que os reguladores dos EUA, como parte de um governo nacional, estão interessados ​​em desenvolver não apenas a economia, mas também o domínio de certos setores econômicos. “Isso está acontecendo muito, muito, muito, muito claramente. E muito fortemente”, diz o diretor-geral da ESA.

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