Um estudo publicado no periódico científico Remote Sensing of Environment relata que 152 bilhões de toneladas de água doce foram liberados em três meses por um único iceberg nos mares ao redor da Geórgia do Sul, uma ilha britânica situada no Oceano Atlântico.

Conhecido como A68A, o supericeberg se separou da plataforma de gelo Larsen-C, na Península Antártica, em 2017 e iniciou sua épica jornada de 3,5 anos e 4 mil km através do oceano. Com 5.719 km quadrados de extensão, ele era o maior iceberg da Terra quando se formou e o sexto maior já registrado. 

O iceberg A68A com algumas partes menores de gelo que se romperam ao seu redor (21 de novembro de 2020)
Imagem: MODIS / NASA Worldview Snapshots.

Próximo ao Natal de 2020, A68A recebeu atenção generalizada à medida que se afastava preocupantemente da Geórgia do Sul, levantando a possibilidade de vir a prejudicar o frágil ecossistema da ilha.

Pesquisadores do Centro de Observação e Modelagem Polar (CPOM) e da Pesquisa Britânica da Antártida (BAS) usaram medições de satélite para mapear a área e a espessura do iceberg A68A ao longo de seu ciclo de vida. 

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Grande volume de água doce liberado por iceberg pode prejudicar ecossistema

Segundo os autores, o iceberg derreteu o suficiente a ponto de evitar danificar o fundo do mar ao redor da Geórgia do Sul em caso de encalhe. No entanto, um efeito colateral do derretimento foi a liberação de impressionantes 152 bilhões de toneladas de água doce nas proximidades da ilha — uma perturbação que poderia ter um impacto profundo no ecossistema local.

Durante os dois primeiros anos de sua existência, o A68A ficou perto da Antártida nas águas frias do Mar de Weddell. No entanto, ao iniciar sua jornada para o norte através da passagem Drake, ele viajou através de águas cada vez mais quentes e começou a derreter. 

Ao todo, o iceberg diminuiu 67 metros de seu tamanho inicial de 235 metros, com a taxa de derretimento subindo acentuadamente à medida que ele flutuava no Mar da Escócia ao redor da Geórgia do Sul.

Laura Gerrish, especialista em Sistemas de Informações Geográficas (SIG) e mapeamento da BAS, é coautora do estudo. “O A68 foi um iceberg absolutamente fascinante para acompanhar todo o caminho desde sua criação até o fim”, disse Gerrish. “Medições frequentes nos permitiram acompanhar cada movimento e rompimento do iceberg enquanto ele se movia lentamente para o norte através do ‘beco dos icebergs’ e para o Mar da Escócia, onde então ganhou velocidade e se aproximou muito da ilha da Geórgia do Sul”.

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Segundo Gerrish, se a quilha de um iceberg é muito profunda, ela pode ficar presa no fundo do mar, e isso pode ser perturbador de várias maneiras. As marcas no solo oceânico podem destruir a fauna, e o próprio iceberg pode bloquear correntes oceânicas e rotas de alimentação de predadores. 

Todos esses resultados potenciais foram temidos quando A68A se aproximou da Geórgia do Sul. No entanto, o novo estudo revela que o iceberg colidiu apenas brevemente com o fundo do mar e se partiu pouco depois, tornando-o menos arriscado em termos de bloqueio. 

Quando chegou às águas rasas ao redor da Geórgia do Sul, a quilha do iceberg havia reduzido para 141 metros abaixo da superfície oceânica, raso o suficiente para evitar o fundo do mar, que tem cerca de 150 metros de profundidade.

No entanto, ainda assim, o ecossistema e a vida selvagem ao redor da Geórgia do Sul certamente sentiram o impacto da visita do iceberg colossal. 

Pesquisa utilizou dados de cinco satélites

Quando os icebergs se desprendem das plataformas de gelo, eles flutuam com as correntes oceânicas e o vento, enquanto liberam água fria e nutrientes à medida que derretem. Esse processo influencia a circulação oceânica local e fomenta a produção biológica ao redor do iceberg. 

Anne Braakmann-Folgmann, pesquisadora do CPOM e doutoranda na Escola de Terra e Meio Ambiente da Universidade de Leeds, é a principal autora do estudo. “Esta é uma enorme quantidade de água derretida, e a próxima coisa que queremos aprender é se houve um impacto positivo ou negativo no ecossistema ao redor da Geórgia do Sul”, disse Braakmann-Folgmann. “Como o A68A tomou uma rota comum através da passagem Drake, esperamos aprender mais sobre icebergs tomando uma trajetória semelhante, e como eles influenciam os oceanos polares”.

Satélite CryoSat-2, da ESA, foi usado como fonte de dados para a pesquisa. Imagem: ESA

Para traçar a jornada do A68A foram usadas observações de cinco satélites. A mudança de área do iceberg foi registrada usando uma combinação de imagens Sentinel-1, Sentinel-3 e MODIS. Enquanto isso, a mudança de espessura do iceberg foi medida usando a altimetria CryoSat-2 e ICESat-2. Combinando essas medidas, foram determinadas as áreas, espessura e mudança de volume do iceberg.

“Nossa capacidade de estudar cada movimento do iceberg em tal detalhe é graças aos avanços nas técnicas de satélite e ao uso de uma variedade de medições”, disse Tommaso Parrinello, gerente de missões da CryoSat na Agência Espacial Europeia (ESA). “Os satélites de imagem registram a localização e a forma do iceberg e os dados das missões de altimetria adicionam uma terceira dimensão à medida que medem a altura das superfícies sob os satélites e, portanto, podem observar como um iceberg derrete”.

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