Enquanto aqui na Terra os atritos entre os EUA e a Rússia aumentam cada vez mais, principalmente desde que o presidente russo Vladimir Putin ordenou a invasão à Ucrânia, no espaço a situação parece mais tranquila entre os países – na medida do possível. 

Nasa não gostaria que tensões geopolíticas interferissem nas relações de cooperação entre os EUA e a Rússia na Estação Espacial Internacional. Imagem: NASA

Questionada pelo Olhar Digital sobre os impactos do conflito nas operações da Estação Espacial Internacional (ISS), construída e mantida por um consórcio de 15 países entre os quais os EUA e a Rússia são os membros mais importantes, a Nasa afirmou que “tudo ocorre como de costume”.

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“A Nasa continua trabalhando com a Corporação Espacial Estatal Roscosmos (Roscosmos) e nossos outros parceiros internacionais no Canadá, Europa e Japão para manter operações seguras e contínuas da Estação Espacial Internacional”, disse Joshua A. Finch, relações públicas da agência.

Conflitos geopolíticos nunca interferiram na operação da ISS

Na segunda-feira (28), a administradora associada de operações espaciais da Nasa, Kathy Lueders, reafirmou as intenções da agência de manter a harmonia entre os países, da mesma maneira que foi feita em outros cenários parecidos. “Já operamos nesse tipo de situação antes, e ambos os lados sempre trabalharam muito profissionalmente e entendem ao nosso nível a importância desta fantástica missão”.

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Segundo Lueders, controladores de voo e outros funcionários da Nasa continuam a trabalhar em Moscou, e os gerentes dos EUA e da Rússia têm uma boa comunicação. No “nível de trabalho”, pelo menos, não há sinais de problemas. “Nós, como uma equipe, estamos operando como estávamos operando há três semanas”, disse ela.

A agência espacial norte-americana ainda planeja que seu astronauta Mark Vande Hei retorne à Terra em uma nave russa Soyuz, em abril, pousando no Cazaquistão com dois cosmonautas. Normalmente, oficiais da Nasa viajam para a Rússia e, em seguida, para o Cazaquistão, para recepcionar seus astronautas. Lueders disse que esse e todos os outros procedimentos usuais para o pouso devem continuar.

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Mark Vande Hei, astronauta da Nasa, recordista de tempo vivido a bordo da Estação Espacial Internacional, deve retornar à Terra em uma espaçonave russa, em abril. Imagem: NASA

Essas declarações foram dadas por Lueders durante uma coletiva de imprensa online para tratar da próxima missão Axiom 1 ao laboratório orbital. Voando em uma cápsula Crew Dragon, da SpaceX, esta será a primeira missão completamente privada a visitar a ISS. 

Rússia já sinalizou que pretende sair da ISS em 2024

A Rússia não confirmou se continuará no projeto ISS depois de 2024, e, embora Lueders tenha dito que as 15 nações envolvidas na estação enfrentaram tensões geopolíticas anteriores, a situação atual é a pior dos 20 anos de existência do consórcio.

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Também na segunda-feira, a Agência Espacial Europeia (ESA) emitiu uma nota de repúdio à guerra.”Lamentamos as baixas humanas e as trágicas consequências da guerra na Ucrânia”. 

Já a Nasa ainda não emitiu nenhum comunicado condenando a ação da Rússia, e Lueders e outros funcionários do alto escalão da agência se mostram ansiosos para preservar a parceria, se possível. 

É comum dizer que a ISS tem um “lado russo” e um “lado americano” (embora a realidade seja um pouco mais complexa), e pessoas dos dois países são presença constante nas tripulações que se revezam em órbita a cada seis meses.

Além disso, a própria estrutura da ISS garante a cooperação entre seus membros. O “lado russo” depende de painéis solares no “lado americano” para obter energia elétrica, e estes dependem dos russos para, basicamente, manter a estação “no lugar”.

Espaçonaves russas Progress realizam manobras periódicas para manter o laboratório orbital “no lugar”. Imagem: Roscosmos/Divulgação

Isso porque, mesmo a mais de 400 km da superfície, ainda há atrito entre a estação e a atmosfera da Terra, o que faz com que a velocidade e a altitude do laboratório orbital sejam constantemente reduzidas. Por isso, são necessárias manobras periódicas para compensar essa “queda”, feitas usando os propulsores das espaçonaves russas que regularmente visitam a estação.

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Países têm cartas nas mangas

Se for tomada a decisão de desfazer a parceria e fechar a escotilha de popa do módulo Node 1, que leva ao segmento russo, a Nasa pode ter opções de emergência. A Rússia também, provavelmente, poderia preservar a funcionalidade de sua parte da estação por um tempo com voos frequentes de cargueiros de abastecimento Progress.

“Sempre procuramos ‘como obter mais flexibilidade operacional’, e nossos provedores de carga estão olhando para ‘como adicionamos diferentes capacidades'”, disse Lueders quando perguntada se a Nasa estaria desenvolvendo planos de contingência para um cenário de separação.

Por exemplo, uma nave Cygnus da norte-americana Northrop Grumman, atualmente conectada à estação, vai fazer uma manobra de impulso operacional pela primeira vez, função até hoje executada apenas por espaçonaves russas. 

Além disso, embora os veículos Dragon da SpaceX não tenham propulsores orientados para executar tal manobra, Lueders disse que a empresa está estudando incluir essa “capacidade adicional” em suas cápsulas de carga. 

Embora não tenha sido mencionada por Lueders, a espaçonave Starliner, da Boeing, que deve voar para a estação já em maio, também é capaz de aumentar a altitude da estação quando ela se tornar operacional.

Estação Espacial Internacional é símbolo de cooperação mútua entre as nações

Segundo Lueders, a Nasa estaria olhando para essas capacidades apenas como “flexibilidades operacionais”. No entanto, se a agência tivesse um meio independente de impulsionar a estação e realizar manobras de evasão de detritos, os EUA provavelmente conseguiriam dirigir a estação sem a parceria russa.

Ocorre que, conforme destaca o site Ars Technica, ninguém na Nasa realmente quer que isso aconteça. E um dos pontos principais para essa resistência, segundo Lueders, é que a relação colaborativa entre os países membros da ISS representa um símbolo importante para a cooperação humana em um mundo repleto de conflitos.

“A ISS é uma parceria internacional que foi criada com dependências conjuntas, o que a torna um programa incrível. É um lugar onde vivemos e operamos no espaço, de forma pacífica”, disse ela. “E eu realmente sinto que esta é uma boa mensagem para nós, que estamos operando pacificamente e seguros agora e seguindo em frente. Se a parceria se rompesse [devido às tensões geopolíticas], seria muito triste”.

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