A Mercedes 770K Grosser Offener Tourenwagen de 1939, limusine blindada que pertenceu a Adolf Hitler, não deve chegar às mãos de um possível novo proprietário, um famoso colecionador bilionário australiano.

O comprador é empresário Clive Palmer – conhecido como “Trump Australiano” (o que ele gosta) ou wannabe de Trump (o que ele não gosta). É um político e magnata, com negócios no mercado de minério de ferro, carvão e níquel, com uma fortuna estimada em US$ 9 bi. Em 2013, ele teve seu momento nos holofotes ao dizer que construiria o Titanic II – e ser eleito deputado. O projeto afundou, mas sua carreira política prossegue (mais ao final).

Palmer diz que o carro seria parte de um museu privado com 600 carros históricos, que ele vem adquirindo nos últimos meses. Esse, ele diz, será o maior museu automobilístico do mundo – o atual campeão, a Cité de L’Automobile, na França, tem 500 exemplares, mas o Sultão de Brunei tem 7 mil em sua coleção privada. A Mercedes de Hitler seria provavelmente seria a atração central nesse museu.

Mercedes 770 como a de Hitler, usada pelo Kaiser Guilherme II | Imagem: nemor2/Wikimedia Commons/CC-BY-SA 2.0

Mercedes de Hitler é mal vinda

As objeções a trazer a limusine de Hitler para a Austrália vão além do óbvio, de ser um potencial símbolo do movimento político mais odioso da história humana. Ainda que não exista lei que impeça um carro ou outro objeto pertencente a Hitler de entrar no país, sua exibição pública tem status discutível – a Australia costuma ser estrita nesse tipo de assunto, mas outras Mercedes que pertenceram a Hitler estão em museus pelo mundo.

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São mais as sanções contra a Rússia que atingem o comprador, porque a Mercedes foi adquirida de um bilionário russo não revelado. E há uma coisa bem mais corriqueira: o carro, como outros veículos do passado, tem partes de amianto, material cancerígeno banido na Austrália. Assim que as notícias da aquisição se espalharam, a ministra do Interior, Karen Andrews, pediu uma investigação ambiental.

O amianto foi amplamente utilizado em freios e peças de motor ao longo da história, e quem na Austrália adquire carros clássicos sem substituir essas peças enfrenta multas enormes.

Hitler e Mussolini desfilando
Mussolini e Hitler desfilando – Imagem: Bundesarchiv, Bild 183-C13771/CC-BY-SA 3.0, CC BY-SA 3.0

Hitler possuiu e usou a limusine blindada por quase três anos, inclusive em aparições oficiais em Berlim (com Mussolini), na França, Grécia e Iugoslávia. Alimentado por um motor supercharged de 8 cilindros e 7,7 litros que produz 230 cv, o Super Mercedes (como passou a ser chamado) podia ir de 0 a 100 km/h em 23 segundos e atingir o máximo de 190 km/h.

Não foi revelado o quanto o bilionário australiano pagou. Na última vez em que a mesma Mercedes de Hitler foi a leilão, em 2017, num negócio que não foi concluído, atingiu US$ 7 milhões.

O outro carro de Palmer

A Mercedes de Hitler não foi a única compra potencialmente controversa de Palmer. Ele adquiriu recentemente, além da Mercedes de Hitler, o Rolls-Royce Phantom que pertenceu ai rei Eduardo VIII da Inglaterra.

Eduardo é infame por seu reinado de menos de um ano, entre janeiro e dezembro 1936. Abdicou em meio a uma crise política, causada por insistir num casamento com um socialite americana divorciada (algo proibido então pelas regras do anglicanismo, religião oficial da monarquia britânica). Socialite que caía também de ser, segundo a inteligência britânica, agente nazista. Eduardo, após a abdicação, visitou a Alemanha com a nova esposa e deu saudações nazistas a quem quisesse ver. Negou até sua morte, em 1972, ser um simpatizante.

“Trump Australiano”

Palmer em campanha do UAP | Imagem: reprodução

Clive Palmer tem uma carreira política que gera comparações com Donald Trump, outro bilionário que ama os holofotes. Como Trump, defende uma plataforma de direita populista, pelo slogan “Make Australia Great” – quase idêntico ao “Make America Great Again” de Trump.

Em 2013, no mesmo ano em que anunciou o Titanic II, ele fundou um partido com o incrivelmente modesto nome de Palmer United Party, e conseguiu eleger a si mesmo e mais três senadores. Depois o partido foi rebatizado de United Australia Party, retomando o nome do partido antitrabalhista e anticomunista que já foi majoritário, mas terminou extinto em 1945.

Em 2021, o partido passou a se chamar Clive Palmer’s United Australia Party, ainda que o site siga com o nome antigo. O partido promete investir bilhões na eleição deste ano.

Entre as bandeiras do UAP, está a oposição aos lockdowns, aos passaportes de vacinação, e pela “liberdade de expressão” contra as Big Techs. Palmer em pessoa já contestou publicamente a eficácia da vacinas, e trouxe anti-vaxxers para seu partido. O partido se gaba de ajudar a abolir impostos sobre emissões de carbono e sobre mineração.

Porque UAP também tem em sua plataforma a defesa das empresas de mineração, a riqueza de Palmer.

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Imagem: Pedro Ribeiro Simões from Lisboa, Portugal, CC BY 2.0