Ciência e Espaço

Pesquisadora detalha descoberta das múmias mais antigas do mundo

Conforme noticiado pelo Olhar Digital, pesquisadores encontraram as múmias mais antigas do mundo – algumas delas, com até 12 mil anos. Os achados foram localizados em vários países asiáticos, como China, Vietnã, Filipinas, Laos, Tailândia, Malásia e Indonésia.

Publicado há 10 dias na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), o estudo foi liderado por Hsiao-chun Hung, pesquisadora sênior da Escola de Cultura, História e Língua da Universidade Nacional Australiana. Ela relatou ao site The Conversation os detalhes dessa incrível descoberta.

Segundo ela, esses achados representam a evidência mais antiga conhecida de mumificação já documentada, muito anterior aos casos clássicos do Egito e da América do Sul. Os ossos analisados datam de 12 mil a quatro mil anos atrás, e registros posteriores revelam que práticas de preservação de corpos semelhantes continuaram em regiões como as terras altas da Nova Guiné e da Austrália até períodos recentes.

Corpos podem ter passado por fogueira antes da mumificação. Crédito: Matsumura et al./Proceedings of the National Academy of Sciences

Anomalias sugeriam mais do que simples enterros

As escavações revelaram corpos enterrados em posição agachada, característica de caçadores-coletores que viveram entre 20 mil e quatro mil anos atrás. Por muito tempo, arqueólogos consideraram esses sepultamentos “primários”, nos quais o corpo era colocado inteiro na cova em uma única cerimônia.

Hung conta que o antropólogo físico Hirofumi Matsumura, porém, notou algo estranho: alguns esqueletos estavam dispostos de maneira incomum e apresentavam sinais de calor em partes do corpo com pouca proteção de músculo e pele. Esses detalhes sugeriam que o processo de sepultamento era mais elaborado do que um simples enterro.

Em setembro de 2017, durante uma pausa nas escavações no sítio Bau Du, no Vietnã, a equipe discutiu essas anomalias. Surgiu então a hipótese de que os corpos poderiam ter passado por uma forma de preservação mais complexa. Esse momento marcou o início da investigação detalhada.

Múmias apresentam sinais de queimadura. Crédito: Matsumura et al./Proceedings of the National Academy of Sciences

Para aprofundar a pesquisa, os cientistas estudaram registros e fotografias de práticas modernas de mumificação por defumação nas terras altas da Nova Guiné. Em janeiro de 2019, visitaram Wamena, na Indonésia, e observaram múmias preservadas em residências locais. A semelhança com os achados arqueológicos foi impressionante, embora muitos esqueletos antigos não mostrassem sinais visíveis de queimadura.

Com a chegada da pandemia de Covid-19, as viagens foram suspensas devido às medidas de contenção e protocolos de prevenção. “Meus colegas e eu estávamos espalhados por diferentes regiões, mas buscamos várias maneiras de continuar o projeto”, lembra a arqueóloga.

A equipe escavando um antigo cemitério de caçadores-coletores em Guangxi, sul da China. Crédito: Hsiao-chun Hung

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Análises confirmaram que múmias foram defumadas

Para confirmar as hipóteses, os pesquisadores analisaram ossos de 54 sepultamentos em 11 sítios arqueológicos, usando difração de raios X e espectroscopia de infravermelho por transformada de Fourier (FTIR).

Esses testes revelaram alterações microscópicas características de aquecimento em baixa temperatura, confirmando que os corpos haviam sido expostos a calor enquanto ainda cobertos por pele e tecidos. “Em outras palavras, quase todos eles foram defumados”, resume Hung. Assim, a equipe comprovou que a mumificação com uso de fumaça já existia há mais de 12 mil anos.

As amostras do sul da China, Vietnã e Indonésia superam em milhares de anos as práticas da cultura Chinchorro, no Chile, e do Egito Antigo. Há indícios de que a tradição se espalhou por toda a Ásia Oriental e possivelmente chegou ao Japão.

Múmias “defumadas” mantidas em residências em Papua, na Indonésia, fotografadas em janeiro de 2019. Crédito: Matsumura et al./Proceedings of the National Academy of Sciences

O ritual continuou por milênios e só começou a desaparecer cerca de quatro mil anos atrás, quando mudanças nos modos de vida alteraram os costumes funerários. Registros etnográficos mostram que práticas semelhantes ainda eram observadas no sul da Austrália até o início do século XX e permanecem em algumas comunidades da Nova Guiné.

Segundo Hung, preparar uma múmia defumada podia levar até três meses de dedicação diária. “Tal devoção extraordinária só é possível por meio de um amor profundo e uma crença espiritual poderosa”.

Para ela, essa tradição reflete um sentimento que acompanha a humanidade desde os primórdios: o desejo de preservar a união entre familiares e entes queridos, mantendo esse laço de geração em geração, independentemente da forma que ele possa assumir.

Esta post foi modificado pela última vez em 26 de setembro de 2025 19:38

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Publicado por
Flavia Correia