Culturalmente, no Brasil, buscamos regular o máximo que podemos, sendo um dos países mais ativos na edição de novas leis taxativas, ao regular todas as variáveis conhecidas. Contudo, essa cultura tem se mostrado contraproducente, uma vez que a constante evolução da sociedade torna a lei taxativa de ontem ineficiente hoje, ganhando contornos ainda mais fortes quando envolve aspectos tecnológicos.

Para ilustrar os desafios acima, destacamos a situação do mercado de criptoativos, que, apesar de existir a 10 anos, encontra-se em constante desenvolvimento, com o surgimento de novas funcionalidades e aplicações constantemente.

Neste cenário, em 2015, quando pouco se discutia no Brasil sobre criptoativos, foi protocolado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº. 2.303, o qual buscava assegurar aos criptoativos o mesmo tratamento conferido às milhas aéreas, tratando-os como meros arranjos de pagamentos. Ao longo dos últimos quatro anos, a tecnologia Blockchain e os criptoativos trouxeram avanços muito além do que os previstos pelo projeto de lei, tornando evidente que a edição de uma regulação taxativa, sem o devido conhecimento sobre a matéria, pode atrasar o desenvolvimento tecnológico.

Recentemente, o referido projeto de lei foi arquivado com o fim da antiga legislatura. Assim, surgem novas discussões sobre a necessidade e método de regulação desse mercado.

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Como vimos, regular novas tecnologias de forma prematura pode não ser a melhor alternativa. Diante disso, vemos com bons olhos iniciativas para criação de Sanbox regulatórios para que empreendedores e reguladores entendam e conheçam cada vez mais as inovações antes de uma definição regulatória. Trata-se de um conceito que vem sendo amplamente utilizado no universo das fintechs, no qual a autoridade estabelece um ambiente controlado para teste de novos modelos de negócios, de acordo com determinadas regras e condições, no intuito de acompanhar de perto a questão.

No Brasil, o Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários têm conduzido iniciativas do gênero, demonstrando uma abertura das autoridades em relação aos avanços tecnológicos.

Fato é que, as iniciativas de Sandbox regulatórios devem ser acompanhadas de perto pelo Poder Legislativo quando da edição de novas leis que versem sobre o tema, sob o risco de tornar tais iniciativas inócuas.

Por essa razão, é fundamental que, ao tratarmos de inovações tecnológicas tal como os criptoativos, o legislador busque editar normas compreendendo o dinamismo tecnológico. Nessa sistemática, vemos com bons olhos normas menos taxativas e mais principiológicas, em que não se busca regular todas as vertentes conhecidas, mas apenas a definição de princípios basilares, permitindo que o mercado se desenvolva e que iniciativas de autorregulação sejam desenvolvidas.

Nessa linha, vale destacar a iniciativa japonesa, em que autoridades definiram regras quanto à natureza e tributação de criptoativos. Contudo, deixaram que o mercado se autorregulasse em alguns aspectos. A exemplo, a autoridade financeira do Japão (FSA) concedeu à Associação Japonesa de Exchanges de Moedas Virtuais o poder para estabelecer regras quanto à proteção dos consumidores, prevenção à lavagem de dinheiro e definição das melhores práticas a serem adotadas pelas exchanges, além do dever de fiscalização e aplicação de penas.

Para que a autorregulação tenha vez no mercado de criptoativos é fundamental a organização sob uma entidade que possa representá-los e atuar nessa frente.

Diante disso, iniciativas como Sandbox regulatórios e a autorregulação do mercado devem ser prestigiadas, à medida que permitem ao regulador conhecer melhor do mercado e definir seus princípios, sem impossibilitar seu desenvolvimento e as futuras inovações dele decorrentes.