Astrônomos descobriram uma gigantesca nuvem venenosa que varre a superfície de Vênus a cada poucos dias – e faz isso há décadas. Essa nuvem é tão maciça que alcança muito além do equador do planeta, tanto ao norte quanto ao sul, e chega a uma altura de cerca de 50 quilômetros.

A pesquisa, liderada pela agência espacial japonesa JAXA e publicada na Geophysical Research Letters, sugere que essa nuvem viaja por Vênus ao menos desde 1983, a uma velocidade de 328 km/h. Ela pode se estender a até 7,5 mil quilômetros de largura. É um fenômeno que nunca foi observado em nenhum outro lugar do Sistema Solar.

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Tamanho da nuvem em escala. Imagem: Javier Peralta/JAXA-Planet C

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Vênus é um planeta rochoso em zona habitável, porém em condições extremas. Completamente envolto em uma atmosfera espessa composta quase inteiramente de dióxido de carbono que gira 60 vezes mais rápido que o próprio planeta, gerando ventos insanos, Vênus é extremamente quente. A temperatura média da superfície do planeta é de 471 ºC. Nele, a pressão atmosférica a altitude zero é quase 100 vezes maior que a da Terra e, se não bastasse tudo isso, ainda chove ácido sulfúrico.

Mas isso não é tudo. Ao estudar imagens infravermelhas tiradas pela sonda japonesa Venus Akatsuki entre 2016 e 2018, pesquisadores da JAXA, liderados pelo físico Javier Peralta, detectou o que parecia uma onda atmosférica, mas a uma altitude sem precedentes. Era muito mais profunda do que qualquer onda atmosférica já vista em Vênus, ocorrendo na camada de nuvens responsável pelo efeito estufa que torna a superfície quente como é.

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Uma análise cuidadosa e um estudo de observações anteriores mostraram que o fenômeno é recorrente, mas passou despercebido desde 1983, uma vez que só poderia emergir depois de uma coleção de observações de um grande número de instrumentos ao longo de um determinado período.

Reprodução

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Fenômeno em escala planetária. Imagem: Javier Peralta/JAXA-Planet C

Os astrônomos descobriram que o fenômeno pode atingir 7,5 mil quilômetros e circula o planeta uma vez a cada 4,9 dias e a 328 km/h. Isso é mais rápido do que as nuvens na mesma altitude, que levam cerca de 5,7 dias para circular o planeta. Mas ainda não se sabe o que causa isso.

“Essa perturbação atmosférica é um novo fenômeno meteorológico, invisível em outros planetas”, explicou Peralta. “Por isso, ainda é difícil fornecer uma interpretação física confiável”. Porém, simulações numéricas revelam que muitas propriedades da ruptura aparecem em uma onda Kelvin atmosférica não linear. Na Terra, são grandes ondas de gravidade (diferentes de ondas gravitacionais), que ocasionalmente são “presas” no equador e são afetadas pela rotação do planeta.

Como as ondas Kelvin da Terra, o fenômeno venusiano se propaga na mesma direção que os ventos que circundam o planeta, sem afetar os ventos meridionais que sopram entre o norte e o sul.

Caso seja uma onda de Kelvin, isso terá implicações interessantes. As ondas Kelvin podem interagir com outros tipos de ondas atmosféricas, como as ondas de Rossby, o que poderia explicar por que a atmosfera de Vênus gira tão rápido. Além disso, pode ajudar a entender a relação entre a topografia do planeta e a dinâmica de sua atmosfera.

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Nuvem em agosto de 2016 (canto inferior esquerdo) e sua evolução entre 2016 e 2018. Imagem: Nasa/IRFT/JAXA-Planet C

“Teríamos finalmente encontrado uma onda transportando momento e energia da atmosfera profunda e dissipando-se antes de chegar ao topo das nuvens”, disse Peralta. “Portanto, estaria depositando momento precisamente no nível em que observamos os ventos mais rápidos da chamada super rotação atmosférica de Vênus, cujos mecanismos são um mistério de longa data”. Vale ressaltar que, em física, momento é a grandeza que representa a magnitude da força aplicada a um sistema rotacional a determinada distância do eixo de rotação.

Mais observações estão em andamento, em busca de novas informações sobre a misteriosa atmosfera venusiana.

Via: Science Alert