Nesta terça-feira (11), o mundo foi pego de surpresa com o anúncio da Rússia da primeira vacina contra a Covid-19. Mas a comunidade científica se mantém um pouco cética em relação à revelação de Vladmir Putin. Em entrevista ao Olhar Digital, Renato Kfouri, infectologista da Associação Paulista de Medicina (APM), afirma que a vacina não terá aprovação mundial se o país não apresentar comprovações de que todos os testes possíveis foram realizados; e, mais, sem critérios rigorosos de licenciamento, o imunizante pode até representar risco à saúde humana. 

Segundo ele, para um licenciamento seguro, são necessários três passos: “a Fase I serve para ver dosagem, segurança, intervalo de aplicação, número de doses e concentração. A Fase II estuda e avalia a resposta imune – se o indivíduo produz anticorpo -, além de repetir os dados de segurança. A Fase III verá se ela funciona”. A terceira etapa também é conhecida por ser a mais abrangente, pois conta com milhares de voluntários que recebem a imunização.

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Rússia desenvolve vacina contra a Covid-19. Imagem: Yegor Aleev/TASS

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Segundo levantamento publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 31 de julho, a vacina russa, batizada de Sputnik V, estava na primeira fase de estudo – como descrito pelo infectologista, são necessárias três fases antes que qualquer imunização seja considerada eficaz. 

“Qualquer vacina que seja produzida sem cumprir essas três etapas de desenvolvimento, certamente enfrentará muita dificuldade em ser adotada em qualquer programa público de vacinação”, acrescenta Kfouri.

No entanto, Vladimir Putin, presidente da Rússia, disse que a vacina criada pelo país “é bastante eficaz”. Como prova disso, ele indica que uma de suas filhas – sem identificar qual das duas – recebeu duas doses do imunizante e “está se sentindo bem e tem um grande número de anticorpos”.

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Presidente russo Vladmir Putin diz que a vacina criada no país é “segura e eficaz”. Foto: iStock

Apesar disso, Kfouri alerta que “qualquer produto experimental, seja um medicamento ou vacina, que não tenha demonstrado sua segurança, coloca em risco toda a população que vai receber esse produto. É uma temeridade licenciar uma vacina – ou medicamento – para a saúde humana que não passe por esses rigorosos critérios de licenciamento”, como submeter os estudos para que sejam validados pela OMS, por exemplo.

Se isso não acontecer, a vacina “certamente será licenciada apenas no país que a produziu. Não terá aceitação da comunidade internacional e da comunidade científica acadêmica”, afirma o infectologista.

Até hoje, a Rússia não publicou nenhum dado sobre a vacina e nem qualquer documento que comprove que todas as fases foram respeitadas. Por conta disso, a “vacina russa não tem e nem terá alguma aprovação de agências do mundo ou da OMS se não apresentar seus estudos”.

Vacina no Brasil

Atualmente, o Brasil possui alguns testes em andamento. A “Vacina de Oxford”, produzida pela companhia farmacêutica AstraZeneca, está sendo testada em 5 mil profissionais de saúde no RJ e SP. Já a CoronaVac, da empresa chinesa Sinovac, será testada pelo Instituto Butantan em 9 mil voluntários em seis estados brasileiros.

Ainda nesta terça, segundo o Chefe do Fundo Soberano Russo, Kirill Dmitriev, poderíamos ter a criação russa como nova candidata. Ele afirmou que o imunizante seria produzido no Brasil, potencialmente a partir de outubro, desde que tivesse a aprovação da Anvisa. Entretanto, ele não informou qual laboratório produziria a substância.

Em declaração à Rádio Bandeirantes, Doria afirmou: “A (vacina) russa não. Não sou capaz de avaliar se é boa ou não é, se tem o aval da Organização Mundial de Saúde. Não quero fazer pré-avaliação. Pelo Butantan, não. Houve uma procura, mas foi respondido que já temos uma associação com o laboratório chinês Sinovac para a produção da CoronaVac. Não faria sentido algum ter uma segunda alternativa no mesmo Butantan, cujo objetivo é o mesmo”.

A Anvisa também negou a afirmação, dizendo que até o momento, “o laboratório russo responsável pelo desenvolvimento da vacina não apresentou nenhum pedido de autorização de protocolo de pesquisa ou de registro da vacina para a Anvisa. Também não há solicitação de qualquer entidade ou parceiro da referida vacina”.