Recentemente, a plataforma de streaming HBO Max estreou a série The Last of Us baseada na franquia de jogos eletrônicos criada por Neil Druckmann. O grande sucesso do primeiro episódio tomou conta dos noticiários ao longo da semana, tendo mesmo superado a audiência da estreia da série House of the Dragon e da segunda temporada de Euphoria na América Latina.

O primeiro episódio já começa com uma cena, ambientada em 1968, em que dois epidemiologistas são entrevistados sobre a possibilidade de novas epidemias, sendo que um acredita em um vírus, e o outro em um fungo como agente causador da próxima. Na série, o Cordyceps é o fungo responsável por controlar a mente dos seres humanos. Mas, na vida real, esse fungo existe…

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Na verdade, existem mais de 600 espécies já descritas que infectam insetos e outros artrópodes, como escorpiões e aranhas, transformando-os em “zumbis”. Estes fungos são capazes de controlar as funções motoras para a sua propagação, através de alterações no comportamento do seu hospedeiro. A infeção em humanos, como retratada na série, seria improvável e seriam necessárias grandes alterações e alguns milhões de anos.

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Mas não é impossível! Mesmo que a maioria dos fungos não consigam se desenvolver satisfatoriamente em temperaturas acima de 25°C, a evolução mostrou o contrário. A Candida auris começou a infectar humanos após se conseguir adaptar nos corpos das aves, tornando-se um patógeno humano resistente.

Mundialmente, infeções por fungos matam 1,7 milhão de pessoas todos os anos. Eles evoluem rapidamente e viram infecções mais difíceis de serem tratadas, por conta do alto potencial de resistência antifúngica, tornando-se um desafio na busca de tratamentos e vacinas. Além de outras peculiaridades que podem facilitar sua adaptação às mudanças climáticas e ao nosso sistema imune. Exemplo mais recente é o observado em pacientes imunocomprometidos ou após a recuperação da COVID-19, em que a pessoa está mais vulnerável a infecções oportunistas, principalmente às infecções fúngicas por Candida albicans e Candida auris. Além disso, alguns fungos podem cruzar a barreira hematoencefálica, infectando o Sistema Nervoso Central.

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Apesar de não existirem evidências de que estamos próximos do cenário retratado na série, a humanidade está a criar condições perfeitas para conduzir e selecionar fungos capazes de se desenvolverem em temperaturas elevadas e cada vez mais resistentes. Devido ao aquecimento global e o uso de fungicidas na agricultura, pode-se acelerar alguns anos de evolução e direcionar a seleção de características que nos deixa mais susceptíveis a infecções.

Até que ponto a presença de fungos no Sistema Nervoso Central pode nos tornar verdadeiros “zumbis”?

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Os corpos podem se tornar uma extensão do próprio fenótipo do fungo, já que o fungo é conhecido por secretar metabólitos específicos no tecido e causar alterações na expressão gênica do hospedeiro. O que resulta no comportamento alterado do hospedeiro.

As células fúngicas estão conectadas e formam uma rede para controlar o comportamento do hospedeiro coletivamente.

Até então, como exemplo das formigas zumbis, as células fúngicas controlam o sistema nervoso periférico, preservando o cérebro para a sobrevivência do animal enquanto o fungo projeta o objetivo final que é se propagar. No primeiro episódio da série vemos que a forma de propagação é através da mordida.

Os cérebros das formigas manipuladas apresentam alterações em substâncias neuromoduladoras, sinais de neurodegeneração, alterações no uso de energia e compostos antioxidantes que sinalizam reações de estresse por parte do hospedeiro.

Mas estou falando em formiga, para humanos é mais improvável que tal fungo possa nos transformar em zumbis, devido a diferenças entre a biologia humana e a dos insetos.

Eu penso que o improvável não é impossível… Abre-se a possibilidade, mesmo que remota, de uma pandemia já que poderia, facilmente, perder o poder de controle da mente no processo.

Este texto faz parte de um estudo que estou fazendo junto com a também bióloga e Infectologista Dalila G Suterio.


Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, é um Pós-doutor e PhD em neurociências eleito membro da Sigma Xi, The Scientific Research Honor Society e Membro da Society for Neuroscience (USA) e da APA – American Philosophical Association, Mestre em Psicologia, Licenciado em Biologia e História; também Tecnólogo em Antropologia com várias formações nacionais e internacionais em Neurociências e Neuropsicologia. É diretor do Centro de Pesquisas e Análises Heráclito (CPAH), Cientista no Hospital Universitário Martin Dockweiler, Chefe do Departamento de Ciências e Tecnologia da Logos University International, Membro ativo da Redilat, membro-sócio da APBE – Associação Portuguesa de Biologia Evolutiva. Membro Mensa, Intertel e TNS.

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