Lançado em fevereiro de 1993, o Satélite de Coleta de Dados 1 (SCD-1) entrou para a história como o primeiro satélite projetado, construído e operado pelo Brasil

Nesta segunda-feira (26), ele completa 30 anos, quatro meses e 13 dias em órbita da Terra, o que ultrapassa em 10 dias o tempo recorde anterior de um equipamento enviado ao espaço para observação do planeta – marco antes pertencente ao Geotail (uma parceria entre as agências espaciais norte-americana, NASA, e japonesa, JAXA).

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Além disso, a espaçonave também superou sua própria expectativa de vida em mais de 30 vezes, já que foi desenvolvido para durar apenas um ano.

De maneira geral, satélites pequenos mais modernos funcionam por cerca de cinco anos. Quando se aposentam, eles permanecem em órbita como lixo espacial por, no máximo, 25 anos. Depois disso, mergulham na atmosfera da Terra para uma morte flamejante.

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Ou seja, até mesmo o período máximo de permanência em órbita de um satélite inativo o SCD-1 excedeu – e ainda está em funcionamento.

O Satélite de Coleta de Dados 1 (SCD-1), desenvolvido pelo Inpe, é o equipamento enviado ao espaço para observação da Terra que está há mais tempo em órbita. Crédito: Inpe

Satélite foi desenvolvido pelo Inpe

O projeto é de responsabilidade do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que classifica a espaçonave como “um tributo à competência da engenharia espacial brasileira”.

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Em entrevista ao Tilt, do Uol, Sebastião Varotto, engenheiro do Inpe, disse que o lançamento e consequente sucesso do SCD-1 representou uma grande conquista para a instituição e para o Brasil, com o objetivo de alcançar a autonomia de acesso ao espaço e o desenvolvimento de satélites em território nacional. “Este recorde realça a robustez do projeto e a elevada qualidade da fabricação, da integração e dos testes realizados”.

Segundo Varotto, o SCD-1 já percorreu mais de sete bilhões de quilômetros orbitando a Terra – o que daria quase para ir a Marte e voltar duas vezes. 

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Atualmente ofuscado pelas novas tecnologias, o satélite brasileiro SCD-1 foi considerado um avanço na época em que foi lançado, ficando entre os melhores do mundo em relação à previsão do tempo. Crédito: Inpe

Embora seja lembrado com nostalgia, o equipamento atualmente é ofuscado pelas novas tecnologias (e pelo sucateamento da ciência brasileira). No entanto, quando foi lançado, ele representou uma verdadeira revolução. Na época, os modelos de previsão do tempo ofereciam apenas 50% de acerto no Brasil. “Com o SCD, chegamos a 80% de precisão, ficando entre os melhores do mundo”, disse Varotto.

Para isso, o equipamento coleta dados ambientais e meteorológicos de estações de monitoramento espalhadas pelo território brasileiro e os transmite a centros de processamento localizados em Cuiabá (MT) e em Natal (RN). Essas Plataformas de Coleta de Dados Ambientais (PCDs) são providas de instrumentos capazes de levantar informações como:

  • nível de água em rios e represas 
  • qualidade da água 
  • precipitação pluviométrica 
  • pressão atmosférica 
  • intensidade da radiação solar
  • temperatura do ar

No entanto, diante de novos modelos e supercomputadores, tais dados deixaram de ser tão relevantes. “Mas naquele tempo, com capacidade computacional limitada e sem redes de celular, eles foram essenciais para a meteorologia e a previsão climática”, completa Varotto.

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Vale destacar, também, que a rede de PCDs sofreu uma significativa queda. Houve um tempo em que existiam mais de 700 delas em todo o Brasil e em países de fronteira. Agora, são somente 127, já que muitas foram abandonadas ou quebradas. 

Ainda assim, as informações levantadas pelo SCD-1 abastecem o Sistema Integrado de Dados Ambientais (Sinda), que permite monitorar bacias hidrográficas, fazer planejamento agrícola e manejar desastres naturais, além de previsão do tempo e clima.

Esse sistema é acessado por 80 empresas e instituições, como a Agência de Desenvolvimento da Amazônia (ADA) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), além de universidades, indústrias, usinas hidrelétricas, Marinha, Defesa Civil, entre outros.

Fusca espacial

Com formato de um prisma octogonal, o SCD-1 pesa cerca de 115 kg, distribuídos em um metro de largura por 1,45 m de altura. Seus oito lados e a parte de cima são cobertos por painéis solares. 

Posicionado a 750 km de altitude, o satélite viaja a 27 mil km por hora, levando uma hora e 40 minutos para dar uma volta completa na Terra. Dessa forma, a espaçonave passa 16 vezes por dia sobre o território brasileiro para cumprir sua função.

Com o passar dos anos, foram aparecendo os sinais de cansaço. As baterias do satélite já não são capazes de armazenar energia. Então, desde 2010, o equipamento só funciona quando os painéis recebem a luz do Sol. Assim, o SCD-1 fica ligado cerca de 60% do tempo. 

Além disso, desde que entrou em órbita, sua velocidade de rotação (os giros em torno de si mesmo) diminuiu muito. Dos iniciais 120 rpm (rotações por minuto), agora ele atinge menos de 10 rpm.

Isso afeta a estabilidade da órbita e o ângulo em relação à superfície do planeta, superaquecendo seus componentes, que hoje operam acima do limite. Segundo a reportagem do Tilt, os técnicos do Inpe ainda conseguem fazer algumas manobras para controlar a atitude, mas com cada vez menos eficácia.

A concepção do SCD-1 foi como a de um Fusca: simples e robusto. Se não tiver bateria, é só empurrar que pega. Um satélite não tem chave. É lançado ligado e fica assim pra sempre. A maioria deles acaba por questão energética, como um celular velho. Mas este tem um jeito de continuar funcionando, mesmo que parcialmente, só com a tensão gerada nos painéis solares.

Sebastião Varotto, engenheiro do Inpe

Cinco anos depois do lançamento do SCD-1, foi lançado o SCD-2. Também com expectativa de vida de um ano, ele continua ativo, e, segundo Varotto, é provável que venha, um dia, a bater o recorde do irmão mais velho.

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