Funcionários obrigados a voltar ao escritório tendem a trabalhar na concorrência

Estudo analisou Apple, Microsoft e SpaceX; geralmente, quem deixa as empresas e vão para rivais são empregados de nível sênior
Rodrigo Mozelli16/05/2024 06h10
Ilustração de funcionários de escritório usando inteligência artificial no setor financeiro
Imagem: Pedro Spadoni via DALL-E/Olhar Digital
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Um estudo que analisou Apple, Microsoft e SpaceX sugere que os mandatos de regresso ao escritório (RTO, na sigla em inglês) podem levar a taxa mais elevada de funcionários, especialmente os de nível sênior, que abandonam a empresa, muitas vezes para trabalhar em concorrentes.

Segundo a ArsTechnica, o estudo, publicado este mês por pesquisadores da Universidade de Chicago e da Universidade de Michigan e citado pelo The Washington Post no último domingo (12), diz o seguinte:

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Neste artigo, fornecemos evidências causais de que as exigências de RTO em três grandes empresas de tecnologia – Microsoft, SpaceX e Apple – tiveram efeito negativo no mandato e na antiguidade de sua respectiva força de trabalho. Em particular, encontramos os efeitos negativos mais fortes no topo das respectivas distribuições, implicando êxodo mais pronunciado de pessoal relativamente superior.

Autores do estudo

Imagem: Shutterstock

Estudo sobre os funcionários

  • O estudo analisou dados de currículos do People Data Labs e usou “260 milhões de currículos correspondentes aos dados da empresa”;
  • Ele examinou três empresas, mas os autores observaram que Apple, Microsoft e SpaceX representam 30% da receita da indústria tecnológica e mais de 2% da força de trabalho da indústria tecnológica;
  • As três empresas também tiveram influência no estabelecimento de padrões de RTO em outras companhias;
  • Robert Ployhart, professor de administração e gestão de empresas da Universidade da Carolina do Sul e acadêmico da Academy of Management, disse ao Post que, apesar do estudo ser limitado às três empresas, suas conclusões são reflexo amplo dos efeitos das políticas de RTO nos EUA.

“No seu conjunto, nossas conclusões implicam que os mandatos de regresso ao cargo podem implicar custos significativos de capital humano em termos de produção, produtividade, inovação e competitividade para as empresas que os implementam”, diz o relatório.

Após a Apple ter promulgado o seu mandato RTO, que permite aos funcionários trabalhar em casa por tempo parcial, parte de sua base de funcionários considerada de nível sênior diminuiu cinco pontos percentuais, diz o relatório.

Já a Microsoft, que também adotou abordagem híbrida de RTO, incluindo opção de trabalhar apenas remotamente, dependendo da aprovação do gerente, viu declínio de cinco pontos percentuais.

Enquanto isso, o mandato RTO da SpaceX exige que os trabalhadores estejam no escritório em tempo integral. A porcentagem de funcionários de nível superior caiu 15 pontos percentuais após a ordem, concluiu o estudo.

“Descobrimos que funcionários experientes afetados por essas políticas em grandes empresas de tecnologia procuram trabalho em outro lugar, levando consigo alguns dos mais valiosos investimentos em capital humano e ferramentas de produtividade”, disse um dos autores do relatório, Austin Wright, professor assistente de políticas públicas na a Universidade de Chicago, ao Post.

Christopher Myers, professor associado de gestão e saúde organizacional na Universidade Johns Hopkins, sugeriu ao periódico que a saída de trabalhadores de nível sênior poderia estar ligada ao moral “ferido” provocado pelo RTO, observando que “é mais fácil gerenciar uma equipe que é feliz”.

Microsoft
Imagem: The Art of Pics/Shutterstock

Questão frequente

Desde o levantamento das restrições da Covid-19, está em debate se o regresso dos funcionários ao trabalho em escritórios é necessário ou benéfico para as empresas.

Estima-se que 75% das empresas de tecnologia nos EUA são consideradas “totalmente flexíveis”, de acordo com relatório de 2023 da Scoop. Conforme observado pelo Post, no entanto, as maiores áreas metropolitanas dos EUA têm, em média, 51% de ocupação de escritórios, aponta a empresa de serviços gerenciados de segurança Kastle Systems, que afirma analisar “dados de acesso de cartão-chave, controle remoto e aplicativo KastlePresence em 2,6 mil edifícios e 41 mil empresas.”

Questionadas sobre o estudo, a Microsoft se recusou a comentar, enquanto a SpaceX não respondeu. Já a Apple, por meio de seu porta-voz, Josh Rosenstock, disse ao Post que o relatório tirou “conclusões imprecisas” e “não reflete a realidade do nosso negócio”. Ele informou ainda que “o atrito está em níveis historicamente baixos”.

Contudo, algumas empresas têm dificuldades para fazer com que os funcionários que passaram meses fazendo seu trabalho em casa sem problemas fiquem ansiosos para retornar ao escritório.

Dell, Amazon, Google, Meta e JPMorgan Chase rastrearam a passagem dos crachás dos funcionários para garantir que os funcionários cheguem ao escritório com a frequência esperada.

A Dell também começou a monitorar o uso de VPN esta semana e disse aos trabalhadores que atual remotamente em tempo integral que não conseguiriam ser promovidos.

Alguns executivos estão convencidos de que o trabalho remoto pode prejudicar a capacidade de inovação de uma empresa. No entanto, há pesquisas que sugerem que os mandatos de RTO não são benéficos para as empresas.

spacex starship
Imagem: Tada Images/Shutterstock

Segundo a ArsTechnica, uma pesquisa com 18 mil estadunidenses divulgada em março deste ano apontou horários de trabalho flexíveis ajudando a saúde mental. E uma análise de 457 empresas do S&P 500 em realizada em fevereiro concluiu que as políticas de RTO prejudicam o moral dos funcionários e não aumentam o valor da empresa.

Rodrigo Mozelli é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) e, atualmente, é redator do Olhar Digital.