Tom Bickle, estudante de astronomia em Southampton (Inglaterra), encontrou uma mancha diferente se movendo na tela de seu computador, certo dia, enquanto vasculhava imagens do céu noturno, em busca de um possível nono planeta e outros objetos ocultos no Sistema Solar e além. “Soube imediatamente que era incomum”, disse o jovem ao The New York Times.

Astrônomos profissionais acompanharam a descoberta. O objeto em questão é uma estrela de baixa massa, ou uma anã marrom, e está viajando pelo espaço a mais de 1,6 milhão km/h. Isso indica que ele pode superar as forças gravitacionais da Via Láctea e “escapar” dela.

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“Foi bem quando esse número saiu que percebemos que tínhamos algo espetacular”, disse Adam Burgasser, físico da Universidade da Califórnia em San Diego (EUA), líder de estudo sobre o tema, publicado este mês no The Astrophysical Journal Letters. “Ficamos muito animados”, salientou.

Outra imagem simulando a possível estrela
Em outro cenário, estrela pode ter sido parte de aglomerado globular e, então, ter tido encontro próximo com par binário de buracos negros que a lançou para o Espaço (Imagem:Adam Makarenko/Observatório WM Keck)

A descoberta pode ajudar a entender as estrelas mais antigas — e algumas das mais rápidas — de nossa galáxia, conhecidas como estrelas do halo. “Uma das maneiras de encontrarmos estrelas velhas é que sabemos que elas estão se movendo em órbitas muito estranhas”, indicou Burgasser.

A maioria das estrelas próximas ao Sol orbita em torno do disco da Via Láctea em círculo. Mas as estrelas do halo costumam ter trajetórias ovulares, ou inclinadas para longe do plano galático.

Especula-se que isso se dá, pois, elas, possivelmente, se formaram antes que a Via Láctea se estabelecesse em sua estrutura atual, afirmou Burgasser. “As velocidades rápidas das estrelas do halo são realmente assinatura de suas diferentes origens”, acrescentou.

Objeto veloz vai nos ajudar a descobrir mistérios de nossa galáxia?

  • Mais de uma dúzia de estrelas de “hipervelocidade” (que viajam pela galáxia a mais de 1,44 milhão km/h) foram descobertas até agora;
  • Mas todas estão próximas ou são maiores que a massa do Sol;
  • Em contrapartida, o objeto recém-descoberto, nomeado como CWISE J1249+3621, tem somente 8% da massa solar;
  • Isso o coloca no limite de classificação entre estrela e anã marrom (que não tem massa suficiente para fundir hidrogênio);
  • Segundo Burgasser, não está claro que objetos com massa tão baixa, como o recém-descoberto pelo estudante, poderiam ter se formado no início da Via Láctea;
  • Sua altíssima velocidade sugere que ele pode ter origem incomum.

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Uma teoria alternativa para como o CWISE J1249+3621 conseguiu chegar a tamanha velocidade é que teria estado preso em órbita ao redor de uma anã branca, ou do núcleo restante de uma estrela que explodiu. O impacto dessa suposta supernova teria força o bastante para impulsionar o objeto na velocidade em que ele se encontra atualmente.

Outra possibilidade levantada pelos astrônomos é que o objeto poderia ter sido parte de aglomerado de estrelas que encontrou um par de buracos negros. Essa suposta interação expeliu violentamente o objeto de seu sistema, fazendo-o vagar pela galáxia.

Três observadores amadores, incluindo o jovem Bickle, foram creditados pela descoberta do CWISE J1249+3621 pelo projeto chamado Backyard Worlds: Planet 9. Os participantes buscam fontes móveis em imagens tiradas pelo telescópio espacial Wide-field Infrared Survey Explorer (WISE) da NASA e sua missão estendida, encerrada em julho.

ilustração da via láctea
Objeto pode estar rumando para fora da Via Láctea (foto) (Imagem: nednapa/Shutterstock)

Você pensaria que até poderia escrever um software para fazer isso, [mas o olho humano] é muito melhor e muito mais rápido em encontrar essas pequenas estrelas em movimento do que qualquer algoritmo que tentamos.

Adam Burgasser, físico da Universidade da Califórnia em San Diego (EUA) e líder do estudo, em entrevista ao The New York Times

Para confirmar a velocidade do objeto misterioso, os pesquisadores usaram dados de pesquisas celestes existentes e observações adicionais realizadas com o telescópio Keck II, que fica no Havaí (EUA). Porém, para entender exatamente de onde ele veio, mais informações sobre sua química serão necessárias.

A composição química dos objetos mais antigos da galáxia, por exemplo, deve se assemelhar à composição presente na Via Láctea primitiva; um objeto explodido por uma supernova. Mas, por outro lado, ele será rico em níquel.

Burgasser não tem preocupações com relação a captar uma imagem do objeto antes que ele nos deixe. Enquanto, para nós da Terra, mais de um milhão de quilômetros por hora seja algo impressionante, ele está se deslocando a apenas 1,5 anos-luz por milênio. Além disso, “o espaço é grande. Podemos nos dar ao luxo de levar nosso tempo”, concluiu o físico.