Pesquisadores sequenciaram o DNA de uma comunidade cristã que vivia em cavernas na região da atual Espanha durante a Idade Média. O objetivo do estudo era tentar entender porque estas pessoas preferiam estes locais e não as habitações convencionais existentes na época, e acabou trazendo descobertas surpreendentes.

Habitantes tinham um estilo de vida diferenciado

  • O assentamento existiu de meados do século VI ao século XI d.C.
  • Neste mesmo período, diversas cidades floresciam na Península Ibérica, caso de Toledo, Granada e Córdoba, que eram grandes centros de comércio, diplomacia e poder.
  • O sítio rural de Las Gobas, localizado na província de Burgos, atual norte da Espanha, no entanto, foi o escolhido por uma pequena comunidade cristã.
  • Ele foi inicialmente conectado a uma igreja, também construída dentro do complexo de cavernas.
  • Já no século X, os habitantes se mudaram para uma vila rural.
  • Escavações arqueológicas no local descobriram os restos mortais de 41 pessoas.
  • Cerca de 28 deles foram analisados através de exames de DNA.
  • As descobertas foram apresentadas em estudo publicado na revista Science Advances.
Cemitério de Las Gobas (Imagem: reprodução/Science Advances)

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Descobertas sugerem como era a vida nas cavernas

Os pesquisadores descobriram que os habitantes eram predominantemente de ascendência ibérica local, com contribuição mínima dos norte-africanos. A conclusão se alinha com os registros históricos que indicam influência genética limitada das populações do norte da África no norte da Península Ibérica durante a Idade Média.

Dois dos esqueletos que datam da fase inicial do assentamento exibiam sinais de violência, que provavelmente resultaram de golpes de espada na cabeça. Os dois eram geneticamente intimamente relacionados. Surpreendentemente, um deles sobreviveu a uma lesão que cortou o crânio.

As análises ainda apontaram para graus elevados de endogamia, ou seja, de relações sexuais apenas dentro da própria comunidade. Os dados coletados também mostram que vários dos primeiros machos são parentes próximos porque existem apenas variações relativamente pequenas observadas em seu cromossomo Y.

A fase inicial do assentamento de Las Gobas também revelou vários casos da bactéria Erysipelothrix rhusiopathiae, que causa uma doença de pele em humanos. A presença dessa bactéria, comumente encontrada em porcos, sugere que a criação desses animais era uma parte essencial do estilo de vida da comunidade. Além disso, uma das pessoas infectadas com E rhusiopathiae também carregava Yersinia enterocolitica, uma bactéria conhecida por infectar humanos por meio de carne ou água estragadas.

Crânios encontrados em assentamento da Idade Média (Imagem: reprodução/Science Advances)

A endogamia permaneceu uma característica forte ao longo da história da população, mesmo quando a comunidade fez a transição de habitações em cavernas para um assentamento rural mais típico no século X. Nessa fase posterior, foram detectados sinais do vírus da varíola.

A doença, com sua alta taxa de mortalidade, foi sugerida por alguns pesquisadores como tendo chegado à Península Ibérica por meio da conquista muçulmana. No entanto, a cepa de varíola Las Gobas se assemelhava às encontradas na Escandinávia, Rússia e Alemanha durante o mesmo período.

O aumento da mobilidade, exemplificado pela crescente importância da cidade de Santiago de Compostela, no norte, para os peregrinos cristãos nos séculos IX e X, pode até ter ajudado a espalhar o vírus.

Segundo os cientistas, os exames de DNA revelam uma comunidade marcada pelo isolamento, violência e adoração devota. O que começou como um grupo de habitantes de cavernas evoluiu para uma típica vila rural, tendo que enfrentar diversos tipos de doenças.