Na internet, ronda há tempos o boato de que o vidro seria um líquido, mas que se move muito devagar para ser percebido assim. Geralmente acompanhado desse “fato” está o argumento de que os vitrais em igrejas antigas são mais grossos na parte inferior, sendo este o resultado da acumulação do fluido devido à gravidade.
No entanto, isso não é verdade. O vidro pode ter muito em comum com os líquidos, mas também é próximo dos sólidos. Mas afinal, o que ele realmente é?

O vidro é um líquido ou um sólido?
Existem diversos tipos de vidro, mas o mais fácil de se encontrar é o composto de dióxido de silício. Quando a areia de quartzo (SiO₂) é aquecida o suficiente, ela se transforma em líquido. Nesse estado, as moléculas são livres para fluir dentro do material.
Porém, se resfriarem essa substância rápido o suficiente, ao contrário de metais e outros sólidos, ela não formará uma estrutura cristalina organizada. Na verdade, sua viscosidade vai aumentar e o aumento dessa propriedade tende a impedir a cristalização.
“Se a viscosidade aumentar o suficiente à medida que é resfriado ainda mais, pode nunca cristalizar. Ela aumenta rápida e continuamente, formando um xarope espesso e, eventualmente, um sólido amorfo”, explica Philip Gibbs para a Universidade da Califórnia, em Riverside.

Nesse caso, as moléculas têm um arranjo desordenado, mas coesão o suficiente para manter alguma rigidez. Com isso, o vidro tem propriedades semelhantes às de líquidos e sólidos, mas não flui como o primeiro, conforme afirma o popular boato.
“Em escalas de tempo curtas, o vidro se comporta como um sólido. Mas a estrutura líquida do vidro significa que, durante um período suficientemente longo, ele passa por um processo chamado relaxamento“, explicam os cientistas de materiais, John Mauro e Katelyn Kirchner em um artigo para The Conversation.
O relaxamento é um processo contínuo, mas muito lento, em que os átomos de um pedaço de vidro se reorganizam em uma estrutura mais estável. Segundo os pesquisadores, ao longo de um bilhão de anos, um fragmento de vidro mudará de forma em menos de um nanômetro, cerca de 1/70.000 o diâmetro do cabelo humano.
Por que ele é transparente?
Essa estrutura amorfa e caótica permite que a luz atravesse por ela sem muita dispersão, de forma parecida com a água. Mas, isso não explica por que o vidro é transparente. Essa resposta envolve o nível subatômico e os elétrons.
Quando um fóton atinge um material sólido, ele interage com as partículas de diferentes formas. O objeto pode absorver o fragmento de luz e geralmente aquece com sua energia. Nesse caso, o fóton desaparece, o que significa que não há reflexão.
A partícula luminosa também pode ser refletida. De forma simples, afinal esse campo da física é bastante complexo, o material absorve o fóton por um momento e, em seguida, emite outro fóton do mesmo comprimento de onda.
Nos dois casos, devido à absorção, a luz não atravessa o objeto. Porém, ela pode passar inalterada por certos materiais, o que é conhecido como transmissão.

Se o fóton que chega à substância não tiver energia suficiente para excitar os elétrons para um estado energético mais alto, a partícula luminosa não será absorvida e poderá passar. Na maioria dos materiais, a luz visível é o suficiente para estimular os elétrons, por isso não são translúcidos.
Porém, no vidro, as lacunas entre os possíveis estados de energia são grandes. Assim, os fótons não conseguem empurrar os elétrons para um nível energético mais alto, passando livremente.
Um caso a parte é o da luz ultravioleta, que é suficiente para excitar os elétrons e, assim, não conseguir passar pelo material. Isso dá ao vidro algumas propriedades de filtragem de raios UV.
A composição do vidro é o que faz dele um material tão importante para a humanidade. Sem ele, a ciência, a engenharia e a culinária não seriam as mesmas.