Trump vai tentar evitar banimento do TikTok nos EUA, diz jornal

Cartada final seria dada um dia após o fim do prazo dado à ByteDance para vender plataforma
Rodrigo Mozelli15/01/2025 19h18, atualizada em 15/01/2025 20h39
Ao fundo, rosto de onald Trump desfocado; à frente, logo do TikTok em um smartphone
(Imagem: miss.cabul/Shutterstock)
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A dias de sua posse, o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, vai tentar dar uma cartada final para salvar o TikTok de ser banido. Para isso, ele considera emitir uma ordem executiva assim que assumir o cargo, na segunda-feira (20), um dia depois do provável fim da plataforma no país.

Essa ordem suspenderia a aplicação da lei que obriga o banimento da plataforma caso a chinesa ByteDance não venda sua parte estadunidense do TikTok por 60 a 90 dias. Segundo fontes do The Washington Post, dessa forma, Trump espera que um possível adiamento na aplicação da regulação lhe dê uma espécie de vitória antecipada.

Trump estuda formas de salvar o TikTok

  • Segundo o periódico estadunidense, o presidente eleito estuda formas de salvar a rede social chinesa, falando sobre negociações não convencionais e manobras legais;
  • Entre essas maneiras, está a ordem executiva, disseram duas fontes próximas ao assunto, que não quiseram se identificar;
  • Além disso, Trump tem muito interesse em manter o TikTok no ar, pois ele entende que seria visto como um “salvador da pátria“, resgatando uma plataforma na qual ele é amplamente admirado, segundo informações de pessoas próximas;
  • Dessa forma, seus assessores políticos e aliados de negócios precisariam correr atrás de opções que permitissem ao futuro presidente cumprir sua promessa de campanha de salvar o TikTok;
  • Trump tem cerca de 144 milhões de seguidores na rede social chinesa e, além de publicar, na plataforma, que desejaria evitar seu banimento, declarou, no mês passado: “Tenho um lugar quente no meu coração para o TikTok.

Logo do TikTok em um smartphone que está em cima de um notebook
Rede social chinesa deve ser banida no domingo (19); Trump vai tentar “ressuscitá-la” no dia seguinte (Imagem: miss.cabul/Shutterstock)

E como ele fará isso?

A lei, sancionada pelo presidente Joe Biden, obriga que a ByteDance venda a rede social até 19 janeiro, sob pena de banimento. Espera-se que a Suprema Corte, que julga a apelação da chinesa contra a regulação, não se imponha contra a determinação de Biden e permita o bloqueio do TikTok.

Por sua vez, Trump estaria ansioso para ser visto como “fazendo um acordo” e assinar a ordem executiva tão logo o prazo se encerre, dando ao processo um tom digno de cinema, segundo uma das fontes do Post familiarizada com o assunto.

Mas há um porém. Para observadores jurídicos, uma ordem executiva de Trump pode não superar uma lei que foi aprovada pelo Congresso tanto por republicanos, como por democratas, e de forma esmagadora.

Alan Rozenshtein, ex-conselheiro de segurança nacional do Departamento de Justiça (DOJ), agora na Universidade de Minnesota (EUA), disse ao Post que as ordens executivas “não são documentos mágicos. São apenas comunicados de imprensa com artigos de papelaria mais bonitos“.

O TikTok ainda será banido e ainda será ilegal para a Apple e o Google fazerem negócios com eles. Mas isso tornará a intenção do presidente de não aplicar a lei muito mais oficial”, prosseguiu.

Aliados políticos do futuro presidente trabalharam sua imagem, de modo que ele fosse visto como o único homem qualificado para resgatar a rede social chinesa. Em documento enviado à Suprema Corte, eles afirmaram que Trump, “sozinho, possui a experiência consumada em negociações, o mandato eleitoral e a vontade política de negociar uma resolução para salvar a plataforma“.

Trump: do apoio ao banimento do TikTok à tentativa de salvamento

Em seu primeiro mandato, Trump tentou banir o TikTok, mas, nos últimos anos, o celebrou como forma de minar empresas de tecnologia das quais ele não gostava, como a Meta, bem como se aproximar de eleitores jovens em idade viral. Para isso, durante sua campanha, ele foi acompanhado por um jovem, especialista na plataforma chinesa, que fez vídeos do republicano para postar na rede da ByteDance.

Em dezembro, o chefe do TikTok, Show Zi Chew, saiu de seu país natal, Cingapura, e viajou para a casa de Trump em Mar-a-Lago, Palm Beach. Foi sua última tentativa desesperada de evitar que a plataforma saísse dos EUA.

Pouco depois, Trump publicou no Truth Social, rede social do republicano, coleção de dados que mostram que ele é uma estrela no TikTok, com vídeos que indicam que o presidente eleito e sua campanha foram visualizados quase quatro bilhões de vezes, superando a ex-candidata Kamala Harris, Fox News e a cantora Taylor Swift.

Já este mês, ele publicou, novamente no Truth Social, que não tinha razões para querer se livrar da plataforma chinesa. “Por que eu iria querer me livrar do TikTok?”, disse.

Uma outra forma que Trump poderia minar a lei seria pressionando o Congresso a revogá-la. Contudo, isso seria difícil, uma vez que ela foi um dos poucos acordos bipartidários do Capitólio em 2024. Outra maneira seria instruir sua procuradora-geral, Pam Bondi, a não aplicá-la, fazendo vista grossa e fingindo que a regulação não existe. Bondi se recusou a se comprometer em cumprir a lei durante a sabatina que o confirmou no cargo, realizada nesta quarta-feira (15).

Pessoas ligadas ao presidente eleito dizem ainda que, para satisfazer a lei, seria possível vender partes da empresa, dar às companhias estadunidenses parte do negócio e deixar Trump levar o crédito pelo acordo. A regulação diz que o TikTok poderá seguir atuando em solo estadunidense caso a ByteDace execute “alienação qualificada“, transação que dá ao presidente ampla margem de manobra para defini-la.

Interessados na rede social argumentaram que Trump deveria ajudá-los a assumir o controle da empresa e administrá-la como se fosse dos EUA. Em seu primeiro mandato, Trump pressionou para que boa fatia da companhia fosse vendida para gigantes, como Oracle e Walmart, contanto que o Tesouro dos EUA recebesse parte dos lucros.

Uma das pessoas que participaram das discussões sugeriu ao Post que Trump poderia buscar opção similar agora. Em contrapartida, outra fonte acredita ser extremamente improvável que a rede social seja vendida. Isso por conta dos riscos políticos e do alto preço da plataforma, estimado pelos analistas em cerca de US$ 50 bilhões (R$ 301,85 bilhões, na conversão direta).

Há quem questione também se a empresa segue sendo um ativo tão atraente como há quatro anos por conta do crescimento da concorrência (neste caso, leia-se, especialmente, Instagram, com os Reels, e o YouTube, com os Shorts).

Outra questão apontada por essas pessoas é o fato de que os poucos compradores e investidores com cacife suficiente para arcar com a compra também podem sofrer processos antitruste e riscos legais.

Donald-Trump atrás de um microfone
Em seu primeiro mandato, Trump queria que plataforma fosse vendida (Imagem: Evan El-Amin/Shutterstock)

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Compra?

Nessa linha, a Bloomberg havia afirmado que Elon Musk poderia ser a solução para os problemas do TikTok, adquirindo-o e integrando-o ao X. Contudo, a plataforma chinesa já respondeu aos boatos, afirmando que não passam de “pura ficção”.

Mas, segundo uma fonte do jornal familiarizada com as ideias da ByteDance, a empresa chinesa rejeitou a proposta de Musk, mas afirmou que a ideia de que o TikTok “poderia fazer parte de uma grande barganha ou de uma grande negociação” entre EUA e China é “legítima“.

Outros pretendentes

Outro nome citado que seria candidato a adquirir a rede social é Kevin O’Leary, empresário canadense conhecido por sua participação no programa de TV “Shark Tank”. No domingo (12), ele publicou uma foto com Trump em Mar-a-Lago.

O’Leary e o ex-proprietário do time de beisebol estadunidense Los Angeles Dodgers, Frank McCourt, alegaram que criaram o que chamam de “People’s Bid” (“Oferta das Pessoas”, em tradução livre), visando assumir o controle do aplicativo sem seu algoritmo de recomendação subjacente, já que a China proibiu sua venda.

Ambos os empresários tentaram falar com Trump por meio de entrevistas na imprensa ao elogiar sua capacidade de negociação, com O’Leary dizendo, ainda, que o futuro presidente pode usar a plataforma como “ferramenta de negociação” para discussões sobre questões comerciais mais amplas com Pequim.

O empresário do “Shark Tank”, contudo, admitiu à Fox News, na segunda-feira (13), que, “no final, o TikTok é o negócio de Trump. Ele não está dando a mais ninguém“.

Questão de segurança

Visando resolver as questões de segurança que seguem preocupando muita gente, aliados de Trump reavivaram a ideia do Projeto Texas, pacote de reforma corporativa de US$ 1,5 bilhão (R$ 9,05 bilhões) oferecido pela empresa chinesa, sem sucesso, ao governo Biden, em troca de se manter ativa nos EUA, informou uma das fontes.

Essa proposta teria dado aos EUA visão e poder de veto sobre contratações e decisões relacionadas ao aplicativo de plataforma social, além de uma medida caso autoridades federais achassem que o TikTok tivesse ultrapassado os limites.

Mas o DOJ recusou a oferta e disse que ela não satisfazia os “sérios riscos à segurança nacional” que o app traz ao país, na visão dos reguladores.

Vários dos principais críticos da China nomeados por Donald Trump para seu gabinete e outras posições no governo têm longa história de classificar o TikTok como ameaça à segurança nacional. No entanto, alguns desses críticos reformularam, recentemente, suas posições para se alinhar à abordagem mais conciliadora do presidente eleito.

Uma dessas figuras é o senador Marco Rubio, escolhido por Trump para ser Secretário de Estado. Rubio apresentou, em 2022, legislação para banir o aplicativo, que descreveu como “fantoche do Partido Comunista Chinês” e o acusou de “coletar dados de dezenas de milhões de crianças e adultos estadunidenses diariamente“. Questionado na semana passada sobre os esforços de Trump para salvar o TikTok, Rubio respondeu: “Se eu for confirmado… trabalharei para o presidente.”

Os aliados de Trump favoráveis à plataforma de mídia social buscaram enquadrar a questão de forma que ele pudesse capitalizar politicamente. Argumentam que ele poderia minar o legado regulatório de Joe Biden enquanto assumiria o crédito por impedir proibição cada vez mais impopular.

Uma pesquisa do Pew Research Center mostrou que o apoio à proibição do TikTok caiu de 50% em 2023 para 32% em 2024.

Kellyanne Conway, ex-assessora da Casa Branca de Trump, agora defensora da rede chinesa, afirmou ao Post, em novembro, que “Trump reconheceu, desde o início, que os democratas são o partido das proibições… e deixou que eles ocupassem esse espaço draconiano e anti-escolha pessoal.”

Fachada da ByteDance
ByteDance negou que seu aplicativo seria vendido a Elon Musk (Imagem: Tang Yan Song/Shutterstock)

Resposta da ByteDance e clima interno

Enquanto isso, a ByteDance afirmou que o aplicativo não está à venda. Funcionários descartaram a ideia como especulações. Dentro da sede do TikTok nos EUA, em Culver City, Califórnia, a incerteza sobre o futuro tem causado desmoralização entre os empregados.

Poucas informações concretas foram compartilhadas pelos executivos, além de que estão “planejando vários cenários“. Um e-mail interno obtido pelo periódico informou que os escritórios continuarão abertos “mesmo que a situação não seja resolvida”.

Um funcionário, falando sob anonimato, revelou que muitos colegas esperam continuar trabalhando mesmo se o aplicativo for retirado das lojas, embora ainda exista grande incerteza.

Após a tentativa de Trump, em 2020, de forçar a venda da plataforma, a China adicionou o algoritmo central do aplicativo à sua lista de controle de exportação, efetivamente bloqueando qualquer negociação envolvendo o recurso técnico essencial.

Observadores acreditam que o TikTok pode ser usado como moeda de troca em negociações entre EUA e China, relacionadas a questões, como tarifas e comércio internacional.

Pequim, engajada em competição tecnológica com Washington, tem “pouco incentivo” para permitir a transferência do algoritmo para os EUA, a menos que altos funcionários de ambos os lados alcancem acordo mais amplo como parte de uma distensão bilateral, afirmou Dong Yizhi, advogado de finanças e conformidade do escritório Shanghai Joint-Win.

“Se altos funcionários da China puderem iniciar negociações após a posse de Trump, talvez haja uma chance”, acrescentou Dong. “Mas isso é um grande ‘se’.”

Até o momento, os responsáveis pela transição de Trump não responderam aos pedidos de comentários do Post. O desenrolar dessas questões pode ter impactos significativos tanto para as relações internacionais, quanto para o mercado de tecnologia.

Rodrigo Mozelli é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) e, atualmente, é redator do Olhar Digital.