Uma técnica inovadora baseada em laser revelou detalhes intrincados de tatuagens em múmias de séculos atrás, pertencentes à cultura Chancay, no Peru. O estudo, publicado na segunda-feira (13) na Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), oferece nova perspectiva sobre práticas culturais antigas.
Descoberta das tatuagens das múmias
- Os pesquisadores analisaram mais de 100 múmias da cultura Chancay, que prosperou no Peru entre 900 d.C. e 1533 d.C.;
- Dentre elas, apenas três apresentaram tatuagens altamente detalhadas, com linhas finas de 0,1 mm a 0,2 mm de espessura;
- A técnica utilizada, chamada de fluorescência estimulada por laser (LSF, na sigla em inglês), baseia-se na fluorescência da amostra analisada, destacando detalhes que métodos tradicionais, como luz ultravioleta (UV), não conseguem revelar;
- O LSF faz com que a pele tatuada brilhe em branco, destacando a tinta preta à base de carbono, o que elimina quase completamente os problemas causados pelo desbotamento ou borramento das tatuagens ao longo do tempo;
- Os padrões revelados pelas tatuagens incluem principalmente formas geométricas, como triângulos, que também são encontrados em outros artefatos Chancay, como cerâmicas e tecidos. Além disso, foram identificados desenhos de vinhas e representações de animais.
“Esses detalhes só puderam ser observados com nossa nova técnica”, explicou Michael Pittman, paleobiólogo da Universidade Chinesa de Hong Kong e coautor do estudo, em entrevista ao Live Science;

Cultura Chancay
A cultura Chancay, conhecida por sua cerâmica preta e branca e tecidos detalhados, desenvolveu-se ao longo da costa central do Peru há cerca de um milênio. Segundo Kasia Szremski, arqueóloga da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, os Chancay desempenharam papel estratégico durante os conflitos entre os impérios Chimu e Inca, aguardando o desfecho das disputas para se alinhar ao vencedor.
Embora pouco se saiba sobre a organização social dos Chancay, o estudo das tatuagens pode oferecer novas pistas. “Em muitas sociedades, as tatuagens são usadas para marcar pessoas de status especial”, comentou Szremski. “Entender melhor como eram as tatuagens Chancay pode nos ajudar a identificar padrões que indiquem classes ou status sociais.”
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Controvérsias sobre a novidade que revela tatuagens de múmias
Apesar do entusiasmo em torno da fluorescência estimulada por laser, a técnica não foi unanimemente aceita. Aaron Deter-Wolf, especialista em tatuagens antigas do Departamento de Arqueologia do Tennessee, questionou a utilidade do LSF.
Ele apontou que o estudo não incluiu detalhes importantes sobre a técnica e não explicou por que ela seria superior a métodos já estabelecidos, como imagens infravermelhas de alta resolução, ou técnicas multiespectrais.
Além disso, Deter-Wolf criticou a conclusão dos autores de que duas das tatuagens analisadas foram feitas pelo método de perfuração manual, no qual cada ponto de tinta é inserido individualmente. Segundo ele, as tatuagens foram criadas por meio de incisões paralelas curtas na pele, com pigmentos aplicados sobre a superfície.
O arqueólogo classificou os supostos erros como “decepcionantes” e afirmou que o estudo não contribui significativamente para a compreensão das práticas culturais andinas antigas.
Valor das novas técnicas
Apesar das críticas, Szremski destacou o potencial do LSF para reavaliar coleções de museus com novas abordagens. Embora o estudo não tenha especificado quais múmias do Museu Arqueológico Arturo Ruiz Estrada, no Peru, foram analisadas, Szremski elogiou o uso da tecnologia para ampliar a compreensão de artefatos históricos.

“Embora ainda não saibamos o significado dessas tatuagens, sua natureza intrincada mostra que os Chancay tinham artistas especializados em tatuagem“, afirmou. “Não era algo que qualquer pessoa poderia fazer.”
Os autores do estudo sugerem que a técnica de LSF pode ser aplicada no futuro para explorar outros marcos no desenvolvimento artístico humano, incluindo a evolução dos métodos de tatuagem. “Essa técnica tem o potencial de revelar descobertas semelhantes sobre o desenvolvimento artístico humano por meio do estudo de outras tatuagens antigas”, concluíram Pittman e sua equipe.