Novo método transforma esgoto em proteína e hidrogênio verde

Com três passos que utilizam de componentes mecânicos até bactérias, esse novo processo converte o lodo de esgoto em materiais uteis de forma sustentável.
Samuel Amaral25/03/2025 08h12
Estação de tratamento de esgoto ao lado de rio
(Imagem: izzet cakalli / Shutterstock)
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Pesquisadores desenvolveram um método para processar e transformar o lodo de esgoto em energia renovável e proteína para animais. A tecnologia utiliza partes mecânicas, eletrólise e bactérias para decompor os restos lamacentos que poluem o planeta.

A ONU-Habitat, um dos programas da Organização das Nações Unidas (ONU), estimou que mais de 100 milhões de toneladas de lodo seco se acumulam no mundo todo a cada ano. Esse composto obstrui sistemas de tratamento e seu processamento custa bilhões.

Em sua composição, há matéria orgânica, nutrientes como nitrogênio e fósforo e uma mistura de metais pesados. O conjunto é espesso, demora para se de compor, queimá-lo pode liberar gases tóxicos e fazer sua decomposição leva meses. Além disso, o risco de contaminação é alto, o que dificulta sua manipulação e uso.

Depósito de lodo de esgoto semissólido.
Depósito de lodo de esgoto. (Imagem: Rose Duda / Shutterstock)

A ONU estima que cerca de 2,5 bilhões de pessoas viverão em cidades até 2050. Com o crescimento das metrópoles e das indústrias, o esgoto também aumentará.

“A geração cada vez maior de lodo de esgoto em megacidades coloca um fardo substancial nos sistemas de tratamento de resíduos. A estrutura complexa e resiliente do lodo torna os métodos convencionais de pré-tratamento e recuperação biológica demorados, ineficientes em termos de energia e ambientalmente onerosos”, escreveram os pesquisadores.

Esgoto pode ser útil

Em busca de solução, cientistas da Universidade Tecnológica de Nanyang, em Singapura, desenvolveram um sistema que transforma o lodo de esgoto em dois recursos valiosos: proteína unicelular, que serve como ração animal, e hidrogênio verde. O estudo está na revista Nature Water.

O método tem três estágios:

  • Primeiro, os técnicos responsáveis colocam o lodo em um moedor mecânico com um pouco de catalisador alcalino. A máquina tritura a substância no nível molecular, facilitando a extração de componentes úteis, ao mesmo tempo que retém os metais pesados para descarte seguro.
  • O material dissolvido passa por um processo de eletrólise alimentada por energia solar. No anodo, a matéria orgânica é oxidada para produzir ácidos graxos, principalmente o acético. No catodo, as moléculas de água se quebram, formando hidrogênio verde.
  • No fim, o ácido acético e outros componentes servem de alimentos para micróbios. Essas bactérias transformam o composto em proteína, que cuidadores podem usar para nutrir animais.

“Esperamos que nosso método proposto mostre a viabilidade de gerenciar resíduos de forma sustentável e mudar como o lodo de esgoto é percebido — de resíduo para um recurso valioso que apoia energia limpa e produção sustentável de alimentos”, disse o doutor Zhao Hu, um dos autores da pesquisa, em comunicado.

Pesquisadores da Universidade Tecnológica de Nanyang que participaram do projeto. Na foto: Professor Li Hong, Prof. Zhou Yan e Dr Zhao Hu.
Pesquisadores da Universidade Tecnológica de Nanyang que participaram do projeto. Na foto: Professor Li Hong, Prof. Zhou Yan e Dr Zhao Hu. (Imagem: NTU Singapore)

Resultados surpreenderam os cientistas

Mais de 91% do carbono orgânico no lodo foi recuperado e convertido em produtos úteis, sendo 63% dele transformado em proteína unicelular. As emissões de CO₂ se apresentaram 99,5% menores em relação a outras técnicas de decomposição do material lamacento vindo de esgotos.

A etapa alimentada por energia solar atingiu uma eficiência energética de 10%, gerando até 13 litros de hidrogênio por hora. Isso é cerca de 10% mais eficiente em termos de energia do que os métodos convencionais de geração de hidrogênio verde.

Proteína unicelular que serve de alimento para animais
Proteína unicelular resultante do processo serve de alimento para animais. (Imagem: NTU Singapore)

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“Nosso processo movido a energia solar demonstra como podemos enfrentar vários desafios de uma vez – transformando um resíduo difícil em energia limpa e proteína nutritiva”, comentou o professor Zhou Yan, da Universidade de Nanyang.

O grupo projetou todas as máquinas necessárias para o sistema funcionar em um formato modular e adaptável. Desde a eletrólise até as bactérias, tudo pode ser integrado em sistemas de tratamento já existentes. Segundo o grupo, com mais pesquisas, logo cidades pequenas e grandes poderão aplicar a tecnologia em suas estruturas.

Samuel Amaral
Redator(a)

Samuel Amaral é jornalista em formação pela Universidade de São Paulo (USP) e estagiário de Ciência e Espaço no Olhar Digital.