Bibliotecários recebem pedidos de livros “inventados” pela IA; entenda

Com a popularização dos chatbots, bibliotecários relatam aumento nos pedidos por obras inexistentes, fruto das chamadas “alucinações” da inteligência artificial
Por Thiago Morais, editado por Bruno Capozzi 19/09/2025 06h30
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Imagem: Jure Divich/Shutterstock
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Bibliotecários nos Estados Unidos têm vivido um desafio inusitado: lidar com pedidos de leitores em busca de livros que simplesmente não existem, como relata o veículo 404 Media. Esses títulos fictícios são resultado das chamadas “alucinações” da inteligência artificial, quando sistemas como o ChatGPT, Gemini, Claude, Deepseek e Copilot inventam informações de forma convincente, mas sem base na realidade.

Eddie Kristan, bibliotecário de referência em uma instituição norte-americana, contou ao 404 Media que desde o lançamento de modelos avançados de IA, em 2022, os pedidos por obras inexistentes têm aumentado. A situação ganhou força recentemente, após a publicação de listas de leitura de verão em jornais como Chicago Sun-Times e The Philadelphia Inquirer, que incluíam recomendações criadas por IA sem verificação humana.

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Muitos usuários chegam às bibliotecas convencidos de que um título sugerido por um chatbot é real, e se frustram ao não encontrá-lo no catálogo. Imagem: PeopleImages.com – Yuri A/Shutterstock

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O fenômeno não se restringe a listas de jornais. Muitos usuários chegam às bibliotecas convencidos de que um título sugerido por um chatbot é real, e se frustram ao não encontrá-lo no catálogo. Para os profissionais, isso significa perder tempo em buscas complexas até descobrir que o livro nunca existiu.

Especialistas afirmam que a inteligência artificial está mudando a relação entre público e bibliotecas. Alison Macrina, diretora do Library Freedom Project, revelou ao 404 Media que usuários tendem a confiar mais nos resultados oferecidos por seus aplicativos de IA favoritos do que na orientação de bibliotecários humanos. Isso tem gerado confusão e até um enfraquecimento do pensamento crítico.

Para lidar com os pedidos, Kristan desenvolveu um protocolo: primeiro, verificar o catálogo local; depois, recorrer ao WorldCat, base global de registros bibliográficos. Se o título não aparece, cresce a suspeita de que se trata de uma “invenção” da inteligência artificial. Em alguns casos, ele consegue rastrear obras publicadas em plataformas de autopublicação digital, mas grande parte dos pedidos termina em decepção para o leitor.

Próprios sistemas das bibliotecas sofrem com a IA

Além da dificuldade em esclarecer essas falhas, bibliotecários também se deparam com outro problema: fornecedores de tecnologia têm implementado recursos de IA nos sistemas de busca de bibliotecas. Algumas ferramentas oferecem resumos automáticos de artigos ou resultados em linguagem natural, mas, segundo especialistas, a precisão deixa a desejar. Muitas vezes, os textos produzidos misturam informações ou criam confusões ainda maiores.

Apesar das limitações, parte da categoria enxerga algum potencial positivo no uso da inteligência artificial em bibliotecas, principalmente no apoio à organização e recuperação de dados. Ainda assim, a implementação apressada de produtos pouco confiáveis preocupa os profissionais, que temem ver o ensino de habilidades de pesquisa — como a construção de boas estratégias de busca — ser substituído por resultados imprecisos.

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Títulos fictícios são resultado das chamadas “alucinações” da inteligência artificial. (Imagem: M-Production/Shutterstock)

No centro da questão está a necessidade de encontrar um equilíbrio: como aproveitar os avanços da IA sem comprometer a qualidade e a confiabilidade da informação. Para bibliotecários, a prioridade deve ser garantir que usuários não apenas tenham acesso rápido a conteúdos, mas que também possam confiar no que leem.

Colaboração para o Olhar Digital

Thiago Morais é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero. Com atuação focada em TV e rádio no início da carreira, já atuou em portais como editor de conteúdo e analista de marketing digital.

Bruno Capozzi é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero e mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP, tendo como foco a pesquisa de redes sociais e tecnologia.