(Imagem: Danilo Oliveira/ImageFX)
O corpo humano foi feito para manter um equilíbrio delicado: a temperatura interna gira em torno de 36,5 °C a 37,5 °C, garantindo que os órgãos funcionem bem. Mas quando esse equilíbrio é quebrado e a temperatura sobe além do limite suportado, entramos em um estado chamado hipertermia.
Diferente da febre, que é uma resposta do organismo a uma infecção, a hipertermia acontece quando o corpo não consegue dissipar calor suficiente. Isso pode ocorrer em situações de calor extremo, esforço físico intenso ou ambientes sem ventilação.
O problema é que o aquecimento excessivo não é apenas desconfortável, ele pode ser perigoso e até fatal se não for tratado rapidamente. Entenda em detalhes o que é a hipertermia, suas causas, sintomas, graus de gravidade e como agir em situações de risco.
Também vamos entender a diferença entre febre e hipertermia e por que atletas, trabalhadores expostos ao sol e até frequentadores de shows estão no grupo de risco.
A hipertermia é definida como o aumento anormal da temperatura corporal devido à incapacidade do organismo de eliminar o excesso de calor. Em condições normais, o corpo regula sua temperatura por meio da transpiração, respiração e circulação sanguínea.
No entanto, quando esses mecanismos falham ou são insuficientes, o calor interno aumenta, levando a sintomas que podem variar de desconforto leve até risco de morte.
Diferente da febre, em que o organismo “decide” elevar a temperatura como parte de um processo inflamatório ou infeccioso, na hipertermia o aumento é forçado pelo ambiente ou por fatores externos. Essa diferença é fundamental, pois na febre o corpo ainda está sob controle, enquanto na hipertermia ocorre um colapso do sistema de regulação térmica.
A hipertermia pode ter várias origens, mas algumas causas são mais frequentes. A exposição prolongada ao calor extremo é uma das principais, já que ambientes muito quentes, sem circulação de ar ou sombra, elevam rapidamente a temperatura corporal, um cenário cada vez mais comum em ondas de calor intensificadas pelas mudanças climáticas.
Outra causa recorrente é o esforço físico intenso, que afeta especialmente atletas, militares, trabalhadores rurais e operários da construção civil. Nesses casos, o exercício prolongado em ambientes quentes gera uma produção interna de calor maior do que a capacidade do corpo de se resfriar.
O uso de roupas inadequadas também contribui para o problema, já que vestimentas pesadas, sintéticas ou que não permitem a transpiração impedem a dissipação natural do calor.
Além disso, condições médicas e o uso de certos medicamentos, como diuréticos e antidepressivos, reduzem a capacidade do organismo de lidar com altas temperaturas. Por fim, ambientes fechados e sem ventilação adequada, como carros ou salas em dias quentes, representam um risco elevado, principalmente para crianças e idosos.
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Nem toda hipertermia se manifesta da mesma forma. Existem diferentes graus de severidade:
São os sinais mais leves. Ocorrem quando há perda de sais minerais devido à transpiração excessiva. A pessoa sente dores musculares, principalmente em pernas, braços e abdômen.
Um estágio intermediário, caracterizado por suor excessivo, fraqueza, tontura, náusea, dor de cabeça e queda de pressão arterial. É um alerta de que o corpo já está sobrecarregado.
O grau mais grave da hipertermia. A temperatura corporal ultrapassa os 40 °C, e o corpo perde a capacidade de suar. O indivíduo pode apresentar confusão mental, convulsões, inconsciência e risco de falência de órgãos. Esse quadro é uma emergência médica.
Identificar os sinais precoces é essencial para evitar complicações. Entre os sintomas mais comuns estão:
Quanto mais cedo esses sintomas forem reconhecidos, maiores são as chances de evitar a progressão para o golpe de calor.
Embora muita gente confunda os dois termos, febre e hipertermia não são a mesma coisa. A febre é um mecanismo de defesa natural do organismo. Quando existe uma infecção seja por vírus, bactérias ou outros agentes o corpo “ajusta” seu termostato interno, localizado no hipotálamo, para elevar a temperatura de forma controlada.
Esse aumento tem função estratégica: dificultar a multiplicação de micro-organismos e estimular o sistema imunológico. Por isso, a febre costuma ter um valor adaptativo e, em grande parte dos casos, não é perigosa por si só.
A hipertermia, por outro lado, acontece quando o corpo perde a capacidade de se resfriar, geralmente devido a fatores externos como calor excessivo, esforço físico intenso ou ambientes abafados. Nesse caso, não há nenhum “ajuste interno”, mas sim uma falha no sistema de regulação térmica. O aumento da temperatura não traz benefícios: ele sobrecarrega órgãos vitais, pode causar desidratação severa, danos neurológicos e até levar à morte.
Outra diferença importante é que a febre responde a medicamentos antitérmicos, como dipirona ou paracetamol, porque está relacionada a substâncias químicas chamadas pirógenos. Já a hipertermia não cede com remédios, a única forma de revertê-la é através de resfriamento físico rápido (compressas frias, ventilação e banhos) e hidratação.
Em resumo, a febre é uma reação controlada e funcional, enquanto a hipertermia é um colapso perigoso, em que o organismo perde a capacidade de manter sua própria temperatura.
Embora qualquer pessoa possa sofrer hipertermia, alguns grupos estão mais vulneráveis:
O tratamento inicial depende da gravidade, mas algumas medidas são universais:
Prevenir é mais eficaz do que tratar. Algumas medidas simples podem salvar vidas:
A hipertermia não é um problema novo. Ao longo das últimas décadas, diversos casos foram relatados:
Durante um treino de futebol em pleno verão, um jovem de 16 anos sofreu um colapso causado por hipertermia. O corpo dele atingiu temperaturas críticas, levando a confusão mental, falência de órgãos e necessidade de tratamento intensivo.
O caso foi relatado pela Mayo Clinic como exemplo extremo dos riscos do golpe de calor em esportes. Apesar da gravidade, o adolescente sobreviveu após receber resfriamento rápido, hidratação agressiva e suporte hospitalar. Esse episódio acendeu o alerta: jovens atletas, muitas vezes vistos como “indestrutíveis”, também estão vulneráveis quando a temperatura do corpo foge do controle.
Em 2021, uma onda de calor histórica atingiu o oeste da América do Norte, elevando os termômetros a mais de 49 °C em algumas regiões. Só na província de British Columbia, no Canadá, mais de 569 mortes foram atribuídas diretamente ao calor extremo, a maioria de idosos em casas sem ventilação adequada.
Muitos desses óbitos tiveram como causa a hipertermia, quando o corpo supera sua capacidade natural de resfriamento. O evento foi descrito como um dos mais mortais da história recente do país, e mostrou de forma trágica como as mudanças climáticas podem transformar o calor em uma ameaça letal.
A americana Juliana Leon morreu em 2021 após ser encontrada inconsciente dentro de um carro sem ar-condicionado, em um dia em que a temperatura ultrapassou os 42 °C no estado de Washington. A causa: hipertermia severa.
O caso se tornou emblemático porque a família entrou na Justiça contra empresas de petróleo e gás, alegando que as mudanças climáticas agravaram a onda de calor que levou à morte da jovem. Além de uma tragédia pessoal, o episódio virou símbolo do debate sobre responsabilidade corporativa e os impactos diretos do aquecimento global na saúde humana.
Com a tendência de aumento das temperaturas globais, especialistas alertam que a hipertermia se tornará um problema de saúde pública cada vez mais frequente. Hospitais, empresas e governos terão de se preparar para lidar com emergências relacionadas ao calor, especialmente em países tropicais como o Brasil.
A hipertermia é mais do que um incômodo: é um risco real à saúde. Saber identificar os sinais, agir rapidamente e adotar medidas de prevenção pode ser a diferença entre um mal-estar temporário e uma emergência médica. Em um mundo cada vez mais quente, entender esse fenômeno e se proteger é essencial para preservar a vida.
Esta post foi modificado pela última vez em 28 de setembro de 2025 11:56