Micróbios de 40 mil anos despertam no gelo do Alasca

Micróbios de 40 mil anos despertam no gelo do Alasca e revelam efeito de verões mais longos
Lucas Soares07/10/2025 11h30
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Ilustração da permafrost no Alasca (Imagem: Olhar Digital)
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Um cheiro pungente de porão mofado e umidade antiga é o primeiro sinal de que se está adentrando um mundo preservado no tempo. É assim que cientistas descrevem a descida ao Centro de Pesquisa do Túnel do Permafrost, no Alasca central. A 106 metros de profundidade, as paredes de gelo não guardam apenas terra congelada, elas são um museu natural, onde restos de bisões e mamutes lanosos estão guardados. Mas o interesse não estava nesses grandes habitantes, mas em seus vizinhos microscópicos, adormecidos por milênios, foram “acordados” por uma equipe de pesquisadores.

Em uma operação recente, cientistas da Universidade do Colorado em Boulder entraram por pelo túnel localizado em Fox, a cerca de 25 quilômetros de Fairbanks, nos Estados Unidos. O objetivo: coletar amostras do Permafrost contendo micróbios que permaneceram em estado de criopreservação por até 40.000 anos.

A equipe visitou um túnel escavado no solo congelado, onde camadas de gelo e sedimento preservam vestígios da Idade do Gelo. Ao descer pelo corredor de 106 metros, além de ossos de mamutes e bisões incrustados nas paredes, um cheiro forte entregava sinais de atividade microbiana.

“Cheiro muito ruim” indica microbios

“A primeira coisa que você nota ao entrar lá é que o cheiro é muito ruim. O cheiro é de um porão mofado que ficou parado por muito tempo”, descreveu Tristan Caro, autor principal e doutorando em ciências geológicas na CU Boulder. “Para um microbiologista, isso é muito empolgante, porque cheiros interessantes costumam ser microbianos.”

Imagem: Wirestock Creators/Shutterstock

De volta ao laboratório, os cientistas aqueceram gradualmente essas amostras, mantendo as temperaturas entre 4 e 12°C. Essa metodologia foi pensada para espelhar as condições de um verão no Alasca, que, com as mudanças climáticas, está se estendendo para camadas mais profundas do permafrost.

“Queríamos simular o que acontece no verão do Alasca, sob condições climáticas futuras, onde essas temperaturas atingem áreas mais profundas do permafrost”, explicou Caro, detalhando a relevância prática do experimento, ao IFL Science.

Micróbios do Alasca são perigo iminente?

Nos primeiros meses, quase nada se mexeu: o crescimento foi tão lento que mal se percebia avanço. Mas, por volta do sexto mês, o quadro mudou. Algumas comunidades começaram a formar biofilmes brilhantes e pegajosos, visíveis a olho nu — sinal inequívoco de que estavam vivas e em plena atividade. Os resultados indicam que, com calor persistente, micróbios ancestrais podem sair da dormência e retomar ciclos de vida interrompidos por milênios.

Geleiras nas Montanhas Chugach do Alasca (Imagem: Universidade de Zurique/Divulgação)

Felizmente, os pesquisadores foram rápidos em acalmar preocupações mais alarmistas. Eles afirmam que há pouco ou nenhum risco de que esses micróbios específicos representem uma ameaça de infecção para humanos ou animais. O perigo real, no entanto, é mais amplo e indireto.

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O estudo, publicado no Journal of Geophysical Research: Biogeosciences, demonstra de forma prática que a vida microbiana preservada no permafrost desde a Era Glacial pode ser reativada pelo calor. E o lado positivo – o fato de o processo levar meses para acontecer – pode não ser um consolo diante das mudanças climáticas.

“Você pode ter um único dia quente no verão do Alasca, mas o que importa muito mais é o prolongamento da temporada de verão, onde essas temperaturas quentes se estendem até o outono e a primavera”, ponderou Caro. Verões mais longos e intensos significam que o degelo pode atingir camadas cada vez mais profundas e antigas do permafrost, liberando uma multidão de organismos adormecidos.

Lucas Soares
Editor(a)

Lucas Soares é jornalista formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e atualmente é editor de ciência e espaço do Olhar Digital.