Uma mudança fundamental e alarmante está em curso sob as águas geladas da Antártida. Dezenas de vazamentos de metano, um potente gás de efeito estufa, estão surgindo em um ritmo “impressionante” no leito marinho do continente, gerando temores de que isso possa desencadear um ciclo vicioso de aquecimento global.
A descrição é da Dra. Sarah Seabrook, cientista marinha da Earth Sciences New Zealand, que lidera a pesquisa sobre o fenômeno. De acordo com ela, essas infiltrações – áreas onde o metano escapa de reservatórios subterrâneos e se dissolve na água, muitas vezes em fluxos visíveis de bolhas – são recentes e indicam uma transformação perigosa na liberação regional do gás.
“O primeiro foi descoberto por acaso em 2012 e, desde então, eles têm surgido em um ritmo impressionante. Um fenômeno semelhante também foi observado no Ártico”, relatou a Dra. Seabrook. Sua mais recente pesquisa, publicada este mês na revista Nature Communications, documenta o aparecimento dessas dezenas de vazamentos no sensível ambiente costeiro antártico.
A descoberta de cada novo vazamento é inicialmente recebida com empolgação científica, mas esse sentimento rapidamente se transforma em apreensão. “Essa empolgação é rapidamente substituída por ansiedade e preocupação sobre o que tudo isso significa”, confessa a pesquisadora.

Metano é perigoso para o meio ambiente
O temor está no potencial de uma liberação maciça e rápida de metano para a atmosfera, proveniente de uma fonte que os modelos climáticos atuais simplesmente ignoram. “Se eles seguirem o comportamento de outros sistemas de infiltração globais, existe o potencial de uma rápida transferência de metano para a atmosfera a partir de uma fonte que atualmente não é considerada em cenários futuros de mudanças climáticas”, alerta.
A investigação da equipe neozelandesa é desafiadora. Utilizando veículos operados remotamente e mergulhadores que se arriscam sob a espessa camada de gelo, os cientistas coletam amostras em profundidades que variam de cinco a 240 metros. Foi em uma dessas expedições, no Cabo Evans, que a escala do fenômeno ficou ainda mais clara.

“Esperávamos encontrar um local específico ainda borbulhando”, explica a Dra. Seabrook. “Em vez disso, encontramos dezenas de outras [infiltrações].” A velocidade da transformação surpreendeu os pesquisadores. “Se essas infiltrações continuarem surgindo nas áreas em que estamos trabalhando, surge a pergunta: como será o ambiente costeiro raso da Antártida daqui a cinco ou dez anos? Este sistema está mudando rapidamente diante dos nossos olhos de um ano para o outro.”
Crise climática é a causa
A crise climática, ironicamente, também dificulta o próprio estudo do problema. A Dra. Seabrook e sua equipe planejam retornar à Antártida nesta temporada para continuar as investigações, mas uma das áreas-chave do ano passado, o Cabo Evans, está atualmente inacessível. O gelo marinho que permitia o acesso simplesmente desapareceu.

A pesquisa, por fim, acaba revelando algo alarmante: o aquecimento global pode estar liberando o metano preso no fundo do mar, o que, por sua vez, aquece ainda mais o planeta, liberando mais metano. A multiplicação dos vazamentos sob o oceano Antártico é um sinal de que esse ciclo de destruição pode já ter começado.