A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) voltou a alertar o governo federal sobre os riscos da concentração de data centers em grandes cidades brasileiras, como São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) e Fortaleza (CE).
O presidente do conselho diretor da autarquia, Carlos Baigorri, afirmou, nesta quinta-feira (16), que a dispersão desses centros de processamento de dados pelo território nacional é essencial para garantir maior segurança ao sistema de dados do país.
“Quando você coloca todos os ovos numa mesma cesta e tem um problema, isso tem uma repercussão muito grande para todo o país”, disse Baigorri à Reuters (e repercutido pelo g1) após participar de um evento na Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O dirigente destacou que a concentração da infraestrutura digital aumenta a vulnerabilidade do sistema. “Se você tiver um apagão, um terremoto ou incidente, todos seriam afetados. É preocupante do ponto da gestão de riscos concentrar a infraestrutura digital em poucos locais”, afirmou.
Segundo ele, a Anatel tem dialogado com o Ministério das Comunicações para buscar estratégias que promovam a diversificação e a desconcentração dos data centers no país. “Falamos com o Ministério das Comunicações sobre como diversificar e desconcentrar para mitigar e reduzir riscos… temos alertado que a concentração dos data centers traz riscos”, completou.
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Em busca da desconcentração dos data centers no Brasil
- Baigorri também defendeu que a desconcentração das instalações de dados pode contribuir para ampliar a conectividade nacional e fortalecer a soberania digital;
- Ele ressaltou que a localização atual dos data centers está ligada à infraestrutura de cabos submarinos, o que acaba concentrando atividades em algumas regiões. “Essas são duas estruturas que andam juntas… mas hoje o que nos preocupa é a concentração em algumas cidades, como Rio, São Paulo e Fortaleza”, disse;
- De acordo com Baigorri, fatores econômicos também influenciam essa concentração. “No Rio e São Paulo, você tem a concentração do poder econômico e isso gera atração [de novos empreendimentos aos mesmos locais]. Em Fortaleza, os 17 cabos submarinos que chegam ao Brasil chegam lá na Praia do Futuro, o que gera concentração também”, afirmou.
Governo já trabalha em nova fase da Política Nacional de Data Centers
Em resposta ao alerta da Anatel, o Ministério das Comunicações (MCom) informou ao Olhar Digital que está atuando ativamente no fortalecimento da infraestrutura digital do país.
Segundo o órgão, está em elaboração a Fase 2 da Política Nacional de Data Centers, voltada ao eixo de conectividade e infraestrutura, cujo principal objetivo é incentivar a dispersão geográfica dos data centers no Brasil.
O MCom destacou que, em 19 de agosto, foi lançada uma Tomada de Subsídios Pública, encerrada em 15 de outubro, para reunir contribuições sobre aspectos técnicos e regulatórios, incluindo a regionalização e a localização geográfica dos empreendimentos. Ao todo, foram registradas 43 contribuições institucionais, e o número total de respostas deve chegar a cerca de 700 a 1.000.
Além disso, o Ministério promoveu, em 9 de outubro, o Workshop Internacional de Cabos Submarinos e Data Centers, reunindo representantes nacionais e estrangeiros para discutir desafios e oportunidades do setor.
“A adequada distribuição dos data centers é considerada estratégica para o MCom, por fortalecer a segurança, a resiliência e a eficiência da economia digital”, informou a pasta, acrescentando que mantém diálogo permanente com órgãos de governo, setor privado e sociedade civil.
Estimulando o setor
O debate sobre a distribuição dos data centers ocorre em meio a medidas do governo federal para estimular o setor. No mês passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou uma medida provisória que cria o Regime Especial de Tributação para Serviços de Data Center (Redata). O programa visa impulsionar o desenvolvimento de segmentos ligados à computação em nuvem e à inteligência artificial (IA).

Segundo o governo, a medida provisória também busca promover a desconcentração regional, oferecendo contrapartidas reduzidas para investimentos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O Projeto de Lei Orçamentário Anual (PLOA) de 2026 reserva R$ 5,2 bilhões para o Redata, que, a partir de 2027, passará a contar também com os benefícios da reforma tributária.
IA não é só tecnologia, é também economia
Para Rodrigo Gava, CTO da VULTUS, podemos ter, em breve “zonas francas” de data centers:
Nos últimos anos, as empresas migraram de datacenters locais para as grandes nuvens das big techs. O termo “cloud” pode soar abstrato, mas, na prática, representa uma enorme operação física: uma logística de servidores concentrados em imensos data centers que sustentam os ambientes virtuais. Com o crescimento da inteligência artificial generativa, a demanda por processamento disparou e, junto dela, a dependência dessa infraestrutura concentrada. Fatores ambientais, geográficos, estratégicos e de inteligência de ameaças agora pressionam essas estruturas a garantir continuidade e resiliência.
O alerta da Anatel vem exatamente nesse ponto. A agência busca antecipar o risco de um possível apagão de dados e incentivar uma melhor distribuição da infraestrutura digital pelo país. Hoje, uma indisponibilidade digital pode impactar diretamente o PIB, o que mostra que o tema deixou de ser apenas técnico e passou a ser econômico. Esse movimento pode até abrir espaço para novas “zonas francas” de data centers, voltadas para alto desempenho e segurança, reforçando a necessidade de planejar melhor onde e como o Brasil sustenta seu ambiente digital.
Rodrigo Gava, CTO da VULTUS