Invenção brasileira pode salvar os jumentos da extinção; entenda

Símbolos culturais do Nordeste, os animais são ameaçados pela demanda por um produto feito a partir do colágeno extraído da pele de jumentos
Alessandro Di Lorenzo20/10/2025 16h05
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Imagem: Sergio Schnitzler/Shutterstock
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O jumento, também conhecido como jegue no Nordeste, é historicamente adaptado ao semiárido e considerado um símbolo cultural da região. No entanto, estes animais correm o risco de desaparecer do Brasil.

A causa é o aumento expressivo na demanda pelo ejiao, um produto da medicina tradicional chinesa feito a partir do colágeno extraído da pele de jumentos, que é cozida e transformada em gelatina. Neste cenário, pesquisadores brasileiros estão desenvolvendo uma alternativa.

Ejiao é um produto da medicina tradicional chinesa feito a partir do colágeno extraído da pele de jumentos (Imagem: LP2 Studio/Shutterstock)

Risco de extinção é real

  • Segundo reportagem da BBC, a demanda pelo colágeno já provocou o risco de extinção dos animais na África, continente de onde são originários.
  • Em 2024, no entanto, uma decisão unânime dos países que compõem a Cúpula da União Africana proibiu o comércio de pele de jumento.
  • Com o fechamento deste importante mercado, a China agora mira no Brasil.
  • Mas isso pode representar uma ameaça para a população de jegues, que já sofreu uma redução de 94% nas últimas décadas.
  • A espécie Equus asinus chegou ao nosso país em 153, em uma expedição liderada pelo administrador colonial português Martim Afonso de Souza para a Capitania de São Vicente.
  • Rapidamente, ela tronou-se predominante no Nordeste.
  • Nos anos 1990, entretanto, os jumentos começaram a ser substituídos por motos, iniciando um processo de desaparecimento dos animais que foi acentuado pela demanda pelo ejiao.
  • Segundo a ONG internacional The Donkey Sanctuary, de 2018 a 2024, pelo menos 248 mil jumentos foram abatidos apenas na Bahia.

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Novo produto evitaria abate de jumentos

Para tentar impedir o desaparecimento dos animais, pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) estão desenvolvendo um colágeno feito em laboratório a partir da fermentação de precisão. Trata-se de uma técnica avançada de biotecnologia para o cultivo de células e produção de tecidos, também conhecida como agricultura celular. O objetivo é oferecer uma alternativa rastreável, segura e sustentável ao mercado chinês, mas principalmente tornar desnecessário o sofrimento e abate dos jumentos.

A grande inovação está na forma de produzirmos o colágeno idêntico ao do jumento, que é codificado pelo DNA do animal e que é então a mesma proteína, mas de uma forma desacoplada da matança do animal que é hoje a única forma de obtenção desse colágeno.

Carla Molento, pesquisadora do Laboratório de Zootecnia Celular da UFPR
Pesquisador olhando substância no microscópio
Cientistas brasileiros estão desenvolvendo um colágeno artificial (Imagem: shisu_ka/Shutterstock)

A metodologia de produção de colágeno não é nova, mas nunca havia sido estudada nestes animais. O processo insere o DNA em microorganismos geneticamente programados. Quando eles se multiplicam, produzem também o colágeno do jumento.

Enquanto na produção atual eles precisam pegar uma pele inteira para extrair só o colágeno, na produção por fermentação de precisão, vamos pegar toda aquela biomassa que é produzida dentro do biorreator e purificar só o colágeno. A partir daí temos o colágeno do jumento e podemos atender essa demanda crescente. Continuaremos tendo um produto para exportação, mas sem dizimar nossos animais, sem causar crueldade contra eles e também com uma pegada ambiental muito menor.

Carla Molento, pesquisadora do Laboratório de Zootecnia Celular da UFPR
Ideia é reduzir o abate dos jumentos (Imagem: vagabond54/Shutterstock)

Apesar da urgência, o desenvolvimento do produto pode levar anos. Os pesquisadores afirmam que receberam cerca de R$ 500 mil para o projeto, valor considerado insuficiente para acelerar os processos. A equipe ainda destaca que será necessário fazer mais para salvar a espécie. Além da suspensão do abate, um censo fidedigno da população de jumentos é considerada fundamental para a criação de políticas de proteção destes animais.

Alessandro Di Lorenzo
Colaboração para o Olhar Digital

Alessandro Di Lorenzo é formado em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e atua na área desde 2014. Trabalhou nas redações da BandNews FM em Porto Alegre e em São Paulo.