Halloween: Cinco histórias aterrorizantes da exploração espacial

O espaço é o ambiente mais hostil que a humanidade já ousou desafiar — lindo, silencioso... e mortal
Por Marcelo Zurita, editado por Lucas Soares 31/10/2025 16h31
download-1-3-1920x917.png
Compartilhe esta matéria
Ícone Whatsapp Ícone Whatsapp Ícone X (Tweeter) Ícone Facebook Ícone Linkedin Ícone Telegram Ícone Email

Nossos ancestrais distantes viviam em árvores, mas um dia, enfrentaram seus medos e desceram para caminhar sobre a Terra. Mais tarde, enfrentamos oceanos em grandes navegações e, séculos depois, conquistamos os céus com nossos aviões. Mas nenhuma dessas aventuras se compara ao desafio de deixar o planeta. O espaço é o ambiente mais hostil que a humanidade já ousou desafiar — lindo, silencioso… e mortal. Lá fora, qualquer erro, por menor que seja, pode ser o último.

Cada missão espacial exige do astronauta uma alma disposta a encarar o desconhecido com frieza e acima de tudo com a coragem e a loucura de quem sabe que, no espaço, o perigo não é apenas uma possibilidade, mas uma certeza. Por isso, neste Halloween, vamos deixar os fantasmas e vampiros descansarem um pouco e relembrar histórias da exploração espacial tão aterrorizantes que fariam o Conde Drácula roer suas unhas. Histórias assustadoramente reais, mas que, felizmente, terminaram bem.

1. O Primeiro Voo de Yuri Gagarin (1961)

Em abril de 1961, o mundo inteiro ficou perplexo ao ouvir a voz de Yuri Gagarin vinda do espaço: “A Terra é azul!”. Mas a primeira aventura humana fora da Terra por muito pouco não se tornou uma tragédia. Os riscos eram tão elevados que o governo soviético preparou, previamente, três diferentes comunicados à imprensa: um em caso de sucesso e dois caso a missão fracassasse. 

Quase tudo correu bem na primeira metade do voo da Vostok 1. Apenas uma falha em um dos foguetes, que levou a espaçonave a uma órbita 100 km mais elevada do que o planejado. Caso a manobra de retorno falhasse, essa altitude poderia manter Gagarin meses no espaço sem suprimentos suficientes. Mas quando chegou a hora de voltar, aí é que as coisas deram terrivelmente erradas. O desligamento dos retrofoguetes atrasou e a cápsula de retorno não conseguiu se separar do módulo de serviço. A nave começou a vibrar e girar violentamente, sacudindo Gagarin como se ele estivesse dentro de uma lavadora de roupas.

Por sorte, o módulo de serviço se desprendeu sem danificar a cápsula, e o primeiro homem no espaço pôde se ejetar a 7 km do solo — quase em segurança. Quando seu paraquedas abriu, um outro, de reserva, também abriu parcialmente, ameaçando transformar nosso herói numa panqueca, caso os dois se enroscassem. 

[ Módulo de descida da Vostok-1, queimada pela reentrada, chegou próximo ao local de pouso de Gagarin. Créditos: Federação Russa ]

Felizmente tudo terminou bem e, mesmo depois de momentos aterrorizantes, Yuri Gagarin fez história ao pousar suavemente em solo russo. 

2. Gemini 8: A rotação da morte (1966)

Cinco anos depois, foi a vez dos americanos Neil Armstrong e David Scott experimentarem a centrifugação em modo turbo. Eles estavam prestes a realizar o primeiro acoplamento entre duas naves no espaço: a Gemini 8 e o módulo Agena. A missão correu perfeitamente bem, até que acoplaram. Juntas, as duas naves começaram a girar lentamente… e depois cada vez mais rápido. Acreditando que o problema estava na Agena, eles decidiram desacoplar, mas foi pior. Um dos propulsores da Gemini havia travado, e ao se separarem, a inércia diminuiu e a rotação acelerou, chegando a uma volta por segundo.

[ Módulo Agena visto a partir da Gemini 8, pouco antes do acoplamento que deu início ao terror em órbita – Créditos: NASA ]

A força centrífuga impedia o sangue de circular no cérebro e um desmaio ali seria “game over” para os astronautas. Mas no momento mais tenso, Armstrong, frio como um vampiro, usou o sistema de controle de reentrada para estabilizar a nave e salvar suas vidas. A missão foi abortada, mas os dois voltaram em segurança — e a calma que os salvou naquele momento de terror, seria a mesma que, três anos depois, ajudaria Neil Armstrong a pousar na Lua.

3. Soyuz T-13: O resgate da Salyut 7 (1985)

Em junho de 1985 a estação espacial soviética Salyut 7 sofreu uma pane total em órbita. Sem energia, sem comunicação e sem ninguém à bordo para corrigir o problema. Era um zumbi metálico vagando pelo espaço. Temendo  que ela fosse capturada pelos Estados Unidos, os soviéticos enviaram dois cosmonautas, Vladimir Dzhanibekov e Viktor Savinykh, para tentar um resgate. Quando se aproximaram, viram a estação girando descontroladamente. Acoplar com a Salyut nesse estado seria como entrar num carro em movimento — enquanto ele capota. Ainda assim, Dzhanibekov conseguiu sincronizar a Soyuz com a rotação da estação espacial e realizar um acoplamento manual perfeito.

[ Soyuz T13 se aproximando da estação espacial Salyut 7 em rotação descontrolada – Créditos: Reprodução STV Film Company ]

Ninguém nunca havia tentado uma manobra como aquela, porque era algo tão arriscado, que um movimento errado poderia significar um fim trágico para a missão. Depois de acoplar e estabilizar a estação espacial, os cosmonautas entraram na Salyut e encontraram temperaturas negativas, escuridão total e ar quase irrespirável. Uma casa mal-assombrada em órbita, onde eles trabalharam por meses para devolver a Salyut 7 de volta à vida.

4. Apollo 11: O passo que quase não aconteceu (1969)

Todo mundo lembra da frase: “Um pequeno passo para o homem, um grande salto para a humanidade”, mas pouca gente sabe do risco que essa frase correu de nunca ser dita.

[ Módulo Lunar Eagle pouco depois de se separar do módulo de controle e iniciar a descida até o pouso histórico na Lua – Créditos: NASA ]

Em julho de 1969, enquanto Neil Armstrong e Buzz Aldrin se aproximavam da superfície da Lua, o computador do módulo lunar Eagle começou a apitar loucamente: alarmes indicavam erros de sobrecarga, e o piloto automático levava o módulo para um arriscado pouso numa cratera. Armstrong assumiu o controle manual, desviou dos rochedos e procurou um local plano, consumindo quase toda reserva de combustível da nave.

Quando finalmente a Águia pousou, restavam apenas 17 segundos de combustível.

Por pouco, o “pequeno passo” não virou um grande tombo — mas a calma de Armstrong transformou o terror daqueles momentos em história.

5. Apollo 13: O inferno a 380 mil km de casa (1970)

Mas sem sombra de dúvida, a história mais aterrorizante da exploração espacial ocorreu em 1970. A Apollo 13, terceira missão tripulada enviada para a Lua corria bem — até que um tanque de oxigênio explodiu. As luzes se apagaram e os sistemas morreram. Pelo rádio os astronautas enviaram uma frase que arrepiou os controladores da missão e entrou para a história: “Houston, we’ve had a problem.”

A tripulação ficou sem energia, sem aquecimento e com o oxigênio acabando. O frio congelava os trajes; o ar tornava-se tóxico. Usaram o módulo lunar como bote salva-vidas, improvisaram filtros de ar com fita adesiva, calcularam manualmente o curso e deram a volta na Lua — só para ganhar impulso e retornar para casa.

[ Danos no módulo de serviço da Apollo 13 fotografados após a separação, pouco antes do do retorno à Terra – Créditos: NASA ]

Foram quatro dias desafiando a morte no limiar do impossível. E contra todas as probabilidades, voltaram vivos, fazendo da Apollo 13 “o fracasso mais bem-sucedido da história da exploração espacial”.

O custo e a coragem de desafiar o vazio

Essas histórias tiveram finais felizes, mas nem todas tiveram o mesmo destino. As tragédias da Apollo 1ChallengerColumbia e Soyuz 1 nos lembram o quão frágil é a vida humana além da atmosfera que nos protege, e que cada passo rumo ao espaço tem um custo elevado, muitas vezes, pago com vidas. Mas, assim como ocorreu em cada momento em que a humanidade decidiu ir mais longe, essas vidas foram honradas com a persistência e com as conquistas alcançadas com a exploração espacial. 

Explorar o espaço é, antes de tudo, enfrentar o desconhecido. Então se o Halloween é justamente o dia de encararmos nossos medos, vamos celebrar esses heróis que, diante dos maiores desafios da história, enfrentaram seus fantasmas e ajudaram a levar a humanidade aonde ninguém sonhava chegar.

Marcelo Zurita
Colunista

Pres. Associação Paraibana de Astronomia; membro da Sociedade Astronômica Brasileira; diretor técnico da Rede Brasileira de Observação de Meteoros – e coordenador regional do Asteroid Day Brasil

Lucas Soares
Editor(a)

Lucas Soares é jornalista formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e atualmente é editor de ciência e espaço do Olhar Digital.