Luas geladas podem esconder oceanos ferventes capazes de sustentar vida

A esperança é de que esses oceanos ocultos nas luas geladas sejam locais promissores no Sistema Solar para procurar vida extraterrestre
Flavia Correia26/11/2025 15h36
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Encélado, de Saturno, é uma das luas do Sistema Solar que podem abrigar um oceano fervendo abaixo da crosta congelada. Crédito: Imagem gerada por IA/Gemini
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Um artigo publicado nesta segunda-feira (24) na revista Nature Astronomy sugere que pequenas luas geladas do Sistema Solar podem esconder oceanos que chegam a ferver sob suas superfícies. A descoberta reforça o interesse científico por esses mundos remotos, vistos como possíveis candidatos na busca por vida extraterrestre devido à presença de água líquida.

Estudos anteriores já haviam proposto que algumas luas, como Encélado, de Saturno, não são blocos congelados por completo. Entre o gelo externo e o núcleo rochoso, elas podem guardar enormes reservatórios de água. E, como a presença de água costuma ser um dos principais indicadores de ambientes favoráveis à vida, esses oceanos escondidos se tornaram alvos promissores para futuras explorações científicas.

Estudo inédito sugere que Ariel, uma lua congelada de Urano, pode ter abrigado um oceano com cerca de 170 km de profundidade. Crédito: Kevin M. Gill / Wikimedia Commons

Em resumo:

  • Pesquisadores apontam que luas geladas do Sistema Solar escondem oceanos subterrâneos ferventes;
  • Essas águas profundas atraem o interesse científico pela possibilidade de abrigar vida extraterrestre;
  • Novo estudo investigou como o gelo muda ao longo de eras, analisando o afinamento provocado por interações gravitacionais contínuas;
  • Pressão reduzida pode alcançar ponto triplo e iniciar “ebulição fria”;
  • Essa fervura superficial pode liberar gases que ajudam a moldar a superfície.

Cientistas analisaram o afinamento das camadas de gelo 

Para investigar como os oceanos subterrâneos se comportam, o geofísico Maxwell Rudolph, da Universidade da Califórnia em Davis, EUA, analisou processos que afetam as camadas de gelo ao longo de centenas de milhões de anos. A principal dúvida era se mudanças na espessura desse gelo poderiam abrir fissuras profundas, conectando a superfície ao oceano interno e permitindo jatos de água escaparem para o espaço.

Em trabalhos anteriores, Rudolph e sua equipe estudaram o que acontece quando o gelo dessas luas se torna mais espesso. Como o gelo ocupa mais volume que a água líquida, o congelamento gera pressão interna e pode criar padrões marcantes, como as famosas “listras de tigre” observadas em Encélado.

Encélado, com suas “listras de tigre” forradas de azul falso. Crédito: NASA/ESA/JPL/SSI/Cassini Imaging Team

No novo estudo, os pesquisadores analisaram o processo contrário: o afinamento das camadas de gelo. Isso pode acontecer quando o gelo derrete na base, especialmente por causa das forças gravitacionais que essas luas sofrem ao interagir com outras. Um exemplo é Mimas, outra lua de Saturno, cuja órbita apresenta uma oscilação suspeita, possivelmente causada pela presença de um oceano subterrâneo relativamente jovem.

Segundo a pesquisa, quando o gelo dessas pequenas luas fica mais fino, a pressão sobre o oceano diminui. Em corpos muito pequenos, como Mimas, Encélado ou Miranda (satélite de Urano), essa queda de pressão pode chegar ao chamado “ponto triplo” da água – a condição em que gelo, líquido e vapor podem coexistir. Nesse cenário, a água próxima à superfície pode começar a ferver, mesmo sem atingir altas temperaturas.

Essa “ebulição fria” ocorre quase a zero grau Celsius. De acordo com o explicado por Rudolph o site Space.com, isso não impediria a sobrevivência de possíveis formas de vida, já que a fervura aconteceria apenas em regiões rasas, enquanto o restante do oceano permaneceria estável. Assim, organismos hipotéticos poderiam viver normalmente nas áreas mais profundas e protegidas.

Nas luas maiores, com diâmetro acima de 600 km, o comportamento parece diferente. Em Titânia, de Urano, por exemplo, a queda de pressão seria insuficiente para atingir o ponto triplo. A camada de gelo provavelmente se quebraria antes disso, criando fraturas e deformações. Os pesquisadores sugerem que algumas estruturas da superfície de Titânia podem ter surgido justamente após fases alternadas de afinamento e espessamento do gelo.

A equipe também destaca que a fervura interna pode liberar gases que formam clatratos, estruturas de gelo que aprisionam moléculas. Estudos futuros devem investigar como esses gases se movimentam, como são armazenados e que tipos de marcas podem deixar na superfície dessas luas geladas.

Modelo geofísico de uma lua de gelo sob condições de baixa pressão. O diagrama ilustra a estrutura em camadas (Núcleo Rochoso, Oceano, Gelo Viscoso e Gelo Elástico) de um pequeno mundo oceânico. Este modelo sustenta a hipótese de que, em corpos menores, a diminuição da espessura do gelo (Gelo Viscoso e Gelo Elástico) pode levar à ebulição do oceano subsuperficial, gerando vapor e gases que impulsionam características tectônicas compressivas na superfície da lua. Crédito: Rudolph, ML, Manga, M., Rhoden, AR et al.

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Pesquisadores da Universidade do Arizona, nos EUA, sugerem que luas habitáveis – como Pandora, da franquia Avatar – podem ser detectadas em exoplanetas próximos usando uma técnica chamada astrometria, que mede pequenas oscilações na posição das estrelas. 

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Flavia Correia
Redator(a)

Jornalista formada pela Unitau (Taubaté-SP), com Especialização em Gramática. Já foi assessora parlamentar, agente de licitações e freelancer da revista Veja e do antigo site OiLondres, na Inglaterra.