Memória em vidro promete durar bilhões de anos e armazenar quase 400 TB

Ideia é combinar densidade altíssima, durabilidade estimada em bilhões de anos e retenção de dados sem consumo de energia
Rodrigo Mozelli15/12/2025 20h43
Memória 5D em vidro
Tecnologia pode mudar como armazenamos grandes volumes de dados (Imagem: SPhotonix)
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Um novo marco na tecnologia de armazenamento físico pode estar chegando. Cientistas da Universidade de Southampton (Reino Unido) estão desenvolvendo uma memória em vidro 5D.

A ideia é combinar densidade altíssima, durabilidade estimada em bilhões de anos e retenção de dados sem consumo de energia. A tecnologia é feita de sílica — formada a partir do silício, mineral abundante na Terra e usada em vários setores da indústria — em formato de vidro.

Como funciona a memória 5D

  • Ao invés de estruturas tradicionais, como discos rígidos, fitas magnéticas e SSDs, a memória 5D é integrada ao vidro de sílica fundido;
  • A forma como ela armazena dados também é distinta: minúsculos voxels (ou pixels 3D), cuja gravação é feita por pulsos de laser de femtossegundo;
  • Já o termo 5D é utilizado, pois os voxels possuem tecnologia que os permite ter características de refração da luz em múltiplas direções, de forma que a informação é codificada em cinco dimensões (coordenadas x,y e z);
  • O método de leitura utilizado é um sistema óptico de luz polarizada, que interpreta as alterações realizadas no vidro.

A SPhotonix é uma empresa criada em 2024 justamente para dar vida à tenologia. Ela estima que a memória 5D pode durar 13,8 bilhões de anos (que também é a idade estimada do Universo) e aguentar calor de 190 °C.

Dessa forma, além do calor, o sistema poderia aguentar radiação, campos eletromagnéticos extremos e umidade, contando que o disco no qual as informações são gravadas não sofra danos diretamente.

Quanto ao espaço interno, é um sonho para muitas corporações: 360 TB armazenáveis em um vidro de cinco polegadas. Ou seja, muito maior do que as tecnologias tradicionalmente usadas hoje. O armazenamento é passivo, dispensando energia para manutenção dos dados de forma intacta.

Representação gráfica de um laser gravando
O 5D se dá porque a gravação é realizada por meio de coordenadas x, y e z em cinco dimensões (Imagem: SPhotonix)

Passos para elaborar a tecnologia

Segundo Ilya Kazansky, um dos cofundadores da SPhotonix, a tecnologia está perto de ser aprovada para demonstração de protótipo. “Estamos conversando com muitos dos maiores provedores de hiperescala sobre a possibilidade de liberar alguns de nossos protótipos em seus data centers ao longo dos próximos dois anos“, disse, em entrevista ao The Register.

No mês passado, a empresa, cujas instalações de pesquisa ficam em Delaware (EUA) e na Suíça, anunciou ter recebido aporte de US$ 4,5 milhões (R$ 24,3 milhões, na conversão direta) para manter o desenvolvimento.

Kazansky indicou que o foco de todos é em aplicações de armazenamentos frios, ou seja, dados que podem esperar de dez segundos em diante para serem compartilhados. Isso não funciona, por exemplo, para aplicações que mexem com finanças ou negociação de alta frequência, pois precisam de dados “quentes“, com transmissão de menos de cinco milissegundos, explicou o cofundador.

“As estatísticas mostram que entre 60% e 80% de todos os dados armazenados globalmente são classificados como dados frios”, prosseguiu.

“No entanto, devido à forma como a humanidade está se desenvolvendo, devido a todos os orçamentos, inteligência artificial e assim por diante, muitas empresas historicamente têm pensado: ‘Vamos usar discos rígidos ou SSDs’, que são caros, prejudiciais ao meio ambiente porque consomem muita energia, não são recicláveis ​​e falham com frequência, mas são mais fáceis de usar. Por inércia, as pessoas têm usado o tipo errado de ferramenta para um caso de uso que poderia ser resolvido com uma ferramenta diferente.”

Kazansky e os demais integrantes do projeto acreditam que a memória 5D “é a única maneira pela qual o setor conseguirá ampliar a capacidade de armazenamento de dados, dada a crescente demanda”, pois é ultrarresistente, sustentável e escalável.

Exemplo de memória 5D em tamanho mini
Sistema é baseado em vidro de sílica, material utilizado em vários setores da indústria (Imagem: SPhotonix)

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Próximas etapas e futuro

O executivo informou que a SPhotonix deve melhorar a velocidade de transferência de dados da memória, que, hoje, é de 4 Mbps para gravação e de 30 Mbps para leitura, para um total de leitura/gravação de 500 Mbps. Se chegarem a esse patamar, poderão competir em pé de igualdade com os sistemas de backup em fita para arquivamento.

Dessa forma, poderia ser utilizada em sistemas, como bibliotecas robóticas de arquivamento, sobretudo em sistemas que armazenam grandes volumes de dados históricos — como ciência, governo, saúde e a indústria de mídia e audiovisual.

Por enquanto, a memória 5D da empresa pode ter seus dados recuperados apenas em laboratório, mas, nos próximos 18 meses, a ideia é ter um protótipo de leitura disponível para uso em campo.

O público-alvo, contudo, não é o mercado consumidor (pelo menos atualmente). Hoje, eles pensam no mercado de data centers hiperescaláveis e o B2B, onde aplicações comerciais precisam guardar vastas quantidades de dados por períodos longos.

Kazansky pontuou que “precisamos de mais três ou quatro anos de pesquisa e desenvolvimento para chegar ao ponto de produção e comercialização, mas, agora, temos uma compreensão clara, baseada nas pesquisas e descobertas mais recentes, de como chegar à produção e de como atingir o nível de viabilidade econômica ideal”.

Além disso, Kazansky estima que o custo inicial do dispositivo de leitura será de algo em torno de US$ 6 mil (R$ 32,4 mil) e de US$ 30 mil (R$ 162,4 mil) para o de gravação.

Exemplo de memória 5D
Memória deve ter custo alto, na casa dos milhares de reais (Imagem: SPhotonix)

Em breve, uma contratação importante deverá ser realizada pela SPhotonix. Trata-se de um ex-pesquisador da Microsoft que trabalhou em projeto semelhante na big tech, chamado de Projeto Sílica.

Por fim, o executivo ressaltou ter admiração pelo modelo de Arm e Nvidia, pois “não pretendemos nos tornar uma empresa de manufatura. Somos uma empresa de licenciamento de tecnologia”. “Portanto, estamos desenvolvendo a tecnologia de habilitação e, em seguida, formaremos algum tipo de consórcio, algum grupo de empresas que nos ajudará a levar essa tecnologia ao mercado”, concluiu.

Rodrigo Mozelli é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) e, atualmente, é redator do Olhar Digital.