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Pesquisadores do Beth Israel Deaconess Medical Center (BIDMC), nos Estados Unidos, divulgaram novos resultados que ajudam a explicar por que algumas pessoas não se recuperam totalmente da infecção por SARS-CoV-2 e desenvolvem a chamada covid longa.
O estudo analisou respostas imunológicas e inflamatórias ao longo do tempo e identificou sinais claros de inflamação crônica persistente em pacientes que seguem apresentando sintomas meses ou até anos após a fase aguda da doença.
A pesquisa, publicada na revista Nature Immunology, avaliou amostras de sangue de mais de 140 participantes e comparou indivíduos que desenvolveram covid longa com aqueles que se recuperaram completamente da infecção. Os resultados apontam diferenças consistentes no funcionamento do sistema imunológico entre os dois grupos, sugerindo novos caminhos para o desenvolvimento de tratamentos específicos.

Inflamação persistente após a infecção
De acordo com os pesquisadores, pacientes com covid longa apresentam ativação contínua de vias inflamatórias mesmo muito tempo depois da infecção inicial. Esse padrão não foi observado em pessoas que se recuperaram totalmente da COVID-19. A equipe liderada por Dan H. Barouch, diretor do Center for Virology and Vaccine Research do BIDMC, destaca que, até o momento, não existe um tratamento específico aprovado para a condição.
Dados recentes do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos estimam que cerca de 15 milhões de americanos convivam com a covid longa. Os sintomas relatados incluem fadiga persistente, dificuldade de concentração (conhecida como “névoa cerebral”), falta de ar, intolerância ao exercício e declínio cognitivo, que podem durar meses ou anos. As causas que levam algumas pessoas a desenvolverem a condição, enquanto outras se recuperam completamente, ainda não são totalmente compreendidas.
O estudo sugere que a resposta inflamatória inicial ao vírus pode ter papel decisivo. Pacientes que apresentaram maior inflamação no início da infecção mostraram maior probabilidade de desenvolver sintomas prolongados, indicando que a “guerra” do organismo contra o vírus pode continuar ativa mesmo após o fim da fase aguda.

Como o estudo da covid longa foi conduzido e próximos passos
Para chegar a essas conclusões, os cientistas adotaram uma abordagem conhecida como “multi-ômica”, integrando dados de resposta imune, marcadores virais, expressão gênica e proteínas presentes no plasma. Essa metodologia permitiu traçar um panorama detalhado do sistema imunológico em diferentes cenários.
Os pesquisadores analisaram dois grupos de pacientes: um acompanhado entre 2020 e 2021 e outro entre 2023 e 2024. As amostras de sangue foram coletadas entre três e seis meses após a infecção inicial e novamente após mais de seis meses. A comparação envolveu pessoas com covid longa, indivíduos nunca infectados, pacientes em fase aguda da doença e aqueles que se recuperaram totalmente.
Entre os principais achados do estudo estão:
- sinais de inflamação crônica persistente em pacientes com covid longa;
- evidências de esgotamento do sistema imunológico;
- alterações no metabolismo celular não observadas em pacientes recuperados;
- identificação de proteínas e assinaturas moleculares associadas à condição.

Segundo a equipe, esses marcadores podem servir como alvos terapêuticos para estratégias que busquem reduzir a inflamação crônica e restaurar o funcionamento adequado do sistema imune. Como desdobramento direto da pesquisa, os cientistas iniciaram um ensaio clínico de fase 2a com o medicamento abrocitinibe, um inibidor de JAK1 já aprovado para o tratamento de dermatite atópica. O objetivo é avaliar se o bloqueio de uma das vias inflamatórias identificadas pode trazer benefícios a pacientes com covid longa.
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Os autores ressaltam que a integração entre dados biológicos e aplicações clínicas é essencial para avançar no cuidado aos pacientes. Embora ainda sejam necessários mais estudos, os resultados oferecem uma base científica mais sólida para compreender a covid longa e apontam para novas possibilidades terapêuticas no futuro.