O aplicativo de transporte Uber anunciou nesta quarta-feira (6) um novo recurso de segurança, que permite a gravação do áudio do que acontece dentro do veículo, por parte de motoristas e passageiros. Embora o recurso parta do princípio “quem não deve, não teme”, vários questionamentos surgiram, principalmente sobre a legalidade dessa função.

Segundo a empresa, as gravações não podem ser acessadas nem mesmo pelo autor. Elas são criptografadas e armazenadas no aparelho da pessoa, e apenas a companhia tem a chave para extrair o arquivo, impedindo que ele seja compartilhado por outros aplicativos. Caso ocorra algum incidente, o autor da gravação pode enviá-la para a empresa pelo próprio aplicativo, que poderá analisar e encaminhar para as autoridades.

Se uma gravação for iniciada pelo usuário, o motorista será notificado, mas não poderá evitar que a gravação aconteça. O mesmo acontece no caso contrário. Para alguns, apenas o fato de gravações acontecerem dentro do carro é um incômodo. No entanto, especialistas ouvidos pelo Estadão afirmam que a prática é legal e não viola as regras de privacidade.

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O advogado Renato Opice Blum, especialista em direito digital, diz que a prática tem embasamento no artigo 11 da Lei Geral de Proteção de Dados, prevista para entrar em vigor em agosto de 2020. “A gravação é justificada pela proteção do titular, mas isso exige comunicação do que está sendo feito”, argumenta ele.

Fabro Steibel, diretor executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-Rio), também tem o mesmo entendimento. “Os dois lados estarão cientes de que uma eventual gravação poderá ser feita e usada para ajudar na investigação de incidentes. O objetivo não é a publicação. Se essa gravação for vazada é outra coisa”, diz ele.

Steibel, no entanto, alerta sobre o risco de os usuários passarem a usar o recurso para denunciar crimes, ao invés de procurar as autoridades. Para o especialista, haverá dificuldade para analisar as gravações, considerando que mais de 22 milhões de pessoas utilizam o aplicativo no Brasil

Já o fundador da Data Privacy Brasil, Bruno Bioni, tem dúvidas se esse recurso será efetivo. “O Uber já implementou outros recursos de segurança na plataforma, como botões de ajuda e pânico. Gravar o áudio é realmente necessário?”, questiona Bioni. Em sua visão, existem ainda outros riscos. “Quais são os procedimentos adotados para garantir que esses dados serão usados só para a finalidade descrita pela empresa?”.

Recentemente, descobriu-se que empresas como Twitter e Facebook usaram informações de segurança de seus usuários para redirecionar anúncios a eles, por exemplo.