“Ela tem os olhos do pai”. Uma frase tão comum, mas que ainda representa um grande mistério, pelo menos para os cientistas que tentam entender como genes moldam os traços e feições do rosto humano, já que pouco se sabe sobre o assunto.
No entanto, um passo importante foi dado por um grupo de pesquisadores de vários países, como mostra o estudo publicado recentemente na revista Nature Genetics. Nele, eles identificam mais de 130 regiões cromossômicas associadas a aspectos específicos dos nossos rostos, e como essa descoberta pode impactar a nossa saúde.
Para elaborar a pesquisa, o grupo escaneou mais de 8 mil indivíduos, com o intuito de relacionar cerca de sete milhões de marcadores genéticos a medidas obtidas por imagens 3D de suas faces. Cada vez que um traço característico era estatisticamente ligado a um ou mais marcadores genéticos, uma região do DNA em um cromossomo era observada pelos pesquisadores.
Por esta observação, eles conseguiram traçar um paralelo entre esses genes e características como o formato do nariz ou dos lábios. Mas ao passo que a descoberta representa muito para o entendimento da genética facial, o caminho ainda é longo.
“Ainda estamos arranhando a superfície. Acreditamos que milhares de regiões, e consequentemente milhares de genes, contribuem para a aparência facial. Muitos dos genes nessas regiões cromossômicas têm efeitos tão pequenos que talvez nunca tenhamos poder estatístico para detectá-los”, diz o estudo.
Padrões encontrados
Durante a realização da pesquisa, vários padrões encontrados chamaram a atenção dos cientistas, como o fato de o nariz ser a parte do rosto mais influenciada pelos genes, ou de regiões que sofrem influências externas (como a alimentação) terem pouca associação genética.
Outro aspecto interessante é a correlação entre genes e anomalias, síndromes genéticas e até mesmo câncer. Como alguns desses genes também participam do desenvolvimento do nosso corpo, podem contribuir para condições como a fenda palatina ou labial.
A ligação também pode ajudar a compreender melhor o porquê de algumas doenças serem caracterizadas por malformações no rosto e nas mãos, e o motivo de algumas pessoas que passaram por tratamento contra o câncer na infância apresentarem características faciais semelhantes.
Reconstrução facial
Para tristeza dos fãs de ficção científica, os achados indicam que ainda estamos muito longe de conseguir reconstruir um rosto a partir de uma amostra de DNA.
O primeiro obstáculo é que as regiões cromossômicas identificadas pelo grupo explicam menos de 10% das variações possíveis no nosso rosto. O segundo, e talvez mais importante, é que fatores biológicos e não-biológicos podem alterar significativamente a aparência de uma pessoa. Idade, medicamentos hormonais, doenças e cirurgias plásticas são alguns dos exemplos que podem ser citados.
“Não é nenhuma surpresa que pesquisadores que tentam prever características faciais a partir do DNA tenham falhado. Não estamos dizendo que essas previsões nunca serão possíveis, mas você deve ficar altamente desconfiado se alguém te disser que pode fazer isso hoje”, explicam os cientistas.
Genética a favor da saúde
Se o uso de informação genética na criação de um “retrato falado futurístico” ainda parece estar longe de se tornar realidade, há motivos para ficar animado quando o assunto é saúde.
De acordo com os pesquisadores, entender como os genes influenciam no crescimento facial pode ajudar em tratamentos ortodônticos e na cirurgia reconstrutiva.
“Se algum dia pudermos usar a genética para prever quando a mandíbula de uma criança vai atingir seu pico de crescimento, ortodontistas poderão usar essa informação para determinar o melhor momento de realizar uma intervenção”.
Outras metas apontadas são o desenvolvimento de medicamentos específicos para corrigir deficiências no crescimento facial e descobrir as causas de malformações congênitas faciais.
Fonte: Science X