

As campanhas de imunização contra a Covid-19 já começaram em várias partes do mundo, mas as variantes do novo coronavírus podem colocar em xeque a eficácia das vacinas contra as mutações — como as encontradas na África do Sul, no Brasil e no Reino Unido. Isso porque a possibilidade de uma recombinação do vírus pode criar cepas mais resistentes.
Recentemente, o governo sul-africano bloqueou as vacinas da AstraZeneca, após estudos iniciais apontarem que o imunizante apresenta proteção menor contra a variante B.1.351, encontrada no país em casos leves e moderados. Outras fórmulas não ficam de fora: testes com imunizantes da Pfizer, da Moderna, da Novavax e da Janssen apontam que os anticorpos produzidos protegem contra a B.1.351, mas têm potência reduzida.
Em tese, algumas dessas vacinas precisam apenas de pequenos ajustes para que fiquem adequadas às novas mutações. É o caso das fórmulas que usam o RNA mensageiro, que só requerem alteração no código genético da proteína spike. Já as que dependem de células do novo coronavírus demandam o cultivo do microrganismo com o código alterado.
Na teoria, as alterações são simples, mas na prática, não. A AstraZeneca já informou que um possível ajuste de sua vacina levaria um tempo estimado de seis a nove meses. Adequações de outros imunizantes também devem demandar um período extenso. As variantes do novo coronavírus, por sua vez, não têm dado trégua durante esse processo.
Não bastasse o fato de algumas das vacinas já prontas não serem eficazes o bastante contra as variantes do novo coronavírus, existe ainda o temor de uma possível capacidade de recombinação do microrganismo. Isso deve aumentar a preocupação de cientistas — e da população mundial.
Estudos sugerem que o novo coronavírus pode “copiar” e “colar” sua segunda metade com um código ligeiramente diferente. Isso não só permite uma mudança perigosa (e imprevisível) no microrganismo, como torna seu rastreio mais difícil. “Na verdade, é provavelmente um pouco subestimado e pode estar em jogo mesmo no surgimento de algumas das novas variantes”, diz Nels Elde, geneticista da Universidade de Utah, nos EUA.
A recombinação do novo coronavírus também é alertada pelos virologistas Mark Denison, do Vanderbilt University Medical Center, e Stephen Goldstein, da Universidade de Utah, e pelo ecologista viral Vincent Munster, do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas. O medo é de que o processo leve a cepas ainda mais perigosas para o corpo humano. E não é difícil de isso acontecer: basta que uma mutação do microrganismo altere uma “letra” da sequência genética para que o caos se torne ainda pior.
A própria recombinação do novo coronavírus pode ser a solução contra as novas variantes. Estudos de Denison e Sandra Weller, virologista da Escola de Medicina da Universidade de Connecticut, nos EUA, identificaram uma enzima capaz de reduzir a eficácia de antivirais e que pode ser vital para a capacidade do novo coronavírus de se misturar e se recombinar: a nsp14-ExoN.
Os especialistas querem descobrir uma droga que bloqueie a atividade da nsp14-ExoN. Desse modo, medicamentos como remdesivir e outros antivirais podem bloquear o processo de replicação viral e funcionar de maneira mais eficaz contra a mutação. Outra alternativa é atualizar as vacinas contra a Covid-19 constantemente — como já se faz atualmente com o imunizante contra a gripe.
Isso permitiria que novas mutações fossem consideradas nas próximas doses e possibilitaria a renovação periódica da proteção do usuário. O modelo, inclusive, pode ser aprovado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela administração federal de medicamentos (FDA) dos EUA.
O fato é: independentemente da alternativa adotada, cientistas e especialistas correm contra o relógio. Afinal, é preciso evitar um caos global ainda maior envolvendo o novo coronavírus e suas variantes.
Via: O Globo/MedicalXpress