“Pirocumulonimbus”, ou “nuvens cuspidoras de fogo”, destróem pequena vila no Canadá

Nuvens são conhecidas gerar novos pontos de incêndios florestais, dificultando o controle das queimadas: vila de Lytton foi 90% devastada
Por Rafael Arbulu, editado por Rafael Rigues 05/07/2021 11h41, atualizada em 06/07/2021 16h06
Imagem mostra um incêndio florestal, com as árvores exibidas em silhueta à frente das chamas
Imagem: Nico Jacobs/Shutterstock
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O aumento recorde de temperatura causado pelas queimadas em Colúmbia Britânica, no Canadá, está trazendo um outro efeito ainda mais perigoso: nuvens “cuspidoras de fogo”, ou “pirocumulonimbus”, se você preferir o termo técnico.

Segundo as autoridades debruçadas sobre a situação, essas nuvens podem complicar ainda mais um problema já bem difícil de controlar, já que, por causa delas, novos focos de incêndio podem nascer e ampliar o problema das queimadas.

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A temperatura em Lytton, a pouco mais de 150 quilômetros (km) de Vancouver, chegou a incríveis 49,5 graus Celsius (ºC) na última terça-feira (29/6), graças a uma onda de calor que gerou um foco de incêndio na região de planície da vila. O prefeito ordenou a evacuação de 250 residentes. Na quinta-feira (1), a queimada, que já atingia tamanhos de 20 mil acres, havia destruído 90% da região, com moradores dizendo frases como “a nossa vila desapareceu” nas redes sociais.

Segundo Dakota Smith, um meteorologista colaborativo do Instituto de Pesquisa Atmosférica do Colorado, foram vistas “plumas” indicativas da formação de uma nuvem pirocumulonimbus em imagens de satélite.

Mas o que são as “pirocumulonimbus”, afinal?

As nuvens conhecidas como “pirocumulonimbus” são nuvens artificiais originadas de queimadas em regiões florestais ou de planície. Basicamente, elas são mais fáceis de entender se você pensar nelas como “nascidas” do fogo, para trazer mais fogo. Inclusive, seu nome em latim – “cumulonimbus flammagenitus” – pode ser traduzido para “criado pela chama”

Explicando em termos científicos: uma cumulonimbus comum traz consigo tempestades elétricas, sendo formada após o ar úmido e aquecido subir do chão para a atmosfera. Uma vez lá em cima, esse ar esfria e desce de volta à Terra, se reaquecendo e subindo novamente. Esse “sobe-e-desce” é o que gera nuvens que causam tempestades elétricas.

Pirocumulonimbus passam pelo mesmo processo: entretanto, o ar úmido e aquecido vem das chamas e fumaça de um incêndio, e não do chão: se você ver imagens de um incêndio florestal, por exemplo, e identificar nuvens grossas e densas, elas sempre serão pirocumulonimbus.

Embora elas também possam gerar tempestades elétricas como sua “irmã”, um efeito mais comum é uma “rajada” poderosa de ar seco que ela joga em direção ao solo. Quando esse ar seco toca o chão, em meio a um incêndio, o fogo e a fumaça aumentam e se espalham, gerando mais ar quente e umidade e novas nuvens do tipo, que jogarão novas rajadas ao solo – um ciclo vicioso bem quente.

Imagem mostra uma pirocumulonimbus, um tipo de nuvem que causa tempestades elétricas e pode aumentar queimadas florestais
Uma nuvem pirocumulonimbus registrada sobre o céu da Califórnia: uma dessas causou um dos maiores incêndios florestais da história dos EUA em setembro de 2020. Imagem: Thalia Dockery/Business Insider

A vila de Lytton não foi a primeira a enfrentar o problema: em setembro de 2020, os focos de incêndio na Califórnia, EUA, foram causados por uma das maiores nuvens pirocumulonimbus registradas na história do país, com quase 650 quilômetros quadrados (km²) de tamanho.

O caso levou empresas de tecnologia – como Google e SpaceX – a agirem, propondo novas tecnologias de monitoramento a fim de gerar capacidade de prevenção a danos causados por esses episódios.

Outro incidente bastante lembrado é o incêndio de Canberra, na Austrália, em 2003. Neste exemplo, um outro efeito também se fez presente: o ar ao redor de uma pirocumulonimbus começou a girar, de forma a criar uma corrente circular – uma espécie de coluna que, eventualmente, virou um “tornado de fogo”.

Aquecimento global piora os problemas

O aumento da temperatura e do ar seco – dois elementos associados a incêndios florestais e outras ocorrências naturais – podem ser atribuídos ao aquecimento global, segundo cientistas. E como esse volume só vem aumentando, incêndios do tipo (e, consequentemente, a criação de pirocumulonimbus) vêm se tornando mais e mais frequentes.

Em 2002, os três países da América do Norte viram, somados, 17 tempestades do tipo. Quase 20 anos depois, essa média saltou para 25 apenas no oeste dos Estados Unidos, sem contar os outros territórios, segundo análise veiculada pelo Yale360, página ligada à Universidade de Yale.

Estudos indicam que essas tempestades são tão intensas que penetram a estratosfera – que começa a cerca de 50 km acima do solo -, podendo permanecer lá por anos. Uma pesquisa conduzida em 2018 revelou que uma única pirocumulonimbus de grande porte envia tantas partículas à estratosfera que seu efeito se compara ao de uma erupção vulcânica mediana.

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Jornalista formado pela Universidade Paulista, Rafael é especializado em tecnologia, cultura pop, além de cobrir a editoria de Ciências e Espaço no Olhar Digital. Em experiências passadas, começou como repórter e editor de games em diversas publicações do meio, e também já cobriu agenda de cidades, cotidiano e esportes.

Redator(a)

Rafael Rigues é redator(a) no Olhar Digital