Cientistas do Laboratório Nacional Lawrence Livermore, nos EUA, afirmam ter atingido o ponto de “ignição de fusão nuclear” em testes de ambiente controlado, estabelecendo um novo limite energético e recriando temperaturas extremas, encontradas naturalmente apenas em estrelas como o Sol.

Entende-se por “ignição” o ponto energético onde uma fusão nuclear se torna auto suficiente. Em outras palavras, a reação energética não precisa — ou deixa de precisar — de estímulos externos para se manter estável, por produzir mais energia do que o necessário. Esse tipo de fenômeno ocorre rotineiramente em estrelas, mas é algo bem difícil de ser reproduzido em laboratório.

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A ignição de fusão nuclear é ilustrada nessa imagem que mostra um átomo agindo de forma controlada em movimento espiral. A ideia é reproduzir estabilidade de energia
A ignição da fusão nuclear é um dos maiores objetivos dos especialistas em Física e energia, mas processo que só é comum em estrelas como o Sol é muito difícil de ser reproduzido em laboratório. Imagem: Ezume Images/Shutterstock

As implicações disso são inúmeras: primeiramente, a ignição de fusão nuclear nos coloca mais perto de fontes de energia que não são apenas mais limpas, como também têm potencial para serem inesgotáveis.

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De acordo com o professor Jeremy Chittenden, da Faculdade Imperial de Londres (London Imperial College) e ligado ao Lawrence Livermore, “a demonstração da ignição tem sido um dos maiores desafios científicos desde que a ideia foi proposta, há quase 50 anos. Foi ela a principal razão da construção da Instalação Nacional de Ignição [NIF] e é o nosso objetivo primário há mais de uma década”. O NIF é um departamento interno do laboratório norte-americano.

“Os resultados dos experimentos ao longo dos últimos 10 anos têm sido mais espetaculares, já que pequenos aprimoramentos na potência energética da fusão são grandemente aprimorados pelo processo de ignição”, disse Chittenden. “O ritmo de melhoria tem sido rápido, sugerindo que nós poderemos, logo menos, atingir mais e mais recordes de energia, como, por exemplo, superar o limite de energia despendida nos lasers usados para iniciar o processo”.

Finalmente, o professor afirma que “isso é crucial para nos assegurar a promessa da fusão energética e permitir aos físicos recriarem as condições de alguns dos estados mais extremos do universo, como os minutos que vieram logo após Big Bang. A fusão controlada em laboratório é um dos desafios que definem a ciência na era atual, e conquistá-lo significa um passo bem amplo à frente”.

O co-diretor do Centro de Estudos de Fusão na faculdade britânica, professor Steven Rose, disse em resposta: “a equipe do NIF fez um trabalho extraordinário. Esse é o avanço mais significativo em fusão inercial desde o começo dos estudos do campo, em 1972. O que eles atingiram pode alterar completamente o cenário de fusão nuclear e nós podemos enfim prever o uso de plasmas de ignição para descobertas científicas e produção de energia”.

Atualmente, a energia nuclear é movida por um processo de “fissão”, ou seja, átomos são partidos para gerar essa energia. É um método bastante seguro, mas na eventualidade de um acidente, é fácil a situação se tornar catastrófica — lembre-se de Chernobyl (Rússia, 1986), ilha Three Mile (EUA, 1979) e Fukushima (Japão, 2011), por exemplo. Além disso, esse método é finito, ou seja, eventualmente, essa energia acaba, e o processo também pode gerar o chamado lixo radioativo.

A fusão nuclear, porém, funciona de forma diferenciada: ela força a união entre átomos de hidrogênio para gerar uma capacidade energética muitas vezes maior, mais limpa e auto suficiente. Dá para entender o motivo de isso ser algo tão buscado por especialistas, mas até hoje, resultados nessa linha nunca haviam conseguido criar esse processo de forma sustentável — todos os experimentos considerados positivos gastaram mais energia do que o volume produzido.

Com o experimento do NIF, isso não mudou. Entretanto, ele foi o primeiro na história a chegar ao chamado “ponto de ignição de fusão nuclear”. De uma forma extremamente básica, isso significa que os cientistas atingiram um volume de produção energética muito maior do que qualquer outra situação experimentada.

“Ainda que o NIF seja um experimento da Física e não tenha o objetivo de produzir energia comercial pela fusão, esse incrível resultado significa que esse sonho está mais e mais perto”, disse Chittenden. “Nós conseguimos provar que é possível atingir a ignição, inspirando outros laboratórios e startups ao redor do mundo a trabalharem na produção de energia por fusão e reproduzir as mesmas condições usando métodos mais simples, mais robustos e, acima de tudo, mais baratos”.

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