Durante as atividades de terraplanagem para a implementação de um terminal ferroviário na cidade de Davinópolis, no Maranhão, os escavadores foram surpreendidos com a descoberta de ossos enormes. Depois de uma análise preliminar, constatou-se que os materiais são fósseis de um imenso dinossauro que viveu no local há milhões de anos, no período Cretáceo.

A princípio os funcionários da Brado, empresa responsável pela obra, achavam que eram ossos de preguiças gigantes, animais que viveram por ali cerca de 11 mil anos atrás e foram extintos no Quaternário, último período da popularmente conhecida Era do Gelo.

Equipe de arqueólogos que acompanhavam a obra chamou grupo de paleontólogos para analisar a ossada descoberta. Imagem: Brado/Divulgação

Daniel Ribeiro da Silva, arqueólogo coordenador de campo da empresa Arqueologística, responsável pelo monitoramento da obra, foi o primeiro a ver o material. “No primeiro momento fiquei na dúvida se realmente eram fósseis, mas fiz uma pequena limpeza na área e pude perceber que sim. Mas, como eu nunca tinha visto um fóssil de dinossauro na vida, e como é relativamente comum encontrar ossos de preguiças gigantes no nordeste, pensamos que se tratava disso”, revelou Ribeiro.

Ele enviou as fotos para o arqueólogo coordenador geral da empresa, que as encaminhou aos cuidados do chefe do laboratório de Paleontologia da Universidade Federal do Piauí (UFPI), professor Juan Carlos Cisneros.

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Cisneros orientou que procurassem o paleontólogo Elver Luiz Mayer, professor da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), que lidera um grupo de estudos que pesquisa mamíferos do Quaternário.

No entanto, o Grupo de Estudos em Paleontologia da Unifesspa (GEPALEO) coordenado por Mayer percebeu que se tratava de um animal muito maior e que viveu há muito mais tempo, em razão da profundidade em que os ossos estavam.

Segundo Mayer, esse é o primeiro caso de dinossauro identificado na região. “Já se sabia de alguns registros mais ao norte do estado, mas esse é o primeiro fóssil de vertebrado de grande porte para a localidade, que tem histórico de achados de peixes e plantas fósseis”, disse Mayer, em entrevista ao Olhar Digital.

Mayer conta que já foram identificados ossos longos da coluna vertebral e costelas do animal e alguns ossos menores dos pés e das mãos. “Na hora que for feita a limpeza dos materiais em laboratório, pode ser que a gente identifique alguma coisa que não tenha sido percebida ainda”, diz o paleontólogo.

Paleontólogo Elver Luiz Mayer fazendo a preparação da peça para análise. Imagem: Acervo do GEPALEO UNIFESSPA

Desde que os fósseis foram reconhecidos, no mês de abril, até o início das atividades de análise, passou-se um intervalo de uma semana. De acordo com Mayer, esse foi o mínimo de tempo necessário para a equipe conseguir organizar toda a logística e poder começar os trabalhos.

“Foi importante que tivéssemos uma resposta bem rápida, porque era uma época em que estava chovendo na região e uma chuva mais forte podia danificar os fósseis. Então, a gente fez o melhor possível para chegar lá com tudo o que era necessário para fazer a devida coleta deles”, lembra Mayer.

O que já se sabe sobre o dinossauro maranhense até agora

Embora os achados sejam do mês de abril, o processo de análise deve ser muito criterioso e requer tempo. Então, por enquanto, ainda pouco se sabe sobre o dinossauro, além do fato de ele pertencer ao grupo dos saurópodes e a região onde ele possivelmente vivia.

“Ainda temos um conjunto relativamente pequeno de informações perto daquilo que pode ser descoberto com um estudo detalhado desses fósseis”, disse Mayer. “Sabemos que um determinado número de ossos foram encontrados e que eles representam um dinossauro do grupo de saurópodes, que têm como característica marcante o caminhar sobre quatro patas e o pescoço e a cauda bem longos”. 

Ele explicou que as informações levantadas pela análise dos ossos, associadas com informações das rochas em que os fósseis foram encontrados, vão ajudar a recontar essa história: “como ele era, como morreu e como seus ossos foram parar ali e acabaram se tornando fósseis”.

Ainda não é possível dizer se é uma espécie já conhecida ou nova. “Isso exige uma análise mais detalhada. Mas, existe essa possibilidade, pois não se tem descrição anterior de um dinossauro com esse porte corporal na região. Mesmo assim, não podemos afirmar ainda de maneira categórica”, disse o paleontólogo.

Fêmur tem 1,5m de comprimento

Sendo uma nova espécie ou não, o fato é que o animal era extremamente grande, podendo ter até 18m. “Essa descoberta é importante porque pode trazer à tona o conhecimento sobre uma nova espécie de dinossauro, e que tem um grande porte corporal. Chama muita atenção o osso mais longo, o fêmur, que atinge aproximadamente 1,5m de comprimento”, revelou Mayer.

Um dos ossos encontrados, o fêmur, tem 1,5m de comprimento, indicando se tratar de um dinossauro muito grande. Imagem: Acervo do GEPALEO UNIFESSPA

Ele acredita que a relevância do achado é dividida em três vertentes: o potencial da área, a possibilidade de ser uma espécie nova e um tamanho exorbitante. “Isso vai nos ajudar a entender a evolução dos dinossauros, principalmente neste grupo representado pelos fósseis encontrados, que são saurópodes. Então, sempre que descobrimos uma espécie nova, é uma nova peça que se encaixa nesse grande quebra-cabeça que é a tentativa de entender a evolução de um determinado grupo”.

Embora tenha sido encontrado no Maranhão e estudado no Pará, o material não é propriedade de nenhum dos dois estados. “Os fósseis encontrados em todo o território brasileiro são considerados bens da União, segundo a legislação que rege os trabalhos com esses materiais”, explica Mayer. “Então, são patrimônios de todos os brasileiros e, por extensão, de toda a humanidade”.

Apesar disso, Mayer acredita ser importante mantê-los no estado em que foram descobertos. “Depois de analisados, eles serão devolvidos ao seu estado de origem, que eu acredito que seja uma forma de valorizar o patrimônio e das pessoas reconhecerem a importância do material para a história da região”. 

Empreiteiras devem se preocupar com monitoramento ambiental

Sobre uma possível futura exposição dos ossos ao público, o paleontólogo considera importante. “Eu ficaria muito feliz de poder realizar uma exposição com esses fósseis, tanto no Pará, onde eles estão sendo preparados para serem estudados posteriormente, quanto no Maranhão ou em outros estados que forem receptivos a isso, sempre priorizando o cuidado com esses fósseis, que são raros e frágeis. Quanto mais gente puder ver esse material, melhor”.

Para finalizar, Mayer destaca que a preocupação da empresa Brado com a legislação ambiental foi primordial para possibilitar a descoberta. “É importante dizer que essa descoberta só foi possível graças a uma equipe que estava monitorando a obra para o licenciamento ambiental. Isso evidencia a importância de empreendimentos como esses terem uma equipe com paleontólogos que possam fazer o monitoramento da obra, o que representa um custo muito baixo no orçamento, e oferece um ganho muito grande, que, por um lado, assegura juridicamente que a empresa está tomando as devidas providências e não terá problemas de eventuais danos ao patrimônio paleontológico e, por outro, permite que seja realizada a devida escavação e coleta de materiais sem prejudicar o cronograma das obras”.

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