O atual surto de varíola dos macacos tem intrigado não apenas as pessoas ao redor do mundo, mas em especial a comunidade médica, que tem observado que a doença está se manifestando, em alguns pontos, de forma diferente dos surtos anteriores. 

De acordo com reportagem da BBC News Brasil, antigamente – nos surtos de 1970 na África, por exemplo – as manifestações mais comuns da infecção eram febre, mal-estar, inchaço dos gânglios, dor de cabeça, suadouro e o surgimento de várias lesões na pele, principalmente no rosto, na palma das mãos e na sola dos pés. 

Agora, os médicos percebem outro padrão, que acompanha febre e mal-estar, mas com poucas feridas, e localizadas de forma concentradas nos genitais e no ânus. A característica das lesões também mudou, parecendo agora com espinhas ou herpes simples. 

Varíola dos macacos: como e por que os sintomas da doença mudaram? Imagem: Irina Starikova3432 – Shutterstock

“O que temos visto no surto atual são quadros atípicos, muito distintos daquele padrão clássico que conhecíamos”, observou a virologista Clarissa Damaso, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), à BBC

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O que mudou na varíola dos macacos? 

Um estudo publicado no periódico British Medical Journal fez um levantamento dos principais sintomas entre 197 pacientes que testaram positivo para a doença em Londres, no Reino Unido. 

Segundo o estudo: 

  • Todos os participantes tinham lesões na pele ou na mucosa (na parede interna da boca ou do ânus, por exemplo) 
  • Em 56%, essas feridas apareceram nos genitais 
  • Em 41%, elas foram observadas no ânus 
  • 61% tiveram febre 
  • 57% apresentaram inchaço dos gânglios linfáticos 
  • 31% se queixaram de dor muscular 
  • 13% tiveram apenas as lesões, sem febre ou outros sintomas 
  • 36% sentiram dor no reto 
  • 16% tiveram dor de garganta 
  • 15% apresentaram vermelhidão ou inchaço no pênis 

O artigo corrobora com o que os médicos, inclusive brasileiros, têm visto em seus consultórios. Em um contexto geral, além das modificações das lesões e novos sintomas, a doença tem se apresentado de forma mais branda do que antigamente. 

“Temos visto as mais variadas manifestações da doença. Alguns chegam com uma única lesão, enquanto outros estão com muitas feridas”, descreveu a infectologista Mirian Dal Ben, do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, também ao portal da BBC. “Também há casos em que o único sintoma é uma proctite, um tipo de inflamação no reto. Ou seja: são quadros clínicos muito diferentes daqueles descritos na literatura que tínhamos até então.” 

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Tradicionalmente, os sintomas da varíola pelo monkeypox se apresentavam em duas fases: a primeira durava até cinco dias e era caracterizada por febre, dor de cabeça, inchaço dos gânglios, dor nos músculos e falta de energia. Já a segunda, aparecia após três dias do contato com o vírus e, após a febre, apresentava as famosas feridas – a principal manifestação. 

O estudo publicado no British Medical Journal apontou que no novo surto 38% dos participantes só desenvolveram sintomas sistêmicos, como febre e dor no corpo, e depois que as feridas já tinham brotado (fazendo um percurso contrário, digamos).  

Para Damaso, que também integra o comitê sobre varíola da Organização Mundial da Saúde (OMS), a mudança no padrão de sintomas torna o diagnóstico ainda mais difícil. “Temos pelo menos quatro subgrupos de manifestações, que vão desde pessoas que têm uma quantidade absurda de feridas na região genital até aquelas que nem chegam a sentir febre e só apresentam uma única lesão. Esses quadros atípicos dificultam o trabalho do profissional de saúde para a suspeita de casos.” 

Varíola dos Macacos
Varíola dos macacos: como e por que os sintomas da doença mudaram? Imagem: Shutterstock/Tatiana Buzmakova

Por que as características da varíola dos macacos mudaram? 

De acordo com os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, ainda não está claro o que está por trás das mudanças, contudo, a modificação por ter mais a ver com a falta de informação sobre a doença até agora. 

“Talvez, nas regiões da África onde era endêmica, a doença já tivesse uma manifestação mais branda. Mas como são países menos desenvolvidos e falamos de uma enfermidade negligenciada, é possível que apenas os casos mais graves chamassem a atenção”, presume o médico Alexandre Naime Barbosa, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp). 

“Agora que o vírus chegou aos países mais ricos, com sistemas de notificação e testagem maiores, a gente está conhecendo as outras manifestações possíveis.” 

Damaso explicou ainda que o subtipo do monkeypox, apesar de não ter sofrido mutações no código genético, pode ter adquirido uma espécie de “padrão de passagem”. Atualmente, o surto de varíola dos macacos está concentrado entre homens que fazem sexo com homens, considerando que o padrão de passagem acontece por conta do contato próximo com as lesões, que no surto atual surgem com mais frequência na região genital, a pessoa infectada também desenvolve lesões nessa parte do corpo – perpetuando o ciclo. 

Vale destacar, claro, que isso não descarta outras formas de transmissão – ela ocorre também pelo compartilhamento de objetos e gotículas de saliva. “Qualquer lesão que comece com um edema [inchaço e vermelhidão] e evolua para uma placa, tenha líquido, forme ferida e crostas, pode ser monkeypox”, ressaltou Barbosa. 

Assim, para se proteger é recomendado evitar qualquer situação que te coloque em risco e, caso algum sintoma que citamos apareça, procure um médico imediatamente. 

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