Ele foi arrancado do coração de um planeta em formação, vagou pelo espaço por bilhões de anos até encontrar o nosso planeta. Após sua entrada triunfal em nossa atmosfera, descansou por alguns milhares de anos, até iniciar sua gloriosa jornada pelo território brasileiro. A história do Meteorito Bendegó, é uma verdadeira epopéia, digna do maior meteorito do Brasil.

Em 1784, o garoto Domingos da Motta Botelho, encontrou uma grande e estranha pedra enquanto pastoreava o gado em uma fazenda em Monte Santo, na Bahia. Ela era escura, com aspecto metálico e, apesar de todo o calor do sertão, permanecia fria o tempo todo. Domingos não sabia, mas aquela pedra era o maior meteorito brasileiro.

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A notícia daquela estranha pedra se espalhou rapidamente e no ano seguinte, ao tomar conhecimento de sua existência, e de boatos de que ela continha ouro, o então governador da Capitania da Bahia, Dom Rodrigo Menezes, ordenou seu transporte até Salvador. Ele achou que seria fácil.

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Meteorito Bendegó
[ Meteorito no leito do Riacho Bendegó, ainda sobre os restos da carroça destruída na primeira tentativa de transporte – Imagem: Acervo Museu Nacional ]

A duras custas, os homens enviados por Dom Rodrigo, colocaram a imensa pedra em cima de uma carroça que era puxada por 12 pares de bois. Só que ela não foi longe. Após 180 metros de viagem, na primeira descida que enfrentariam, o peso da rocha quebrou a carroça e ela despencou, atropelando os bois e deslizando ladeira abaixo, até repousar no leito do Riacho Bendegó. Depois que viram o peso daquela pedra e o trabalho que daria para tirar ela de lá, eles resolveram deixar para lá. Voltaram para a capital e deixaram a pedra descansando no Bendegó por mais de 100 anos.

Entre 1785 e 1887, a Família Real Portuguesa veio para o Brasil, Dom Pedro gritou “Independência ou Morte”, nos tornamos um império, Pedro I renunciou e voltou para Portugal, o país foi reinado por regências provisórias, Dom Pedro II foi coroado imperador do Brasil aos 15 anos, casou-se, teve 4 filhos, já estava perto do fim do seu reinado e, em todo esse período, a Pedra do Bendegó permaneceu praticamente esquecida no Sertão Baiano. Esquecida, ao menos pelos brasileiros.

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Isso porque ainda em 1810, ela foi visitada pelo cientista inglês Aristides Franklin Mornay, que trabalhava para o Governo da Bahia. Ele ouviu falar sobre aquela curiosa história e resolveu ir até o local para conferir. Mornay desconfiou que se tratava de um meteorito. Por isso, ele extraiu as primeiras amostras da peça e enviou para a Real Sociedade de Londres, que confirmou sua origem extraterrestre. 

A Pedra do Bendegó era, na verdade, um meteorito metálico. Uma massa compacta, composta principalmente de ferro e níquel, mas contendo também outros elementos em quantidades menores, entre eles, o ouro, que havia motivado o Governador Dom Rodrigo a buscá-la. Mas a quantidade de ouro é tão pequena (0,76 g para cada Kg do meteorito) que talvez nem desse para indenizar as famílias dos bois atropelados naquela operação.

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Hoje sabemos que meteoritos assim tem origem no núcleo de planetas ou grandes asteroides que sofreram violentos impactos há mais de 4 bilhões de anos, no período de sua formação. Tais impactos teriam destruído sua crosta, manto e lançado no espaço até mesmo fragmentos do seu núcleo ferroso. 

[ Meteorito de Bendegó em fotografia de H. Antunes, tirada em 1887 mostrando o meteorito ainda na margem do riacho Bendegó, com o vice-almirante José Carlos de Carvalho e os engenheiros Humberto Saraiva Antunes e Vicente José de Carvalho, integrantes da comissão. Ao fundo, tremula a Bandeira do Império do Brasil – Imagem: Acervo Museu Nacional (colorida via picwish.com) ]

Depois da visita de Mornay, o Meteorito Bendegó ficou famoso, menos no Brasil. Por aqui, a coisa só mudou em 1886 quando o Imperador Dom Pedro II tomou conhecimento da sua existência através da Academia de Ciências de Paris. Amante da Ciência, Pedro II determinou, então, que ela fosse levada para o Rio de Janeiro, capital do Império.

Essa não foi uma tarefa simples. Uma comissão de engenheiros foi formada e toda estratégia logística foi planejada com antecedência. Apenas em 7 de setembro de 1887, o Bendegó começou a ser retirado do riacho.

Foram dois meses e meio apenas para preparar e içar a rocha, para que ela fosse colocada em cima da carreta que levaria ela até a estação de trem mais próxima. 

A carreta, por sinal, foi projetada e construída especialmente para essa tarefa. Ela possuía dois pares de grandes rodas de madeira, que eram usadas para rodar sobre solo firme. Para os trechos mais complicados, foram colocadas rodas metálicas, especialmente projetadas para andar sobre trilhos. E os trilhos, eram montados, trecho a trecho, à medida que a carreta ia passando.  

Às vezes, a carreta era puxada por bois, às vezes utilizando-se de roldanas, alavancas, talhas e todo tipo de artefatos que pudessem ajudar a mover a carga consideravelmente pesada. Mesmo com tanta “tecnologia” e empenho, foram precisos 126 dias de esforços para vencer os 113 Km até a Estação de Jacuricy, onde o Meteorito Bendegó foi embarcado para Salvador.  

Nesse caminho, a comissão enfrentou diversos desafios de engenharia. Precisou construir estivados em lagoas, pontes provisórias, aterros, corte de encostas, e morros, e ainda precisaram parar a marcha 4 vezes para trocar os eixos da carreta que se partiram, e 7 vezes por conta de quedas do meteorito. Ô meteorito pra cair esse!

Quando chegou em Salvador, o Bendegó finalmente foi pesado (5.360 Kg!). Lá ele ficou exposto por 5 dias, depois foi enviado de navio ao Recife e de Recife para o Rio de Janeiro, onde chegou em 15 de junho de 1888 e foi recebido pela Princesa Isabel.

A Marinha da Côrte fez um corte no meteorito, de onde se extraíram amostras que foram enviadas para o mundo inteiro. Em 27 de novembro de 1888, o Meteorito Bendegó foi levado para o Museu Nacional, no Campo de Santana. Depois, foi movido para o Palácio Imperial, que mais tarde viria a se tornar a sede do Museu Nacional. Lá ele permanece exposto até os dias atuais, e já foi visitado por muito cientista importante.

[ Albert Einstein e o Meteorito Bendegó durante visita do Físico ao Museu Nacional em 1925 – Foto: Acervo Museu Nacional ]

E para quem acha que ele já havia enfrentado todo tipo de revés, eis que em setembro de 2018, ano em que o Bendegó completava 130 anos no Rio de Janeiro, um incêndio de grandes proporções atingiu o Museu Nacional, destruindo quase todo seu acervo histórico e científico. E o Bendegó?

Sobreviveu quase intacto. Sofrido, mas imponente e resistente, reconhecido como símbolo do renascimento do Museu Nacional. O Meteorito Bendegó é parte importante da nossa história e da nossa Ciência. Ele merece ser preservado e sua história precisa ser contada.

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