Pela primeira vez, foi possível analisar, em nível molecular, os danos nas estruturas de fios de cabelos que passaram por alisamento ou descoloração. Para realizar o feito, pesquisadores do Instituto de Física (IF) da USP utilizaram uma técnica da física chamada de espalhamento de raios-X. De maneira simplificada, o método funciona como jogar luz em um objeto para ver seu reflexo e entender melhor sua forma e composição.

Dentre as amostras analisadas, os cabelos que passaram pelo processo de alisamento e logo depois pela descoloração foram os que tiveram os maiores danos. As mechas apresentarem quatro vezes mais porosidade dos fios, resultando em cabelos ressecados, quebradiços, com frizz e pouca elasticidade.

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Os detalhes da pesquisa, realizada em parceria com a Universidade de Copenhague, na Dinamarca, foram publicados pelo Journal of Applied Cristallography.

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Como funciona o espalhamento de raios X?

  • Um dispositivo direciona feixes de raios X para mechas de cabelos que estão sendo analisadas.
  • Os fótons de raios X penetram nas mechas e interagem com suas estruturas internas.
  • Os raios X se dispersam e atravessam as estruturas do cabelo, resultando na formação de uma imagem bidimensional (2D) do outro lado.
  • Esse processo permite a obtenção de informações detalhadas sobre as mudanças que ocorreram nas microestruturas das fibras capilares.
Técnica de espalhamento de raio X – Imagem cedida pela pesquisadora Cibele Castro Lima ao Jornal da USP

Para conseguir chegar ao resultado em nível molecular, o professor Cristiano L. P. de Oliveira, do Departamento de Física Experimental do IF, disse em entrevista ao Jornal da USP que foi preciso unir diferentes técnicas:

O trabalho sobre danos nas estruturas capilares em cabelos alisados foi feito com uma metodologia inovadora combinando diversas técnicas (espalhamento de raios X, termos analíticos, espectroscopia de massas e termogravimetria) de modo a compreender as propriedades globais das fibras capilares em um grande intervalo de escalas de tamanho.

Detalhes do procedimento nas amostras:

  • O ativo utilizado nos testes contém ácido glioxílico associado a carbocisteína, que não é permitido pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), mas está presente na maioria dos produtos de alisamento.
  • As amostras de cabelos naturais usadas foram obtidas com um fornecedor dos Estados Unidos.
  • Elas foram separadas em três grupos distintos: no primeiro, submetidas à descoloração; no segundo, ao alisamento; e no terceiro, as mechas foram submetidas a ambos os procedimentos, sendo descoloridas e alisadas.
  • A pesquisadora introduziu uma fonte de calor no experimento de espalhamento de raios X para simular o reaquecimento das fibras capilares após um procedimento de alisamento

Os dados experimentais foram coletados pela central multiusuário do IF, que conta com equipamentos de última geração para estudos de espalhamento e difração de raios X.

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O resultado pode ser bonito por fora, mas por dentro é outro assunto

De maneira inédita, o espalhamento de raios X revelou que a progressiva, de inofensiva, não tem nada. O resultado externo pode ser bonito e agradar a muita gente, mas a verdade é que o cabelo perde muito mais do que ganha.

O processo de alisamento ácido provoca modificações nas camadas lipídicas. Essas camadas compõem o complexo de membrana celular e desempenham um papel crucial na manutenção da suavidade, brilho, flexibilidade e resistência dos fios. Em torno da fibra capilar, forma-se uma espécie de película hidrofóbica que retém as moléculas de água no interior da fibra e dificulta a penetração de produtos cosméticos, mesmo quando expostos a altas temperaturas.

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Imagem: cedida pela pesquisadora ao Jornal da USP

E quando a descoloração é somada o procedimento químico do alisamento, o resultado é ainda mais desastroso. O clareamento causa perda de proteínas e lipídios importantes que deixam o cabelo ainda mais sensível.

A pesquisa identificou ainda a desnaturação da proteína alfa-queratina, que fornece força e elasticidade à fibra capilar. Essa desnaturação é diretamente proporcional ao aumento da temperatura ou do tempo de exposição da prancha nos cabelos. O dano é maior com temperaturas mais altas, afetando tanto o córtex quanto a cutícula, e é irreversível.

O resultado imediato da escova progressiva é lindo porque o produto forma um filme em torno da superfície do cabelo, deixando os fios brilhantes, alinhados, sedosos, livres de frizz, de volume e ondulações. Entretanto, é uma falsa impressão de que os cabelos estejam saudáveis e tratados.

Cibele Castro Lima, autora da pesquisa, engenheira química e pesquisadora em pós-doutorado no Grupo de Fluidos Complexos do IF.

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