Sedimentos antigos no fundo do oceano revelaram as flutuações na força da Corrente Circumpolar Antártica (ACC) nos últimos 5,3 milhões de anos. Os resultados das observações dessa dinâmica foram descritos em um artigo publicado nesta quarta-feira (27) na revista Nature.

A ACC detém o título de maior transportador de água do mundo, superando em muito todos os rios juntos. E é aí que mora uma ironia peculiar: essa mesma corrente que hoje desempenha um papel crucial no resfriamento do nosso planeta, foi, em tempos antigos, uma das razões para a Terra ser mais quente do que é hoje.

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Naquela época, a Tasmânia e a Patagônia estavam mais próximas da Antártica, e sua presença impediu o desenvolvimento de uma corrente que agora persegue eternamente sua cauda ao redor do continente meridional. A ACC impede que a água quente dos trópicos chegue às costas da Antártica e derreta o gelo no verão, o que aqueceria o planeta ao reduzir a reflexão da luz no espaço.

A Corrente Circumpolar Antárctica (ACC) é o sistema de correntes mais forte nos oceanos terrestres, que liga as bacias do Atlântico, Índico e do Pacífico. Crédito: NASA/JPL-Caltech

A ACC não precisa ser tão forte quanto é para desempenhar esse papel, no entanto, tendo moldado o clima da Terra, agora é moldada por ele por sua vez. Tem acelerado visivelmente nos últimos anos, o que tem sido atribuído a ventos mais rápidos a 60º, as principais latitudes da corrente.

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Acredita-se que a causa direta dessa aceleração seja um aumento de 40% na força do vento sobre o Oceano Antártico. O que os climatologistas querem saber é se esses ventos mais fortes são causados pelo aquecimento global induzido pelo homem ou outra coisa. Recentemente, surgiram evidências de que até mesmo a atração gravitacional de Marte pode influenciar a velocidade da ACC, mas algo assim só exerceria uma influência em escalas de tempo muito mais longas.

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Para tirar essa dúvida, uma equipe internacional de cientistas embarcou em uma jornada desafiadora para desvendar os mistérios enterrados nas profundezas marinhas. 

Esses núcleos não são fáceis de coletar. Além do desafio de perfurar quilômetros de profundidade no fundo do mar, os ventos impulsionadores fazem da região algumas das águas mais agitadas da Terra. 

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Mesmo assim, os cientistas conseguiram retirar cinco núcleos do Oceano Pacífico Sul, abaixo da rota da ACC. Estes núcleos, como páginas de um livro antigo enterrado no fundo do mar, revelaram segredos sobre a história da corrente, sua força e velocidade ao longo de milhões de anos.

O que os pesquisadores descobriram foi fascinante. Ao longo dos tempos geológicos, a velocidade da ACC variou, respondendo às mudanças climáticas da Terra. Nos últimos 800 milanos, a corrente mostrou-se mais forte durante os períodos de aquecimento global. E agora, diante do impacto humano nas temperaturas do planeta, ela acelera novamente.

Essa aceleração pode ter implicações significativas para o globo. Enquanto o papel da ACC no resfriamento do planeta é bem conhecido, um aumento em sua velocidade pode acelerar o derretimento do gelo nas bordas da Antártica, contribuindo para o aumento do nível do mar.

É como se a Terra estivesse em um delicado equilíbrio, e qualquer mudança na velocidade da ACC pudesse ter consequências profundas. Enquanto muitos olham para a desaceleração da Circulação Meridional do Atlântico (AMOC) como uma ameaça imediata, a aceleração da ACC pode representar um desafio ainda maior no longo prazo.

Este estudo, uma colaboração entre cientistas de diversos países, acrescenta mais uma peça ao quebra-cabeça complexo do nosso clima global. À medida que continuamos a desvendar os segredos do nosso planeta, cada descoberta nos aproxima de uma compreensão mais profunda do mundo que chamamos de lar.