Pesquisas recentes indicam que o planeta Vênus, frequentemente considerado o “gêmeo malvado” da Terra devido às suas condições extremas, pode ter tido uma atividade tectônica intensa no passado, semelhante à que formou os primeiros continentes terrestres.

Atualmente, Vênus é um mundo hostil, com temperaturas que ultrapassam os 460ºC e uma pressão de superfície esmagadora. Diferente da Terra, que possui placas tectônicas ativas que moldam sua crosta, Vênus parece ter uma litosfera estagnada, ou seja, uma única placa com movimentos mínimos. No entanto, características geológicas como falhas, dobras e vulcões sugerem que, em épocas passadas, o planeta pode ter sido tectonicamente ativo.

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Representação artística da superfície hostil de Vênus elaborada com elementos fornecidos pela NASA. Crédito: Artsiom P – Shutterstock

Uma equipe de cientistas liderada por Fabio Capitanio, da Universidade Monash, na Austrália, focou sua pesquisa nos chamados “tesselas”, impressionantes planaltos encontrados na superfície de Vênus – cujos resultados foram publicados este mês na revista Nature Geoscience.

Esses planaltos, que se assemelham aos primeiros continentes da Terra, indicam que o planeta pode ter experimentado uma tectônica ativa bilhões de anos atrás. “Ficamos surpresos ao descobrir que Vênus, com sua superfície escaldante e falta de placas tectônicas, apresenta características geológicas tão complexas”, afirmou Capitanio, em um comunicado.

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Região em Vênus com crosta espessa lembra a superfície da Terra

A teoria das placas tectônicas, amplamente aceita para a Terra, postula que a crosta rígida do planeta é composta por grandes placas que se movem, colidem e se afastam, moldando a superfície. Contudo, até o momento, essa dinâmica só foi observada por aqui. Em Vênus, muitos cientistas acreditam que o planeta passou de uma fase inicial de movimento tectônico limitado para o atual estado de litosfera estagnada.

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Os cientistas analisaram formações conhecidas como terras altas de Ishtar Terra, uma região de Vênus que desafia a atual compreensão da geologia planetária. Com altitudes que superam as dos Himalaias, as terras altas de Ishtar Terra possuem uma crosta espessa, similar à dos crátons no nosso planeta – regiões antigas e estáveis do interior de continentes.

A equipe utilizou modelagem computacional e dados da sonda espacial Magellan, da NASA, que em 1990 mapeou toda a superfície de Vênus, para estudar os mecanismos que poderiam ter levado à formação dessas terras altas. 

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Por meio dessa análise, os cientistas concluíram que as elevações podem ter se formado por um processo no qual a superfície de Vênus se afinou e derreteu, criando áreas elevadas à medida que a rocha derretida subia. Com o tempo, esse processo teria resultado no resfriamento e na formação de planícies altas cercadas por cinturões dobrados, semelhante à formação dos crátons na Terra primitiva.

Um modelo de elevação do vulcão Idunn Mons, localizado em Imdr Regio em Vênus, criado com dados da sonda espacial Magellan. Créditos: NASA / JPL-Caltech / ESA

Essas descobertas indicam que Vênus e Terra podem ter compartilhado processos geológicos semelhantes em suas histórias iniciais. “As características que encontramos em Vênus são surpreendentemente similares aos primeiros continentes da Terra, sugerindo que a dinâmica do passado de Vênus pode ter sido mais parecida com a da Terra do que imaginávamos”, afirmou Capitanio.

A pesquisa abre caminho para futuras missões a Vênus, como DAVINCI, VERITAS e EnVision, que prometem revelar mais sobre a história geológica do planeta e suas possíveis conexões com a Terra. “Estudar essas formações em Vênus pode nos ajudar a desvendar os segredos do início da história terrestre”, concluiu o líder do estudo.